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Sem motivos para adiar

Enquanto delegações internacionais se encontram em Montreal para decidir o que fazer com o aquecimento global e com o Protocolo de Kyoto em vigor, algumas nações ao redor do mundo ainda se preocupam com a idéia de que as reduções de gases de efeito estufa terão efeitos negativos em suas economias. A questão se tornou central nas futuras negociações. Estimativas de economistas variam entre custos reais e fortes benefícios. Já é hora de lançar alguma luz a esse debate, sob a forma de experiências do mundo real.

É bastante simples apontar as vantagens econômicas que decorrem de medidas de redução de poluição

É bastante simples apontar as vantagens econômicas que decorrem de medidas de redução de poluição, de aumento de eficiência e da prevenção dos custos dramáticos resultantes das alterações no clima global. A expectativa de furacões mais intensos é apenas mais um dos terríveis exemplos de como a inação pode ser o custo mais alto com o qual teremos que arcar.

Califórnia e São Paulo, dois dos maiores e mais prósperos Estados em seus respectivos hemisférios, podem sinalizar a resposta.

A Califórnia, sozinha, é a quinta economia mundial. Enquanto algumas nações temem as conseqüências econômicas de reduzir as emissões de gases de efeito estufa, nossos Estados se tornaram líderes internacionais em tal mitigação, medida em termos de emissões per capita ou por unidade de PIB estadual. Nossa experiência oferece uma visão de sucesso ao resto do mundo, que demonstra ser possível reduzir a ameaça de aquecimento global e se beneficiar economicamente disso.

O Estado de São Paulo, que representa cerca de um terço da economia brasileira, seria o 39º maior emissor global de gases de efeito estufa se posto lado a lado com as demais nações. Porém, desde 1999, estamos sistematicamente reduzindo as emissões de gases de efeito estufa, tanto per capita como por unidade de atividade econômica. Estamos gerando energia por gás de aterro, e o álcool, misturado à gasolina, está economizando ao consumidor 7,5 bilhões de dólares por ano. Estamos respirando ar mais limpo e conservando eletricidade.

A Califórnia é o 20º maior emissor mundial de gases de aquecimento global. Mas, com o auxílio de políticas estaduais que encorajam o uso de gás natural e de fontes renováveis de energia em vez do carvão mineral, assim como a promoção de medidas de eficiência energética, cada californiano produz menos da metade de emissões de gases de efeito estufa que seus compatriotas dos outros Estados norte-americanos.

As emissões estaduais per capita foram reduzidas em cerca de um terço desde 1975, enquanto as nacionais permaneceram inalteradas. O uso eficiente da eletricidade economizou à Califórnia o equivalente a 20 usinas de 500 megawatts cada. Cada californiano economizou cerca de mil dólares entre 1975 e 1995 apenas com padrões mais eficientes para edifícios e aparelhos domésticos. Ganhos em eficiência energética ajudaram a economia a crescer mais 3% -um ganho adicional de 31 bilhões de dólares. O crescimento em postos de trabalho criados pela indústria da eficiência energética, de pouca visibilidade, porém de enorme impacto, gerará mais 8 bilhões de dólares em salários nos próximos 12 anos.

Nossos Estados aprenderam que emissões excessivas de gases de efeito estufa indicam um sistema econômico ineficiente. Quando a eficiência é assim lucrativa, são dólares e reais saindo pelas chaminés ou pelos canos de escapamento. No mundo real, os custos de redução das emissões de gases de efeito estufa em outras nações industrializadas também têm se revelado bem mais baixos que aqueles utilizados em vários modelos econômicos e, de fato, economias líquidas geralmente ocorrem.

Os países em desenvolvimento podem considerar as possibilidades oferecidas por “saltos tecnológicos”, isto é, se beneficiar das “curvas de aprendizado” dos países industrializados, adotando novas tecnologias, das quais outros países já arcaram com os custos iniciais associados com seu desenvolvimento.

Tendo em vista nossa experiência comum, São Paulo e Califórnia estão assinando um acordo para trabalhos conjuntos em termos de identificação e implementação de ações que podem reduzir ainda mais as emissões de gases de efeito estufa. Entretanto, nossos Estados e outros podem se beneficiar ainda mais com melhores políticas nacionais e uma cooperação internacional ainda maior em reuniões como a de Montreal.

Ministros de todo o mundo podem criar uma resposta eficiente e menos fragmentada às ameaças do aquecimento do planeta, estimulando investimentos ainda maiores em reduções de emissões e em melhorias de eficiência energética. A lição promissora de nossos dois Estados pode assim se disseminar de uma forma mais ampla e rápida. A experiência mostra que podemos trabalhar numa larga escala para reduzir a ameaça de aquecimento global e gerar vultosos benefícios econômicos. Não há motivos para adiar.

Alan Lloyd, 63, químico, Ph.D. pela Universidade do País de Gales (Reino Unido), é o secretário do Meio Ambiente do Estado da Califórnia (EUA).

José Goldemberg, 77, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, é o secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Foi reitor da USP (1986-89), secretário da Ciência e Tecnologia da Presidência da Republica e ministro da Educação (governo Collor).

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