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Sem acordo em Puebla, Alca corre risco de ficar para depois de 2005

A reunião da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) que começa hoje em Puebla, no México, terá como missão tentar fazer os países envolvidos chegar a um consenso em torno dos textos básicos de adesão ao bloco. Se continuarem as discussões e a dificuldade de chegar a um acordo, a data de 2005 para o término das negociações ficará inviável. É necessário chegar a um consenso sobre a estrutura da Alca para aprofundar as negociações sobre ofertas de acesso a mercados, com as listas de produtos detalhadas, que devem terminar em setembro. Se a negociação da estrutura da Alca continuar emperrada, as ofertas de acesso também não andam.

Para cumprir o mandato de Miami, a reunião do Comitê de Negociação Comercial (CNC) em Puebla teria que determinar os compromissos mínimos de todos os países nas diversas áreas e elaborar o texto para adesão, e fazer também o texto para os países que queiram aderir ao segundo nível de compromisso, mais aprofundado, além de estabelecer os procedimentos para negociação dos acordos. Mas a declaração ministerial de Miami é vaga e dá margem a diversas interpretações entre os países.

Um dos pontos que deve provocar polêmica é a relação entre o acesso a mercados e o nível de comprometimento aceito por cada país. O governo do Brasil defende que não haja diferenciação nas ofertas de acesso a mercado dentro do bloco, enquanto os Estados Unidos acreditam que o benefício comercial obtido pelo país deve ser proporcional ao nível de comprometimento atingido nos acordos. Chile e Canadá, por sua vez, devem propor que a adesão ao segundo nível de comprometimento seja obrigatória para todos, determinando um período de tempo para que isso ocorra.

O Brasil é contra essa proposta e o co-presidente da Alca, embaixador brasileiro Adhemar Bahadian, já disse que essas interpretações significariam “reabrir” a negociação fechada na ministerial de Miami.

“Pelo que tenho ouvido dos negociadores americanos, pode haver novas dificuldades e mais briga na negociação em Puebla”, diz uma fonte diplomática brasileira envolvida nas negociações. O discurso dos negociadores americanos continua sendo de buscar uma Alca o mais abrangente possível, mesmo no novo modelo. O Brasil já tem claro o que poderá aceitar nos capítulos de maior “sensibilidade” política, propriedade intelectual, compras governamentais e investimentos.

No primeiro desses três grandes temas, o Brasil só aceita o que está estabelecido na Organização Mundial do Comércio (OMC), que é basicamente o acordo TRIPS, de proteção à propriedade intelectual. Em compras governamentais, o governo brasileiro só pretende aceitar o compromisso de aumentar a transparência nos processos, mas não aceita abrir acesso às licitações por empresas estrangeiras. No acordo de investimentos, o Brasil prefere uma garantia genérica aos investidores. EUA, Canadá e Chile devem propor a inclusão de cláusulas que garantam o direito de investidores de serem tratados em igualdade de condições com investidores nacionais em diversos setores.

O direito adquirido de investir é dado ex-ante, ou seja, antes mesmo de o investidor instalar-se no país. Outro mecanismo sugere a solução de disputas entre investidores estrangeiros e governos num tribunal específico de solução de controvérsias. Bahadian já deixou claro que aceitar essa cláusula é impossível para o Brasil por criar um conflito com o sistema jurídico brasileiro.

Em alguns acordos bilaterais de livre comércio, o capítulo de investimentos determina também a abertura generalizada ao investimento estrangeiro, com restrições apenas nos setores escolhidos pelos países. É muito difícil que um texto assim seja proposto, já que os países estão fazendo ofertas de abertura dos setores de serviços.

Essa oferta, também, provoca dissensões entre Brasil e Estados Unidos. O Brasil fez a oferta na forma de “lista positiva”, ou seja, uma oferta que nomeia os setores no qual será permitido o investimento estrangeiro, e os demais permanecem fechados. Os EUA defendem a abertura do setor com “listas negativas”, ou seja, que nomeiem os setores no qual não será permitido o investimento, liberando todo o restante para abertura.

“Dada a situação política nos diversos países, é um desafio enorme chegar a um consenso sobre a estrutura da Alca nessa reunião”, afirma a consultora Kellie Meiman, da Kissinger McLarty Associates.

Outro problema até agora foi a falta de reuniões preparatórias para o encontro do Comitê de Negociação Comercial, que poderia ter criado um denominador comum para discussão na reunião. O governo dos EUA tentou marcar algumas reuniões anteriores ao encontro de Puebla, com um grupo limitado de países que excluía, por exemplo, a Venezuela. O Brasil e outros integrantes do Mercosul protestaram e as reuniões acabaram sendo desmarcadas.

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