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Um sucesso que também preocupa

As estimativas da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) indicam que o Valor Bruto de Produção (VBP) da agropecuária neste ano será de R$ 189,3 bilhões, crescimento de 9,9% em relação a 2006. Esta projeção significa respeitável reversão quanto aos resultados anteriores do setor, pois nos dois últimos anos o agronegócio perdeu R$ 22,8 bilhões, seguindo os mesmos critérios de medida do VBP, que é o valor gerado pela multiplicação dos preços médios pelo total do produto de cada unidade. As previsões foram tão favoráveis que Ricardo Cotta Ferreira, superintendente técnico da CNA, procurou relativizar lembrando que este sucesso de faturamento não é “sobra de dinheiro no bolso do produtor” porque os custos de produção subiram e as dívidas acumuladas pelo setor nos anos anteriores precisam ser pagas.

É fato que o PIB do agronegócio avançará muito em virtude do bom desempenho da agroindústria canavieira, apesar da excelente evolução prevista para o segmento de carnes e de cítricos. Porém, é indiscutível que o crescimento bastante provável da agropecuária terá forte efeito multiplicador sobre a economia brasileira. A revisão do PIB realizada pelo IBGE referente à Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) evidenciou o peso da fatia de máquinas e equipamentos (que passou de 35,8% para 48,3% dos investimentos), que contém o forte impulso representado pelo aporte em maquinário vinculado ao agronegócio. Sem esquecer, é claro, do saudável efeito que uma safra recorde produz sobre os cálculos da inflação.

Há um consenso, no entanto, de que a expansão da agricultura neste ano embute forte avanço do setor sucroalcooleiro sobre outras culturas. Diferentes institutos de pesquisa de economia agrícola já alertaram que expectativa tão inflada quanto ao sucesso da cana no mercado já limitou o crescimento da área para plantios de grãos, em especial no norte do Estado de São Paulo e na região do Triângulo Mineiro. Apesar da recente valorização do preço do milho e da soja no cenário externo, a cana está atraindo todas as atenções dos produtores, mesmo quando o plantio da soja se expande para o Maranhão, Piauí e Tocantins, com perspectivas até de mais plantio na região Amazônica.

O fascínio dos agricultores pelos novos projetos em torno das usinas de cana exige alguma cautela. É verdade, como mostraram os números divulgados pelo ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, que a agricultura brasileira ocupa 62 milhões de hectares, dos quais apenas 6 milhões estão destinados ao cultivo da cana. Rodrigues afirmou que o desempenho da agricultura não veio da expansão de área, e sim da produtividade: desde 1993, a área de produção cresceu 23%, enquanto o volume produzido passou de 110% no mesmo período, isto quando a cana não era a “bola da vez”.

Por razões exclusivamente técnicas, como explicou Rodrigues, a cana não deve avançar pelo Pantanal e pela Amazônia devido ao excesso de umidade (no ano todo), o que impediria a planta de concentrar sacarose. Porém, a cana avançará por outras culturas, que efetivamente não é bom para o conjunto de interesses da agricultura brasileira. Não é por outra razão, por exemplo, que a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) já refreou expectativas maiores em relação à soja e estimou a safra deste ano em 56,7 milhões de toneladas, apenas estável em relação à produção do ano anterior.

A cultura da cana, por outro lado, vem acumulando sucesso nos últimos tempos, o que não reduziu os problemas tradicionais do setor. Na semana passada, os fiscais do Ministério Público do Trabalho autuaram oito usinas em São Paulo por manterem trabalhadores em situação irregular, envolvendo até a ausência de água fresca. Foram 72 autos de infração. Também não é possível esquecer o alto endividamento do segmento, em especial dos grandes produtores, e não só os do Nordeste, principalmente com o Banco do Brasil.

Desse modo, alguma cautela é necessária no endeusamento, como novos heróis da produção, de um segmento que acumulou problemas sérios nos últimos anos e uma performance produtiva que não foi a mesma dos demais produtores do agronegócio brasileiro.

kicker: Institutos de pesquisa de economia agrícola alertam que a expansão da agricultura neste ano embute avanço da cana sobre outras culturas

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