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Rubens Ometto começa a desenhar como será a Cosan sem ele

Rubens Ometto e seus sócios — Foto: Exame

Reza a lenda que o empresário Roberto Marinho certa vez se recusou a receber uma tartaruga de presente. O bicho, como se sabe, pode viver cerca de 150 anos. Quando perguntaram o motivo, Marinho respondeu: “Eu vou me apegar ao bichinho. Depois ele morre, como é que vai ser?” A sensação de imortalidade, que a anedota acima simboliza perfeitamente, é um traço comum a homens e mulheres que construíram impérios.

Nos negócios, costuma ser um dos fatores que dificultam a sobrevivência de grandes empresas familiares quando o comando passa às gerações seguintes. Quando o dono não larga o osso, nem a família nem a empresa se preparam para o dia em que ele não estará mais lá para mandar. Aos 66 anos, o empresário Rubens Ometto decidiu não incorrer nesse erro.

Dono do grupo Cosan, um gigante que fatura quase 50 bilhões de reais e controla a Comgás, maior distribuidora de gás natural do Brasil, a Raízen, terceira maior rede de distribuição de combustíveis do país (em sociedade com a anglo-holandesa Shell), e a Rumo, maior operadora ferroviária da América Latina, Ometto decidiu começar, já, a desenhar como será a Cosan sem ele. Num lance surpreendente, criou um modelo de partnership em que um seleto grupo de executivos se torna sócio da família Ometto e passará a aprovar decisões fundamentais no comando do grupo, como a escolha do presidente.

O grupo inicial foi escolhido e é formado por Marcos Lutz, presidente do grupo, Marcelo Martins, vice-presidente de finanças, Marcelo Portela, vice-presidente jurídico, e Burkhard Cordes, que assumiu neste ano a gestão de risco, acumulando a função de presidente da Aguassanta Participações, family office de Ometto. O compromisso é que eles fiquem mais uma década na companhia. “Eu admito que vou morrer”, disse um bem-humorado Ometto a EXAME na entrevista que pode ser lida a seguir.

Como é a nova estrutura de controle do grupo Cosan?

A holding que controla as empresas do grupo, a Cosan Limited, passa a ter como acionistas alguns executivos do grupo. Eles se tornam meus sócios. Estou doando ações a quatro deles, inicialmente, mas essa estrutura poderá incluir até dez pessoas. Eles vão receber, em dez anos, o correspondente a 1% do grupo cada um.

Considerando o valor de mercado atual da holding na bolsa de Nova York, isso equivale hoje a 20 milhões de dólares. Fizemos um acordo de acionistas com as responsabilidades de cada um. Os executivos poderão indicar conselheiros. A definição da diretoria da holding e das empresas que estão abaixo dela será feita por indicação da minha família, mas será submetida à aprovação dos sócios.

Como foram escolhidos os executivos?

Todos têm o DNA do grupo, pois estão comigo há anos, são treinados, leais e talentosos. Em uma década fizemos uma revolução no grupo, que antes era basicamente formado por um negócio de açúcar e álcool e hoje é muito diversificado. Em 2007, nosso faturamento era de 1,7 bilhão de reais e foi para 48,5 bilhões de reais, considerando somente o proporcional às nossas participações nas empresas.

Companhias como Comgás e Rumo são irreplicáveis. A geração de caixa passou de 400 milhões de reais para 6,2 bilhões. Tem empresário que acha que fez tudo sozinho. Não é o meu caso. Se tenho um talento, é o de escolher a turma que está comigo e deixá-la trabalhar. Faço muitas cobranças e participo de decisões estratégicas, mas eu os deixo trabalhar e os escuto muito. Brinco que vou escrever um livro e dizer que tudo no grupo Cosan foi minuciosamente planejado e calculado por mim. É uma brincadeira, porque não foi nada disso.

Como o modelo foi definido?

Conheço o modelo adotado por outras empresas, como o dos bancos Bradesco e BTG Pactual e o do Grupo Ultra, e avaliei ao longo do último ano qual seria o melhor formato no meu caso. Pensei inicialmente em incluir 20 pessoas, mas aí ficava muita gente, e o arranjo se tornaria complicado.

Quis fazer um negócio simples e envolvê-los cada vez mais para trabalhar na valorização das ações e das companhias. Quando o executivo-sócio deixar de ter uma função no grupo, ele estará fora da sociedade. Meu objetivo foi fazer um acordo de gestão, e esse modelo viabiliza três coisas: dou a eles uma remuneração extra, consigo vinculá-los ainda mais à organização, e isso me garante a continuidade da empresa.

Por que isso agora?

Eu não acredito muito nas corporações sem controlador. O Rolim Amaro, fundador da TAM, falava para os gerentes dele: “Trabalhe como se a empresa fosse sua, mas não esqueça que ela é minha”. Mas meu objetivo é definir uma continuidade para a empresa quando eu não estiver mais nela. Com esses executivos, sei que asseguro isso. Aos 66 anos, eu não gosto nem quero varar a noite em reuniões ou não controlar minha agenda.

Em novembro, a Cosan renovou o acordo com a Shell na Raízen. Agora esse acordo não tem mais data para acabar. As duas coisas estão relacionadas?

Não criamos a partnership por isso, mas uma coisa ajudou a outra. Quando assinamos o acordo de sociedade com a Shell em 2011, na Raízen, era um casamento entre desconhecidos, e não sabíamos se daria certo. Por isso, tínhamos uma cláusula de saída, em que eles poderiam comprar minha participação e, caso não quisessem, eu poderia comprar a deles.

Mas a gestão funcionou, nunca tivemos qualquer atrito, e os resultados são excelentes. Por isso renegociamos para um casamento eterno, em que eu sou o presidente do conselho da Raízen até eu morrer ou até cansar. Havia uma preocupação da Shell com essa sucessão no grupo, e a nova estrutura da Cosan Limited os deixou mais tranquilos.

Qual é a preparação de sua família nesse processo de sucessão?

Vou começar a fazer essa arrumação familiar agora. Eu tenho duas filhas, que não têm ambição de participar do negócio nem querem ser executivas. Elas vão participar do conselho e precisarão ter uma reunião prévia e votar em conjunto. Caberá aos meus descendentes indicar um presidente para o conselho de administração da holding, o qual terá de ser aprovado por maioria, com voto dos partners.

Entendo que esse seja o limite da família, não é bom ter parentes na gestão executiva. Brigas de acionistas nascem sempre por ter gente da família trabalhando no dia a dia da companhia. Quando entrei para o grupo do meu avô, meus pais eram brigados com a maioria dos irmãos e depois eu também tive disputas familiares. Quando isso acontece, a -empresa não cresce.

As informações são da Revista Exame.

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