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UE propõe parceria ao Brasil, mas sem fazer concessões

A Comissão Européia aprova hoje a proposta de parceria estratégica a ser apresentada ao governo brasileiro, mas, no rico cardápio do entendimento, não aparece nenhuma concessão comercial.

A proposta foi resumida ontem pelo presidente da Comissão, o português José Manuel Durão Barroso, a um grupo de jornalistas brasileiros e portugueses. Em princípio, a parceria estratégica será formalmente lançada no dia 4 de julho, na primeira cúpula entre o Brasil e a União Européia, a ser realizada em Lisboa, já que Portugal preside a União Européia no segundo semestre.

Em vez de acenar com concessões nas negociações sobre a liberalização do setor agrícola, velha e principal reivindicação do Brasil, Durão Barroso jogou o foco nas cobranças que os europeus fazem ao “parceiro estratégico”.

“Comércio não é só agricultura. É preciso não esquecer os bens não-agrícolas (leia-se: indústria). Temos na Europa uma tarifa média de importação de bens industriais de 4%, que pode cair para 2%”, no bojo da Rodada Doha, a mais recente e abrangente ronda de liberalização comercial, afirma Durão Barroso.

Mas cobra: “Nós queremos trocar cortes reais por cortes reais”.

Traduzindo do jargão comercial: o Brasil tem negociado bens industriais a partir do pressuposto de que cortará suas tarifas de importação a partir do nível registrado na OMC (Organização Mundial do Comércio), sempre bem mais alto do que o efetivamente praticado. Há tarifas registradas até de 35%, quando a média efetivamente adotada não vai além de 10%.

Os europeus alegam que cortar apenas a tarifa registrada equivale a cortar água. Daí a cobrança de trocar “cortes reais por cortes reais”.

Para fugir a compromissos sobre redução do protecionismo agrícola, Durão Barroso recorre a antigos argumentos dos negociadores da União Européia. Primeiro, o de que só não liberaliza mais “porque falta um compromisso dos Estados Unidos de reduzir os subsídios internos”.

Segundo, o de que a Europa dá uma série de preferências aos chamados países ACPs (África/Caribe/Pacífico, que são os mais pobres do mundo). Liberalizar sua agricultura também para países como o Brasil “criaria situações muito dramáticas para esses países”, diz Barroso.

Mas a resistência européia se deve na verdade a que “agricultura, em alguns países da Europa, é uma questão sagrada”, como acaba por admitir o presidente da Comissão, braço executivo do conglomerado de 27 países.

Biocombustíveis

À parte, portanto, agricultura, fica como conteúdo econômico da parceira estratégica um entendimento mais estreito em torno dos biocombustíveis. Durão Barroso diz esperar que o Brasil apresente “propostas avançadas” nessa área, em alusão ao desejo europeu de transformar a conferência de Bali (Indonésia), no fim do ano, na plataforma de lançamento de um novo tratado de combate ao aquecimento global, sucessor de Kyoto, que, de resto, nem chegou a ser plenamente implementado.

Os Estados Unidos não estão convencidos da tese européia, e esse deve ser o grande nó da cúpula do G8, na semana que vem, na Alemanha. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participará do último dia da cúpula, que então tomará a forma de G8+5 (os cinco países extra-G8 convidados).

A União Européia, nesse capítulo, coincide com o Brasil, ao defender, como diz Durão Barroso, “um mercado mundial de combustíveis, porque é importante que o padrão seja o mesmo em todos os países”. O Brasil quer essa padronização exatamente para poder comercializar seu etanol de cana-de-açúcar como qualquer outra commodity.

De todo modo, não é nem agricultura nem etanol o eixo da parceira estratégica. Durão Barroso chega a afirmar que “olhar apenas para a agricultura é uma visão reducionista; há muito mais vida além da agricultura”.

O que há de vida nesse novo status da relação entre o grande bloco europeu e o Brasil é “sublinhar o papel cada vez mais importante que o Brasil desempenha no plano internacional”, diz o presidente da Comissão.

Afaga mais ainda: “É uma das maiores democracias do mundo e modelo de coexistência pacífica com seus vizinhos”.

A parceria estratégica significa, na prática, intensificar o diálogo com os europeus nos mais diferentes fóruns. Mas o recheio do acordo depende também do Brasil:

“Queremos que o Brasil diga em que áreas quer desenvolver essa relação estratégica”, afirma Durão Barroso.

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