JornalCana

“Quando o país der certo, nós estaremos cinco anos à frente”

Um dos pivôs da maior disputa societária do país (a que envolve o conglomerado Odebrecht), Bernardo Gradin deixou a Braskem –que presidiu até 2010– no passado.

E no futuro.

Às vésperas de inaugurar a primeira produção nacional de álcool de celulose, o empresário de 49 anos têm na mira outros três setores, e um deles é a química. Mais precisamente bioquímica de última geração: micro-organismos capazes de transformar gás carbônico em compostos que hoje vêm do petróleo.

Não espere, porém, uma disputa com a companhia que presidiu. No modelo de negócios que desenhou para os bioquímicos, as grandes indústrias não serão rivais, mas parceiras da Granbio, sua nova empresa.

Embora se diga otimista com o potencial do Brasil, ele vê o país “atolado na corrida pela inovação tecnológica”. Para atrair investimentos de ponta, diz, o país precisa de regras que sejam cumpridas, propriedade intelectual protegida e financiamento abundante. “O Brasil concorre mal. Péssimo.”

Apesar das críticas, a Granbio investe R$ 400 milhões na produção de etanol, na maior parte dinheiro da própria família Gradin (o BNDESPar tem 15%), e planeja erguer uma indústria por ano pelos próximos dez anos.

“Vamos aproveitar a oportunidade de perceber antes dos outros que o Brasil vai funcionar. Imagina se daqui a três anos o Brasil tiver um modelo regulatório favorável? Estarei cinco anos na frente de quem vai ter que começar do zero.”

Folha – Qual a situação do Brasil na corrida pela inovação?

Bernardo Gradin – Estamos atolados. Para o empresário atuar em fronteiras do conhecimento, ele precisa ter não só patrimônio humano –cientistas, conhecimento local– mas também incentivo de políticas claras para transformar ciência em tecnologia e, sobretudo, transformar tecnologia em produto que chegue ao mercado.

Quantos anos de atraso?

A velocidade é tão feroz que talvez já estejamos um século atrasados.

Parte da minha agonia é que nenhum país tem a possibilidade que o Brasil tem de converter carbono em produtos em escala: combustíveis, bioquímicos, nutrientes e quem sabe mais tarde até genética mais aplicada.

Ao mesmo tempo temos quase uma compensação negativa: um processo complexo, mentalidade empresarial pouco inovadora. A gente tem que correr, temos que montar num foguete.

Se considerarmos a educação, não são décadas, é um século. Se considerarmos a postura empresarial, um outro século. O quanto o legislador considera isso prioridade para o bem-estar, um outro século.

Quando o sr. fez seu plano de negócios em 2011, imaginava uma economia como está hoje? Ou era mais otimista?

Era mais otimista. Achava que o Brasil poderia crescer 5%. Há avanços espetaculares, a erradicação da pobreza em andamento, base de educação melhorando. Mas temos que estar mais atentos ao custo de fazer negócios, para que atraia mais investimento e inovação.

Em 2011 eu via uma tendência melhor de investimento direto propiciando tecnologia.

Por que piorou?

O Brasil perdeu a oportunidade de ter a favor dele o vento soprando, que é a opinião dos investidores estrangeiros. É preciso não só fazer bem o dever de casa mas vendê-lo bem. Fazer a política certa, controlar a inflação, mas também ser atrativo, criar um círculo virtuoso em que um investidor puxa o outro e se cria um consenso de que é bom investir no Brasil.

Tínhamos esse consenso, mas não aproveitamos.

O que espera da economia de agora em diante?

Em geral, sou otimista, mas vejo com preocupação o curto prazo. Ainda estamos décadas atrás no modelo mental. O governo não pode ter vergonha de atrair empresas e gerar empregos.

É uma questão ideológica?

Pode até ter, mas é principalmente de qualificação. Não temos como prioridade qualificar membros das embaixadas e do governo para que sejam pró-business.

Regra clara, leve, não tem. Sistema de financiamento, só o BNDES. As cadeias de valor são supertaxadas e quem paga todos os impostos ainda concorre com quem não paga e fica impune.

Não é fácil fazer negócio no Brasil. Aqui se tenta regular o que é o risco, o que é o lucro.

Com tudo isso, o Brasil tem um estilingue para ir para a frente, mas não está puxando o elástico; estamos presos.

O sr. presidia uma das maiores empresas brasileiras. Não era possível implantar inovação? É mais fácil fazer numa empresa nova?

Infinitamente mais fácil.

Mesmo com maior acesso a capital, a mercado? Mais garantias, história comprovada?

Uma empresa grande tem muita dificuldade para se reinventar, considerar que seu negócio principal pode desaparecer em dez anos. Ter que demonstrar que o negócio como é vai continuar crescendo cria uma barreira de enfoque gigantesca.

Pode ter uma área de inovação, a incremental. A Braskem tem uma equipe de inovação para o cliente que é uma das melhores do mundo. Mas, se disser que vai crescer num negócio novo, deixa de demonstrar que seu core business vai ser competitivo daqui a dez anos –e 90% do seu tempo é pago pelo acionista, você tem que mostrar resultado de três em três anos.

É mais difícil fazer com capital aberto?

Não necessariamente, mas a estrutura de capital é um fator limitante. Se a regra do jogo original for ser inovadora, tudo bem. Mas, se mudar muito a regra do jogo, gera turbulência no mercado.

Com toda a insegurança e dificuldade que o sr. descreve, por que então investe seu dinheiro em inovação de ponta?

Porque estamos aproveitando a oportunidade de ver antes dos outros que o Brasil vai funcionar. De acreditar que, na hora em que demonstrarmos que é possível fazer, a regulação vem atrás.

Imagine se daqui a três anos houver um modelo regulatório favorável a biotecnologia e bioquímica? Estou cinco anos na frente de quem vai ter que começar do zero.

Inscreva-se e receba notificações de novas notícias!

você pode gostar também
Visit Us On FacebookVisit Us On YoutubeVisit Us On LinkedinVisit Us On Instagram