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Reflexões sobre os impactos do aquecimento do mercado de biocombustível sobre a gestão de pessoas – II

Com a valorização das fontes alternativas de energia, o álcool começa a chamar a atenção de investidores e movimenta o mercado de ações. A todo momento lemos notícias como essas: ” … Cargill compra a Cevasa e entra no mercado da cana-de-açúcar …O milionário George Soros compra a usina Monte Alegre….. A Vale do Rosário foi assediada pela Cosan, pelas multinacionais Bunge e Cargill … Seguindo o caminho aberto com sucesso pela Cosan, a São Martinho é a segunda empresa do ramo de açúcar e álcool a abrir capital e negociar suas ações na Bovespa….Bill Gates da Microsoft, Larry Page e Sergey Brin pretendem investir pesado em usinas de cana….”

O que investidores e mercado de capitais teriam a ver com gestão de pessoas? Mais do que se poderia supor!

Há não muito tempo atrás, as informações e registros do balanço contábil, mais especificamente os ativos, definiam o valor das empresas no mercado. Hoje é muito comum que o valor das empresas, principalmente daquelas cujos produtos envolvem alta tecnologia, supere dezenas e até centenas de vezes o seu valor contábil. Em 1998, o valor de mercado da Microsoft já superava em cem vezes o seu patrimônio líquido.

Estudos indicam que essa diferença se deve ao valor do patrimônio intangível que, embora seja percebido pelos investidores e pelo mercado, envolve itens difíceis de mensurar e contabilizar. O que constitui o patrimônio intangível são ativos como reputação, marca, credibilidade, relacionamentos, conhecimentos, competências e capacidade de inovar.

É possível fazer manutenção, depreciar, comprar, vender, segurar e proteger ativos como máquinas, equipamentos, prédios, etc., mas e quando os ativos são os conhecimentos e as competências dos profissionais que estão a serviço da empresa? É aí que entra a gestão de pessoas. Gestão de conhecimentos e gestão de competências é matéria de RH.

Um sistema eficaz de gestão de pessoas, além de ser uma das características de organizações socialmente responsáveis, pode aumentar a rentabilidade da empresa e contribuir com a valorização de suas ações no mercado.

Os pesquisadores Brian Becker e Dave Ulrich estudaram 2800 empresas entre os anos de 1990 a 2001 e confirmaram: as empresas com sistemas de gestão de pessoas mais eficazes apresentam níveis de desempenho drasticamente mais elevados: vendas por empregado: 4 vezes maior, valor de mercado 3 x maior que o valor contábil, índices de turnover 50% menores. O guia Exame – Você S/A revela que os índices de rentabilidade das melhores empresas para se trabalhar (as melhores em gestão de pessoas) são significativamente superiores que as empresas do rank das maiores.

Como a gestão de pessoas pode fazer isso? Alinhando todos os sistemas, processos e políticas de recursos humanos às estratégias do negócio. Promovendo o desenvolvimento das competências básicas e principalmente das competências estratégicas para a empresa. Criando sistemas e políticas que estimulem a aplicação desses conhecimentos e competências para o cumprimento de metas e alcance de resultados desejados pela empresa. Criando sistemas de remuneração e recompensa que valorizem desempenhos superiores. Promovendo clima propício à produtividade e à geração de resultados. Desenvolvendo líderes capazes de levar o time à vitória do campeonato.

E como estão estruturados os sistemas de RH no segmento sucroalcooleiro? A grande maioria conta com setores voltados para atividades operacionais administrativas como folha de pagamento, benefícios, segurança e medicina, e para cumprimento das exigências legais trabalhistas. Porém, embora tímidos, já se notam alguns movimentos que evidenciam a preocupação das Usinas com a modernização dos sistemas de gestão de pessoas.

Já se tem notícias de iniciativas como a implantação de sistemas de gestão do desempenho humano ligado ao desempenho organizacional, a remodelagem de sistemas de remuneração – algumas mais agressivas oferecem inclusive opções de compra de ações (stock options), implantação de sistemas de gestão por competências – conceito de vanguarda quando se trata de gestão de pessoas.

Tenho notado também que nas aulas dos cursos de MBA em Gestão Estratégica de Pessoas, no interior de São Paulo cresce a presença de profissionais desse setor, principalmente de profissionais que não atuam diretamente em RH, mas são gestores da área de produção, finanças, engenharia etc. Quando perguntados por que buscaram esse curso, a resposta é muito positiva: “estamos nos conscientizando de que é pela gestão eficaz de pessoas que poderemos potencializar os resultados do negócio”.

Isso é animador porque é sinal de que a consciência está sendo despertada e a intenção existe. Mas o quanto dessa intenção está sendo traduzida em ações? As reestruturações e adequações dos sistemas de gestão de pessoas nas Usinas conseguirão acompanhar a rapidez das mudanças que estão ocorrendo nos mercados? Cresce a responsabilidade dos profissionais de RH, que precisam ter visão estratégica e estar preparados para responder rapidamente as novas complexidades do ambiente em que operam suas organizações.

*Denise Lustri, é mestre em Administração pela FEA-USP, especialista em gestão estratégica de pessoas, sócia da Quinto Fator, professora no MBA de Gestão Estratégica de Pessoas da FGV e no MBA de Administração de Organizações da Fundace. denise.lustri@quintofator.com.br

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