Mercado

A reação à escalada do preço do álcool

Em fevereiro, as exportações brasileiras de álcool anidro (o que é misturado na gasolina) foram 20,7% maiores do que as do mesmo período do ano passado. A média diária de exportação do produto também foi superior à de janeiro, quando o País vendeu 7,25 milhões de litros/dia, ante 8,06 milhões de litros/dia de fevereiro. O destino predominante, segundo os números do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, ainda é os EUA, que compram o ano todo, e não só em junho, julho e agosto, quando a safra de cana está em plena atividade.

Neste ano, a entressafra de janeiro a março gerou forte escassez do produto no mercado interno e uma alta de preços de 36% em apenas dois meses. Para detê-la o governo fechou, no começo de janeiro, um acordo com o setor, fixando teto de R$ 1,05 para o litro do álcool. Os usineiros não cumpriram o acordo.

Desde o início do ano o mercado internacional permanecia um atrativo forte para os produtores de álcool, com o preço alcançando US$ 850 o metro cúbico, valor 50% maior que o obtido no mercado interno. Vale notar que as relações do setor com o governo ficaram muito tensas e o clima na Feira de Negócios do Setor de Energia (Feicana), em Araçatuba, na semana passada, evidenciou isso, porque há indícios de que algumas grandes usinas não resistiram às ofertas de compra de álcool feitas por tradings que necessitavam honrar contratos de exportação.

Só os EUA, em fevereiro, compraram 79 milhões de litros de álcool anidro do Brasil, quase cinco vezes mais que os 16,9 milhões comprados em fevereiro de 2005. Não foi diferente com o Japão, que importou das usinas brasileiras 24,6 milhões de litros neste ano, bem mais que os 17,4 milhões comprados em fevereiro do ano passado.

O governo reagiu a esses fatos. Como revelou, com exclusividade, a editora-assistente Isabel Dias de Aguiar, a primeira providência oficial será ampliar as exigências para o registro das exportações de álcool, que passa a ter o mesmo tratamento dos derivados de petróleo.

Os exportadores devem passar a ser obrigados, portanto, a oferecer contraprova de embarque à Agência Nacional de Petróleo e Gás natural e Biocombustíveis (ANP) para obter o registro das exportações na Secretaria de Comércio Exterior (Secex). Os empresários reconheceram que o governo usou medidas burocrática para conter a especulação. Mas, também, reconheceram que o produto álcool ganhou conotação mais estratégica, deixando de ser tratado como commodity agrícola.

Entidades empresariais ligadas ao setor alcooleiro estimaram uma queda de consumo de 250 milhões de litros em março. Os próprios usineiros consideraram a previsão exagerada e a rotularam de tentativa estatística de “acalmar” o governo. Porém, como reconheceu o presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo (Sincopetro), René Abbad, “o álcool barato acabou”, porque a demanda, segundo ele, é global e “todos querem o combustível”.

Abbad admitiu que existe uma situação de concentração das usinas em torno de grandes grupos empresariais, o que resultou, como insistiu, em uma “política de preços única”.

O quadro de interesses que cercou a escalada de preços do álcool indica que o governo agiu até com atraso em relação aos problemas do produto. Mas agiu no rumo certo. O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, assegurou que estão em análise diferentes fontes de financiamento para que o governo possa, enfim, manter um estoque, óbvia necessidade para enfrentar as oscilações de preços na entressafra. Rodrigues garantiu que o governo não pretende intervir no mercado; apenas adotar medidas que podem regular a oferta.

Como o governo agiu com severidade o setor recuou. Fernando Perri, diretor da União das Destilarias do Oeste Paulista, afirmou que as exportações de álcool “precisam ser controladas”, apontando a influência da Casa Civil da Presidência na decisão. Seja qual for a origem da decisão, o consumidor brasileiro de álcool sentiu-se protegido por ela e só lamentou o seu atraso.

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