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Presidente reafirma independência da política monetária e autonomia do BC

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva emitiu ontem a sua principal mensagem pública na defesa da autonomia e da credibilidade do Banco Central. Disse que o câmbio é flutuante num dia em que a cotação do dólar caía abaixo de R$ 2,00. E reafirmou a independência da política monetária a três semanas de uma importante reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em que seus membros estão divididos entre cortes de 0,5 e 0,25 ponto percentual na taxa básica de juros.

“Vocês querem câmbio fixo? Não. Então, meu caro, vamos deixá-lo flutuar”, afirmou, dizendo que ouve isto sempre que faz a pergunta a empresários, e descartando a defesa de um piso para a cotação da moeda. Poucas vezes Lula fez um discurso tão enfático de apoio à política cambial. Em dezembro de 2004, por exemplo, fontes do Palácio do Planalto difundiram rumores de que Lula determinou ao BC segurar o dólar em R$ 2,70. Os juros futuros dispararam, e um isolado Banco Central soltou uma nota de desmentido.

Ontem, Lula incorporou o discurso do BC, relativizando a apreciação do câmbio, lembrando que o real se valoriza ante o dólar, mas não em relação a outras moedas, como o euro. Reconheceu o impacto da valorização do câmbio em alguns setores da economia, mas descartou saídas heterodoxas. “Não podemos resolver o problema do câmbio como alguns querem que a gente resolva: Ah, cria o câmbio para a agricultura, cria o câmbio soja, cria o câmbio-automóvel, o câmbio-parafuso. Não dá.”

O presidente disse que “não tem milagre” para resolver o problema do câmbio. “O dólar vai se ajustar na medida em que a gente começar a importar mais bens de capital, na medida em que reduzir a taxa de juros, que está sendo reduzida”, disse. Reproduzindo avaliação do BC, ele ponderou que é inevitável que a moeda se fortaleça mais “na medida em que o Brasil vá consolidando a sua economia”. A solução, disse, é setorial. Ele acenou com o aumento da tarifa de importação de alguns produtos, como foi feito com o têxteis e calçados, e com a desoneração tributária.

O deslize foi ao admitir que a intervenção do BC no câmbio visa a conter a apreciação da taxa, algo sempre negado pela autoridade monetária. “Hoje estamos comprando dólar para não baixar (a taxa de câmbio) e estamos comprando muitos dólares.”

“Não vou interferir no Copom porque acredito que quanto mais autonomia tiver o BC melhor para o país, e eu acho que não precisa mandar lei para o Congresso estabelecendo essa autonomia”, afirmou Lula, quando perguntado sobre a taxa selic. Em textos acadêmicos, membros do BC dizem que, em virtude de dúvidas sobre sua autonomia, os juros ficaram alguns graus acima do necessário, apenas para conquistar credibilidade.

Lula se referiu em particular a um momento pouco antes das eleições para prefeito de 2004, quando o BC iniciou uma ciclo de aperto monetário. “Não pensem que não recebi dezenas de telefonemas: Presidente, pelo amor de Deus, interfira, fale com o (o presidente do BC, Henrique) Meirelles, não deixem os juros subirem”, afirmou o presidente.

Na época, o ruído político causou estragos à política monetária, como relata em texto acadêmico o ex-diretor de Política Econômica do BC Afonso Bevilaqua. O BC teve que seguir o processo de alta de juros até maio de 2005 porque o mercado acreditava que o Copom cederia a pressões. Embora internamente mantivesse o apoio ao BC, Lula não fez na época declarações públicas.

Com a mesma ênfase, o presidente falou sobre as questões de infra-estrutura. Garantiu que não deixará um apagão elétrico nas mãos de seu sucessor, mas deixou claro que não poderá evitar uma disparada nos preços da energia se as duas usinas no rio Madeira forem vetadas pelo Ibama. “Eu posso te dizer que o Brasil não terá apagão e que iremos fazer o que temos de fazer neste país para ter energia”, assegurou Lula. Mas, sem recorrer a um tom ameaçador, muniu-se de uma série de dados para explicar a competitividade das duas hidrelétricas.

Enquanto o valor de referência da energia hidráulica é de US$ 40 por megawatt-hora (MWh), o presidente apresentou didaticamente o preço das demais fontes energéticas: o MWh sai a US$ 48 no caso das térmicas a carvão (a fonte mais poluente), a US$ 54 para as térmicas a gás, a US$ 145 no caso das eólicas e até US$ 310 no caso das térmicas movidas a óleo diesel. Depois de enumerar todas as possibilidades, incluindo a nuclear, Lula foi direto: “Não há outra hipótese”. Ou seja: para evitar um apagão, a única saída possível será pagar mais caro.

Aproveitando a resposta sobre as usinas do Madeira, o presidente criticou a greve dos servidores do Ibama, que continuam parados, apesar da exigência da Justiça de presença mínima de 50% dos servidores. O motivo da paralisação é a MP 366/07, que reestrutura os órgãos ambientais, tira competências do Ibama e cria o Instituto Chico Mendes para cuidar das unidades de conservação. “As pessoas deveriam, pelo menos, permitir que as mudanças fossem introduzidas para saber se alguém vai ter prejuízo ou não”, afirmou.

Ainda referindo-se às recentes polêmicas envolvendo o setor elétrico e o fornecimento de gás importado, o presidente disse esperar o cumprimento dos contratos da Bolívia com o Brasil. Apesar de reconhecer a “necessidade histórica da Bolívia ter seu gás”, Lula afirmou que não ficará “cego” às atitudes do colega Evo Morales. Em seguida, qualificou o venezuelano Hugo Chávez como “parceiro extraordinário” do Brasil e disse que fará a defesa do etanol na cúpula do G-8, em junho.

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