Mercado

Levedura pode triplicar produção de álcool

Quase quatro décadas depois de o governo federal lançar o Programa Nacional do Álcool (Pró-Álcool), à época responsável por revolucionar o mercado de combustíveis brasileiro, novo estudo que possibilita aumento considerável da produtividade da cana-de-açúcar e de outros substratos vegetais promete ressuscitar o programa de biocombustíveis. Alunos de pós-graduação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade Federal de Roraima (UFRR) conseguiram isolar leveduras existentes na Floresta Amazônica capazes de fermentar o açúcar presente na xilose (um tipo de carboidrato), até então descartada devido ao desconhecimento de micro-organismos com tal potencial.

Os trabalhos, coordenados pelo professor do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG Carlos Augusto Rosa, tiveram início em 2009. Ao todo, serão investidos até 2014 pouco mais de R$ 500 mil, com recursos originários da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Os estudantes coletaram leveduras presentes em madeiras decompostas encontradas em áreas de reserva administradas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em Mucajaí (RR) para testá-las em laboratório. Cinco espécimes foram catalogadas pela primeira vez no mundo (quatro delas do gênero Spathaspora: S. brasilienses, S. roraimanenses, S. suhii e S. xylofermentans. A outra é a Candida amazonenses. Uma sexta espécie só tinha sido identificada por uma vez nos Estados Unidos, a Spathaspora passalidarun. Em agosto, elas foram apresentadas na publicação científica internacional Plos One.

As análises comprovaram ser possível fermentar o açúcar de cinco carbonos presente na hemicelulose — a xilose. Responsável por quase um terço do açúcar encontrado no bagaço da cana, o produto é descartado por causa da falta de agentes processadores capazes de fermentá-lo. Com a nova descoberta, porém, pode ser possível aproveitar esse percentual, elevando assim a produtividade sem aumentar a área plantada. Atualmente, as leveduras industriais só são capazes de quebrar a sacarose (presente no caldo da cana), fazendo com que se rejeite parte significativa do açúcar. Outro ponto positivo é que as leveduras conseguem efetuar a fermentação da xilose de qualquer biomassa vegetal (palha de arroz e de soja, casca de café e coco, entre outros) e não só da cana.

E mais: o estudo conseguiu concluir o processo de fermentação em 24 horas em alguns dos experimentos, mas o ideal para a indústria é atingir pelo menos a metade desse tempo para se ter um custo benefício satisfatório. Do contrário, os valores gastos com energia e mão de obra tornam o processo inviável. Tanto é assim que outros estudos no exterior se mostraram inviáveis por demorar até 72 horas para fermentar. No caso do caldo da cana-de-açúcar, em média, o tempo é de oito horas. A busca por esses resultados é motivo de estudos nos quatro cantos do planeta, mas, com o isolamento do espécime, o Brasil larga na frente. “É uma corrida no mundo inteiro para saber quem obterá resultados primeiro. É preciso ‘domesticar’ as leveduras para se chegar ao processo industrial”, afirma Rosa.

O processo para transformação das leveduras encontradas na natureza em agentes industriais ainda deve demorar no mínimo quatro anos. O coordenador do projeto lembra que existe grande diferença entre os processos feitos em bancadas de laboratórios com amostras de 2l e os testes necessários para uso em nível industrial, nos quais são processados 10 mil litros ou mais por vez.

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