Encerrada no dia 13 de novembro, a 26ª edição da Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP-26, serviu como importante vitrine para o setor bioenergético brasileiro destacar as potencialidades do etanol como relevante alternativa para reduzir a emissão de CO2 do setor automotivo, ressaltando também sua capacidade de geração de energia limpa e renovável.
Muitas são as expectativas do setor em relação aos desdobramentos das negociações pós COP-26, uma das poucas certezas, no entanto, é que não será uma tarefa fácil. Ao término da reunião, na assinatura do texto final, aprovado por seus quase 200 países membros, o segmento dos combustíveis fósseis, mostrou seu peso e força que ainda exerce na economia mundial, embora conste no documento, a redução gradativa de subsídios para este tipo de combustível e, também do uso de carvão.
Três rascunhos haviam sido divulgados no decorrer dos últimos dias. O segundo deles suavizou as expectativas relacionadas a este tipo de combustível: antes, se falava em acelerar “a eliminação do carvão e dos subsídios aos combustíveis fósseis”; depois, o documento passou a prever “a eliminação progressiva do uso sem restrições” do carvão e dos “subsídios ineficientes para os combustíveis fósseis“. Por último, na versão final, a Índia pediu de última hora para trocar o termo “eliminação” por “redução” do uso do carvão.
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A neutralidade zero (ou emissões líquidas zero) é alcançada quando todas as emissões de gases de efeito estufa que são causadas pelo homem alcançam o equilíbrio com a remoção desses gases da atmosfera, que acontece, por exemplo, restaurando florestas. Isso significa mudar a matriz energética para fontes sustentáveis que não dependem de queima de combustíveis fósseis, em setores como transporte, geração de energia e na indústria.
O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Carlos Moraes, ressalta a necessidade de ampliação da participação dos biocombustíveis na matriz energética de transportes, além de um trabalho de educação com os consumidores sobre os benefícios dos combustíveis renováveis no combate às mudanças do clima. “O Brasil tem um ativo que é muito importante, precisamos combinar esses ativos, essas qualidades, essas vantagens, para poder talvez avançar de forma diferente dos outros países”, afirmou.
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“O etanol é apenas uma parte da solução para esse desafio. É a mensagem que levamos para Glasgow. Para atingirmos uma mobilidade verdadeiramente sustentável, todas as soluções efetivas para redução de emissões são bem-vindas e estamos aqui para mostrar como podemos contribuir nesse esforço mundial”, destacou o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), Evandro Gussi.
O etanol pode, por exemplo, ser complementar à adoção do modelo de transporte elétrico, porque pode ser usado em carros elétricos capazes de produzir a própria energia e ajudar na renovação da frota mundial rumo ao fim do uso de combustíveis fósseis.
Um exemplo da receptividade do combustível é a quantidade de países interessados, como Canadá, Vietnã, Líbano e Coreia do Sul. A Índia está em fase de negociação adiantada com o governo brasileiro e empresas do setor como a Raízen, estão oferecendo apoio tecnológico aos asiáticos. Na América do Sul, o presidente da Colômbia, Iván Duque Márquez, visitou o Brasil em busca de parcerias para desenvolver a produção no seu país.
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Segundo o Sindipeças (Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores), o Brasil tem a sexta maior frota de veículos do mundo, com 46,2 milhões de automóveis em circulação. Isso nos colocaria automaticamente como um grande emissor de CO2 no transporte, mas graças ao biocombustível conseguimos reduzir o esse impacto. Desde 2020, o Brasil substituiu 48% da gasolina automotiva utilizada nos veículos pelo etanol e 85% da frota do país já é de carros flex, abastecidos por álcool e gasolina.
Mercado de Carbono
“Chegamos com alguns potenciais a materializar. O Brasil contribui com 3% dos gases de efeito global. As nossas grandes oportunidades de redução de emissão estão na contenção do desmatamento, depois uso da terra, e terceiro transporte, com uso de biocombustíveis, com capacidade para nos transformar num grande fornecedor para o mundo, sem contar o mercado de carbono, com o RenovaBio. Tudo que vem do processo da cana pode ser altamente benéfico, podendo gerar riquezas que variam de 70 a 100 bilhões de dólares com carbono. Mas a grande ameaça está em fazer tudo isso acontecer, pois financiar esse tipo de transformação requer grandes recursos”, aponta a administradora que atua no setor financeiro, integrante da equipe da Mauá Capital, Carolina da Costa.
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Segundo ela, para que se converta a mudança de manejo em algo que vire um ativo, tem que ter um projeto. “O RenovaBio é um programa que enfrenta problemas com o fluxo de informação na cadeia de rendimento. O mundo só vai entender nosso carbono, quando nós comprovarmos que temos um controle sobre isso. Hoje ele ainda tem preços de mercado voluntário de carbono, não de mercado regulado”, afirma Carolina.
Para o engenheiro agrônomo da Embrapa, Marcelo Morandi, em relação ao biocombustível, o país esbarra na competição pelo uso da terra. “A Europa não tem condições de fazer isso no mesmo território. A gente tem, pois a nossa expansão em cana não afeta nossa produção de alimentos. Isso já conseguimos mostrar, mas infelizmente, nos últimos anos essa questão voltou por conta do desmatamento. Porque o mercado de carbono tem outros componentes indiretos, mesmo que o setor não tenha ligação, como o desmatamento da Amazônia, por exemplo. Precisamos primeiro resolver essa ameaça como país”, ponderou.
O engenheiro agrônomo e professor da Unicamp, Gonçalo Pereira, acredita que “ninguém vai ouvir o Brasil enquanto a Amazônia estiver queimando. Precisamos em primeiro lugar acabar com as queimadas. Em seguida temos que simplificar as coisas. Hoje, por exemplo, eu não consigo comprar um CBIO. Aliás, muita gente nem sequer sabe que isso existe. Por exemplo, o bitcoin é uma moeda que qualquer um pode comprar. Então precisamos fazer esse negócio ir para o coração das pessoas e passar a comercializar isso de forma mais simples”, sugeriu.
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O CBIO só tem valor se tiver lastro, ou seja, credibilidade, enfatiza Marcelo Morandi. “Não estou vendendo um produto físico e sim uma externalidade, um produto virtual. O CBIO não é do agro, não é da usina, é do etanol. Se essa cadeia não estiver organizada, ninguém ganha. Mas enquanto todos estão olhando apenas para o preço do CBIO, estão deixando de perceber o ganho que ele está trazendo para a cadeia de produção, trazendo a questão ambiental para o centro das discussões”.
O Brasil quer mais
Em sua participação na COP 26, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, anunciou metas climáticas ambiciosas: redução de emissões de 50% até 2030 e neutralidade climática até 2050; zerar o desmatamento ilegal até 2028; e apoio à redução global de metano.
“Nossa agricultura de baixo carbono já restaurou quase 28 milhões de hectares de pastagens degradadas; temos 16 milhões de hectares de florestas nativas em recuperação; temos o maior programa operacional do mundo de biocombustíveis, nossas energias renováveis contribuem com 84% da nossa matriz elétrica, gerando o recorde de empregos em solar e eólica; e nosso programa de gestão de resíduos sólidos já reduziu em 20% o número de lixões a céu aberto”, disse.
Leite enfatizou que o Governo do Brasil quer mais. “Há menos de um mês, lançamos as bases do Programa Nacional de Crescimento Verde, para dar prioridade a iniciativas verdes, sejam públicas ou privadas, voltadas à redução de emissões, conservação florestal e uso racional de recursos naturais, dessa maneira contribuindo para a geração de empregos verdes. O programa já nasce com recursos de bancos federais da ordem de 50 bilhões de dólares”, comentou.
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O ministro afirmou ainda que, na conferência e, mesmo muito antes de estarem lá, tem sido feito um trabalhado para que seja alcançado resultados positivos na criação do mercado global de carbono.
“É importante que os países desenvolvidos reconheçam a emergência financeira e mobilizem os recursos necessários para atingir os objetivos desejados nesta conferência. A meta dos 100 bilhões de dólares não foi cumprida, e este valor já não é mais suficiente para que o mundo construa uma nova economia verde com uma transição responsável”, analisou.
O ministro Joaquim Leite enfatizou também que todas as partes da conferência devem assumir suas responsabilidades comuns, porém diferenciadas na direção de uma economia verde neutra em emissões. “O desafio global a ser superado é reverter a lógica negativa da punição, da sanção e da proibição, para a lógica positiva do incentivo, da inovação, da priorização”, discursou.
Na trilha do caminho da sustentabilidade, o setor bioenergético vem se reinventando, se modernizando, investindo em tecnologia e em práticas ambientais sustentáveis. A expectativa é prosseguir ampliando o alcance desse trabalho.
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