JornalCana

Usinas aproveitam co-geração e lucram com créditos de carbono

Segundo país em número de projetos para comercialização de créditos de carbono depois da Índia, o Brasil tem atraído investidores nacionais e estrangeiros para negócios em um ramo específico do agronegócio: a co-geração de energia a partir da biomassa. O segmento já representa a maior parte dos projetos brasileiros nesse mercado, e estima-se que seu potencial de redução de emissões alcance 2,486 milhões de toneladas de carbono no país por ano.

A co-geração com biomassa é a base de nada menos que 51 dos 138 projetos já aprovados pelas autoridades brasileiras e apenas à espera do sinal verde da ONU para o início das negociações, conforme os dados mais recentes. Destes 51 projetos, 23 referem-se exclusivamente a usinas de açúcar e álcool que tradicionalmente fazem a co-geração a partir do bagaço da cana. Outros quatro estão em fase de revisão porque apresentaram alguma inconsistência técnica.

Quando aprovadas pela autoridade brasileira, os projetos conhecidos por MDL (Mecanismo de Desenvolvimento Limpo) são avaliados pelo Conselho Executivo da ONU, que dá a palavra final para que sejam desenvolvidos nos países em desenvolvimento. E aí está a boa notícia: 25 projetos brasileiros de co-geração com o bagaço da cana já foram habilitados pela instituição para comercializar créditos de carbono. Na prática, essas usinas já estão ganhando dinheiro.

Os números indicam que os créditos de carbono, um mecanismo novo e ainda desconhecido para a maioria das empresas, é um filão por onde as usinas brasileiras pretendem aumentar sua receita. “Quem não entrar nesse mercado deixará de ganhar dinheiro”, diz o consultor-sênior Shigueo Watanabe Jr, da Geoklock, de São Paulo.

Grandes empresas aderiram aos créditos nos últimos meses – Santa Elisa, Vale do Rosário e Nova América, no interior de São Paulo, e outras avaliam fazer projetos.

Para as usinas de açúcar e álcool, os investimentos para a comercialização desses créditos é marginal, afirma Marcelo Schunn Diniz Junqueira, coordenador da Econergy Brasil, uma das principais consultorias para créditos de carbono do país. Isto porque os maiores aportes são feitos antes, na infra-estrutura para a co-geração de energia a partir do bagaço, um investimento que oscila entre R$ 30 milhões e 40 milhões. “Para a comercialização de créditos, os gastos são com documentos e auditoria”, diz ele.

Marcelo Alexander, parceiro de Junqueira na consultoria, acrescenta: “O próprio projeto de co-geração com biomassa já possui o retorno por si próprio, o crédito de carbono é uma receita adicional, que torna o projeto mais atrativo”.

Praticamente 100% das usinas sucroalcooleiras do país são auto-suficientes em co-geração. Mas apenas 10% negociam o excedente desta energia para as distribuidoras de energia, segundo a União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica). E somente esses 10% podem hoje comercializar os créditos, já que a equivalência em toneladas de carbono que deixam de ser emitidas é feita sobre a energia vendida às concessionárias e não sobre a energia potencial da usina.

Segundo Junqueira, a comercialização dos créditos de carbono representa um valor baixo em relação ao faturamento de uma usina – cerca de 0,5%. É o que Watanabe, da consultoria Geoklock, chama de “chantilly do bolo”. “Mas a receita obtida pelos créditos de carbono é livre”, acrescenta Junqueira.

Em um exemplo hipotético, se considerada uma usina padrão, com uma moagem de 2,5 milhões de toneladas de cana por safra, a receita obtida com créditos de carbono pode chegar a quase 126 mil euros por ano. Para chegar a esse cálculo, foi considerado que essa usina gera por ano 40 mil megawatts/hora, operando em 160 dias por ano, 24 horas por dia, simula Carlos Delpupo, da consultoria Key Associados. Com isso, a usina tem capacidade para negociar até 15 mil toneladas de créditos de carbono por ano. Uma usina deste porte, tido como médio, fatura em torno de R$ 200 milhões por ano.

Os preços do crédito de carbono no mercado, porém, têm oscilado, e atualmente estão em torno de 8,40 euros por tonelada de carbono.

A Central de Álcool Lucélia, por meio de sua subsidiária Bioenergia do Brasil, fechou contrato com o Japão para negociar créditos de carbono ao preço superior a 12 euros por tonelada. Segundo Ana Paula Torres, diretora financeira do grupo, a empresa negociará por ano cerca de 16 mil toneladas. “A comercialização dos créditos de carbono é lucro de 100%”, diz Eduardo Silva, presidente da Lucélia.

Outro caso bem-sucedido é o da Organização Balbo, com duas usinas de açúcar e álcool em funcionamento e uma terceira que será construída no Triângulo Mineiro. Segundo Leontino Balbo Júnior, diretor agrícola da empresa, a usina negocia créditos de carbono para o Japão, intermediadas pelo ABN Amro, com ágio, uma vez que a matéria-prima – a cana – é orgânica, e considerada um diferencial no mercado. Esses créditos serão negociados a 17 euros por tonelada.

Segundo Laura Tetti, consultora de meio ambiente da Unica, a comercialização dos créditos de carbono reforça o papel das usinas na produção de combustível verde. “Hoje o Brasil [usinas sucroalcooleiras] neutraliza 40% do petróleo com o uso do álcool na gasolina”. Do ponto de vista ambiental, porém, a co-geração não contribui substancialmente para aplacar o aquecimento global, já que reduz menos de 20% do total de emissões. São os aterros sanitários os responsáveis pela maior queda em volume – mais de 50% do total.

Inscreva-se e receba notificações de novas notícias!

você pode gostar também
Visit Us On FacebookVisit Us On YoutubeVisit Us On LinkedinVisit Us On Instagram