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Setor agrícola vê com reservas o “paralelismo”

O setor agrícola brasileiro considera a iniciativa européia de destravar as negociações da Rodada Doha como “um passo fundamental”. Mas também vê com reservas a pretensão ao chamado “paralelismo”: vincular o fim dos subsídios à exportação a eliminação dos créditos concedidos por países como Estados Unidos, Austrália e Canadá. O setor teme que, assim, a idéia deixe de ser “factível”. A proposta européia foi apresentada aos demais membros da Organização Mundial de Comércio (OMC) em carta assinada pelos comissários de Comércio da UE, Pascal Lamy, e de Agricultura, Franz Fischler.

“É um passo fundamental. A União Européia está mudando o jogo. Ela jogou a peteca para os Estados Unidos, saiu do impasse e vai chegar a Paris mais tranqüila”, avalia Pedro de Camargo Neto, coordenador da área internacional da Sociedade Rural Brasileira. O especialista se refere a mini-conferência ministerial que acontece na sexta-feira em Paris.

Para o diretor-presidente do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), Marcos Jank, a posição européia não é factível ao estabelecer o paralelismo, pois a UE sabe que o crédito à exportação não será eliminado.

“Dessa forma, a UE está propondo uma disciplina mais rígida para a agricultura do que para a indústria”, diz Jank. Os subsídios à exportação já são proibidos no setor industrial e só foram mantidos na área agrícola por conta de um acordo no fim da Rodada do Uruguai.

Mas não existe na OMC nenhum mecanismo que estipule regras para os créditos à exportação. O tema é discutido há anos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), sem sucesso.

Os Estados Unidos são hoje os campeões em concessão de créditos à exportação. Também há mecanismos de apoio, que podem ser transformados em subsídios, como ajuda alimentar e as empresas estatais de exportação. Nesse último caso, os exemplos mais conhecidos sobre o monopólio de exportação de açúcar da Austrália e de trigo do Canadá.

Antonio Donizetti Beraldo, chefe do departamento de comércio exterior da Confederação Nacional da Agricultura, reconhece que os europeus têm razão ao criticar os créditos à exportação. “São formas disfarçadas de subsídios, que tem ser eliminadas”, diz. Mas, para Beraldo, o maior volume de subsídios está no apoio doméstico. Para Jank, a carta de Lamy e Fischler não traz nenhum ganho nesse tema, que é fundamental para a agricultura. “É a causa de todos os problemas. Se não mexermos no apoio interno, nada será resolvido”.

O diretor do Icone também chama a atenção para uma proposição “perigosa” dos europeus na carta: a introdução do conceito de gradação entre os países em desenvolvimento.

Os europeus querem conceder acesso livre a mercados para os países do G-90, que incluem os mais pobres do mundo. Mas dizem que os países mais ricos entre as nações em desenvolvimento, como Brasil e Índia, também devem abrir seus mercados, sem usufruir dos mesmos benefícios concedidos ao G-90. “Querem nos tirar um privilégio concedido historicamente na OMC”, diz Jank, referindo-se ao tratamento especial que deve ser concedido aos países em desenvolvimento.

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