Mercado

Câmbio restaura substituição de importados

A desvalorização do real em 1999 encareceu os produtos estrangeiros e provocou um movimento de substituição de produtos importados no Brasil, que se acentuou nos últimos três anos.

A participação das importações no consumo doméstico, de 18,4% em 2001 –uma das mais altas na história do país–, caiu para 13,9% no ano passado, considerando o câmbio corrente, segundo cálculo do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).

A previsão do banco é que esse percentual suba para 14,3% neste ano com o aumento das importações brasileiras. Mas, ainda assim, deve ficar bem abaixo dos 18,5% constatados em 1999.

A troca de produto estrangeiro por nacional aconteceu basicamente em setores menos nobres da economia. Isto é, a substituição que se verificou no Brasil foi reflexo de uma política de câmbio, e não de uma política industrial do governo. A redução dos importados no consumo doméstico também é sinal de pouco ânimo dos empresários para investir no país.

Considerando o câmbio congelado em 1998, o que significa eliminar o efeito da desvalorização do real, a participação das importações sobre o consumo doméstico caiu ano a ano desde 1999 e chegou a 10,3% em 2003.

“O câmbio ajudou a reduzir a presença de importados na economia, mas esses números mostram também que o país se esforçou para substituir produto estrangeiro”, diz Maurício Mesquita Moreira, economista do Departamento de Integração do BID.

Avanço a partir de 2002

Equipamentos de transporte, veículos, metais comuns, refino de petróleo e álcool, papel e derivados, vestuário e até mesmo informática foram os setores que mais trocaram produtos importados por nacionais, segundo cálculos de Moreira.

No setor de informática, a participação dos importados no consumo doméstico, que era de 50,4% em 98, caiu para 34,6% em 2003; no de equipamentos de transporte, de 40,7% para 26,8%; no de veículos automotivos, de 21,5% para 14,2%; no de refino de petróleo e álcool, de 20,3% para 8,9% no período.

O efeito da desvalorização do real sobre a troca de bens importados não foi imediato. De 1996 a 1998, a participação dos produtos importados no consumo doméstico subiu de 14% para 16,4%. Considerando o câmbio corrente, esse percentual sobe para 18,5% em 99, cai para 17,7% em 2000 e volta a subir para 18,4% em 2001.

“Foi a partir de 2002 que o país iniciou um processo mais importante de substituição de importação. De 99 a 2001, quem importava com câmbio favorável até 1999 continuou importando até 2001. Se o governo tivesse auxiliado, esse processo seria mais intenso e rápido. O fato é que, sem o governo fazer nada, os importados perderam importância nos setores que exigem menos tecnologia”, diz Fernando Camargo, sócio-diretor da LCA Consultores.

Importação maior

Os setores de ponta, ao contrário, estão importando mais. Considerando o câmbio corrente, calcula o economista do BID, a participação de conteúdo estrangeiro nos equipamentos de instrumentação consumidos no país subiu de 53% em 98 para 55,5% em 2003; nas máquinas e aparelhos elétricos, de 24,1% para 30,6%; nos materiais eletrônicos e equipamentos de comunicações, de 33% para 34,5%; nos produtos químicos, de 20,5% para 23,1%.

O setor de informática conseguiu substituir importados nas linhas de monitores, de placas de memória, de discos rígidos (armazenadores de dados), de discos óticos (leitores de CD) e de circuitos impressos, segundo Antonio Hugo Valério Jr., diretor da área de informática da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica).

Em conseqüência, o índice de nacionalização dos computadores pessoais, que era de 25% há alguns anos, subiu para cerca de 35% hoje, conforme o modelo.

“A substituição dos produtos importados só não foi maior por causa do mercado “cinza”, do grande número de mercadorias clandestinas que entram no país”, afirma Valério Jr.

Há quatro anos, a CCE, fabricante de produtos de áudio e vídeo, importava placas de circuitos impressos. Hoje, produz esse componente para consumo próprio e para terceiros.

“À medida que as placas foram ganhando qualidade, as fábricas deixaram de trazer esses componentes da China”, afirma Synésio Batista da Costa, vice-presidente da CCE.

No setor de máquinas também houve a substituição de importados. De janeiro a março deste ano, a participação dos importados no consumo de máquinas e equipamentos variou de 42% a 44% (de 51% a 54% em 2003).

“A participação dos importados é a mais baixa dos últimos cinco anos”, afirma Newton de Mello, presidente da Abimaq (associação da indústria de máquinas).

Segundo ele, a tendência é a participação do importado cair para 40% e se estabilizar nesse percentual, já que “o universo de máquinas é muito grande, e o país não tem condições de fabricar todos os equipamentos de que precisa.”

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