Num cenário de baixos índices pluviométricos, a gestão de recursos hídricos ganha cada vez mais importância para manter a produtividade e a qualidade da cana-de-açúcar. Tido como um segmento que sempre consumiu grandes volumes de água, a preocupação em reduzir esse consumo não é de agora e já faz alguns anos que o setor vem se debruçando para apresentar melhores indicadores.
Um estudo aponta que no Estado de São Paulo entre 1990 e 2012, a produção de cana cresceu 150%, enquanto a demanda absoluta de água pelo setor foi reduzida em cerca de 40% no mesmo período, demonstrando uma maior eficiência na gestão.
Apresentar alguns desses modelos bem-sucedido, foi um dos objetivos do webinar do JornalCana, realizado no dia 11 de agosto, com apresentação do painel: “Déficit Hídrico – Como as Usinas estão Otimizando o Consumo de Água no Campo e na Indústria”.
Participaram do evento: André Borges, gerente agrícola da Usina Seresta– Alagoas,; Edson Rocha, gerente geral da América do Sul da Spraying Systems Co; Olívia Merlin, gerente de qualidade em meio ambiente da Usina Lins e Welington Ribeiro, analista de gestão de melhorias da Usina Pitangueiras.
O webinar foi patrocinado pelas empresas Autojet from Spraying Systems; AxiAgro; Netafim e S-PAA Soteica. Ao longo do evento, sob condução do jornalista do JornalCana, Alessandro Reis, os participantes apresentaram algumas soluções que estão sendo adotadas em suas usinas.
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Déficit hídrico não chega a ser novidade para André Borges, da Usina Seresta, localizada na região sul do Estado de Alagoas, que enfrenta uma média de precipitação anual de 1.300 mm de chuva, considerada baixa para o setor sucroenergético. Para enfrentar essa situação, a usina implantou em janeiro de 1998, um projeto piloto de sistema de irrigação por gotejamento. Em 2007 esse projeto foi ampliado, abrangendo 1.500 hectares. Borges explicou que parte desses projetos foram implantadas em áreas que recebem água de efluentes de barragem (água limpa) e em parte próximas da usina, que recebe água de lavagem, mais a vinhaça.
Segundo o gerente agrícola, na época de implantação desse projeto chamado de ferti-irrigação, a empresa Netafim, através de estudos laboratoriais chegou a mistura de 95% de água de lavagem com 5% de vinhaça. O processo inclui tanques de decantação até chegar ao campo de gotejamento. Quando um tanque suja, fecha e utiliza o outro. O detalhe importante nestes tanques é que na entrada a profundidade é maior que na saída, que tem uma chincana que é para segurar o material flutuante (sujeira) para não passar pelos canais e chegar ao processo de gotejamento. Os tanques foram feitos num posicionamento para que o vento ajudasse na limpeza, explica André, lembrando a necessidade do monitoramento das águas de lavagem e na parte operacional, a limpeza quinzenal dos gotejadores. Segundo ele, com a vinhaça, além de ter economia nos fertilizantes, os canaviais apresentam melhor produtividade, uma média de 15 toneladas de diferença.
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Para Edson Rocha, da Spraying Systems Co, empresa de tecnologia de sistemas e controle de pulverização, “cada gota conta”. A água é o remédio, mas todo remédio em excesso vira veneno. “A gente tem que ter muito cuidado com a quantidade de água que aplica no processo, lembrando que um bico de pulverizador desgastado pode provocar um enorme prejuízo”, adverte.
Segundo Rocha, o excesso de água adicionado ao processo e a falta de água para condensação e vácuo na fábrica de açúcar poderá reduzir o mix voltado para açúcar. Ele acrescenta que a pulverização precisa, é uma ciência. “Não é simplesmente um tubo amassado, todo furado, que vai solucionar esse problema de diminuir o consumo de água na planta. A gente tem que avaliar a distribuição desse bico, se ele está atingindo a área necessária, o tamanho da gota, entre outros fatores. A metodologia Autojet consiste em primeiro diagnosticar o processo, desenvolver a solução, preparar um plano definindo as métricas e posteriormente implantar a solução”, explicou.
Edson lembra que a cana-de-açúcar não é um produto único, contando em sua composição com pelo menos quatro itens diferentes, sendo processados ao mesmo tempo: água, açúcar, fibras e outras impurezas. Então, o equipamento não deve ser feito pensando apenas em cana, mas precisa levar em consideração esses outros fatores. Portanto, toda quantidade de água tem que ser controlada, senão o excesso vai trazer consequências.
De acordo com o gerente geral os principais pontos de controle são: resfriamento, limpeza do esteirão, embebição da cana, limpeza de peneira, filtro rotativo, filtro prensa para lodo, condensador barométrico, resfriamento de água e limpeza de dornas.
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Olívia Merlin, da Usina Lins, destaca que a gestão de recursos hídricos vai muito além do simples racionamento ou economia. “Trata-se de mapear riscos e oportunidades que englobam o tema. Só assim, será possível estabelecer métricas e objetivos concretos sobre o impacto da água nas operações e finança dos negócios”, disse.
A Usina Lins adota um circuito fechado, com um sistema de tratamento de efluentes líquidos. “Toda água vai para esse sistema, sendo que parte dela retorna para o processo produtivo e o excedente é utilizado em outros processos”, explicou. Também é feito o aproveitamento da água condensada; o controle das vazões das captações de águas superficiais, subterrâneas e efluentes industriais (vinhaça e águas residuárias).
A usina ainda promove o monitoramento da qualidade da água através de análises físico-químicas das águas superficiais e subterrâneas e efluentes. Todas essas ações proporcionam níveis de captação baixo de água, atualmente igual 0,50 m³ por tonelada de cana.
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Além dessas ações voltadas para a diminuição do consumo e de buscar um aproveitamento máximo das águas, nós temos as ações de preservação dos recursos hídricos que são extremamente importantes, como o programa Semear, que realiza o reflorestamento nas áreas de parceiros fornecedores e áreas próprias. Em 2020, esse programa completou o plantio de 852 mil mudas de árvores, equivalentes a 520 hectares em margens e nascentes de fazendas que a usina utiliza para plantio, incluindo áreas próprias de fornecedores e parceiros.
Na Usina Pitangueiras, Welington Ribeiro, analista de gestão de melhorias, informou que a solução foi a implantação de um projeto Kaizen denominado: Inserção indevida de água no processo. Ele explica que ao longo desse processo, foram levantados alguns pontos básicos de melhorias, que acabaram trazendo bons resultados, proporcionando uma economia de R$ 375 mil reais. Um dos pontos que ele mencionou foi a espuma do caldo.
“Existia um alto índice de espuma com a mistura de caldo com a água de embebição, o que ocasionava o transbordamento da espuma e se utilizava muita água para limpeza do local. A solução foi uma derivação do tubo de caldo das caixas de embebição, uma porcentagem retorna aumentando o vácuo na bomba e evitando que o caldo espume, dispensando assim a inserção de água no processo. Outros pontos levantados no projeto foram: da piscina sem água; descarte das sobras das caixas; redução do contra fluxo; Implantação de válvula automática nos lavadores de gases; descarte da água da torre de resfriamento e da água clarificada.
Wellington também destacou a importância do trabalho de conscientização de todos os envolvidos no processo. “Fixamos placas em 79 mangueiras distribuídas em nossa unidade industrial, lembrando se era realmente necessária sua utilização ou se não haveria uma outra forma de efetuar aquela limpeza. E esse processo de conscientização surtiu muito mais resultados do que se tivéssemos simplesmente proibido o uso das mangueiras”, explicou Wellington.
Assista ao webinar completo: