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Presidente da ProCana Brasil analisa o setor sucroenergético

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Um apaixonado pela cana-de-açúcar. Essa talvez seja a definição mais apropriada para o empresário Josias Messias, presidente da ProCana Brasil, empresa que edita o JornalCana e outras publicações voltadas ao setor sucroenergético. O próprio setor o reconhece como seu defensor. Em 25 anos de trabalho no JornalCana, Josias viajou por cerca de 500 mil quilômetros pelo Brasil e no exterior. Nesta entrevista, ele fala desta trajetória e faz uma análise do passado, presente e futuro do agronegócio canavieiro.

JornalCana: Que paralelo é possível fazer entre a situação vivida há 25 anos com o atual momento do setor?

Josias Messias: O cenário é muito parecido. Quando entrei no setor, em 1988, ele já era uma importante atividade econômica, com as usinas e destilarias gerando muitos empregos e distribuindo renda. Após um período de euforia de investimentos por conta do Pro-álcool, o setor teve que enfrentar a dura realidade de prejuízos por conta da defasagem no preço do álcool pago ao produtor e da total falta de expectativas quanto ao futuro da atividade. Faltava uma política governamental clara. Por coincidência, não é a mesma situação na qual o setor encontra-se hoje?

Quais as principais mudanças que o senhor percebeu nesse período?

O setor cresceu muito em todos os aspectos, não apenas na produção, que era de aproximadamente 220 milhões de toneladas de cana. A maior evolução ocorreu na mentalidade dos produtores que, de ruralistas alçados à condição de industriais umbilicalmente ligados ao Governo, tornaram-se empresários de um mercado globalizado.

A forma de administrar também mudou muito. Hoje vemos um trabalho profissionalizado mesmo em empresas familiares, onde o fator determinante passou a ser a competência para a função e não os laços familiares. As famílias entenderam que a profissionalização não é uma tendência, mas questão de sobrevivência.

Os grupos mais rentáveis passaram por esse tipo de mudança. Evoluímos também na tecnologia, que permitiu um grande salto na produtividade.

Em linhas gerais, como era o setor na época?

Se compararmos com as facilidades de hoje, eu poderia dizer que o setor era arcaico, assim como o Brasil como um todo. Mas do ponto de vista social, o setor tinha muita importância. Isso porque ele fixava o homem no campo e remunerava com salários sempre acima da média dos praticados na área rural, além de oferecer trabalho o ano todo.

E quanto à produção?

Quando entramos no segmento não existiam dados disponíveis e confiáveis. Estes surgiram com a chegada do Anuário da Cana, em 1995. Na época, a estrutura de governo que administrava o segmento estava sendo desmantelada e não havia nenhum órgão que tomasse conta do setor. O IAA – Instituto do Açúcar e do Álcool, por exemplo, estava em sua fase final. Era comum enviarmos o jornal para destilarias e descobrir depois que foram desativadas ou nunca chegaram a produzir. Ao longo dos anos fomos corrigindo e apurando estas informações, de forma que o cadastro do JornalCana acabou tornando-se referência para o mercado.

E o mercado, como se comportou nesse período?

Esse sim mudou radicalmente. Na época, com exceção do mercado interno de açúcar, todo o restante era controlado pelo governo. Produzia-se e vendia-se o álcool nos volumes e preços que o governo determinava.

Hoje o governo continua a interferir no mercado de etanol, mas com a diferença de que isso é feito indiretamente, no caso, baixando o preço da gasolina. Sobre o açúcar, houve uma transição importante quando da liberalização das exportações mas, mesmo com as oscilações naturais da commodity, o Brasil contava quase sempre com um preço remunerador. Situação bem diferente da atual, em que a predominância do açúcar brasileiro no mercado faz com que as cotações internacionais reflitam cada fato ocorrido no Brasil, como mudança do dólar e aumento ou diminuição da produção.

Quais as principais crises vencidas nestes 25 anos?

Em minha opinião, as piores foram a de 1990, quando mais de 60 usinas fecharam as portas, e a de hoje. Vejo isso pelo percentual de empresas que estão sofrendo com a situação, sendo mais de quarenta fechadas e o mesmo número em recuperação judicial. Analiso quantos empregos são perdidos, além da redução das atividades em todos os elos desta importante cadeia.

Como nossa empresa atua somente no setor sucroenergético, ela pode ser usada como reflexo das dificuldades do mercado: desde 2008 apresenta prejuízos crescentes.

O que é preciso acontecer?

Que venha uma nova e definitiva regulamentação. Em qualquer parte do mundo, energia e combustíveis são fortemente regulamentados e com regras perenes. Aliás, depois do petróleo, o açúcar é a commodity mais regulamentada do mundo.

É preciso definir qual é o papel do etanol na matriz energética brasileira e garantir regras perenes de comercialização. Porque hoje aparentemente o setor estaria num mercado livre de etanol, mas na prática esbarra num limitador que não é decidido pelo próprio mercado, mas por uma canetada do governo, que é o preço da gasolina. Ou seja, a história recente revela que as usinas são livres para produzir e comercializar etanol apenas com prejuízo, porque todas as vezes que o preço médio do etanol se torna remunerador, o governo toma alguma medida para tirar a sua competitividade.

Por outro lado, percebo uma maturidade dos produtores que estão parando de “pagar para ver”, ou seja, insistir em investir e produzir algo que vai contra os planos do governo. O governo Dilma não está preocupado com a produção, apenas com a política e, com esse objetivo, o que importa é incentivar o consumo e baixar a inflação. Acreditar que vamos conseguir mudar o governo é uma utopia. A não ser que o setor use a única linguagem que o governo entende: política!

Sem a estabilidade oriunda das leis, tendo em vista os mecanismos que o governo dispõe para promover ou desestimular o mercado, não é possível trabalhar. O que é lamentável, pois o prejuízo é de toda a cadeia produtiva.

Falando de leis, como o senhor enxerga essa questão?

O grau de exigência na parte trabalhista e ambiental é grande. O setor é refém da interpretação de fiscais e promotores. Dependendo da maneira como interpretam determinada situação, uma usina pode ter seu trabalho classificado como ‘análogo à escravidão’. Não há uma clareza nas leis e nem nos procedimentos de aplicação. Com isso, além dos altos custos e das penalidades, há uma paralisação dos investimentos no setor. Nos últimos anos, mais de trinta projetos greenfields e mais de cinquenta centrais de bioeletricidade foram abortados.

Como o senhor vê a gestão da Presidente Dilma em relação ao setor?

Embora os últimos dois presidentes sejam do mesmo partido, a diferença entre eles é grande. Visivelmente o atual governo não se importa em usar a produção sucroenergética para combater a inflação. E não se importa de propagar que, nos preços atuais, o setor é competitivo e os empresários é que estão fazendo corpo mole.

Mas contra fatos não há argumentos. Os balanços das usinas mostram que as mais competitivas remuneram o suficiente apenas para manter a operação, mas não para pagar os investimentos. Essa é a dura realidade.

E para aquelas que não estão bem, os empresários não tem sequer a opção de vender, pois quem se arriscaria a investir em um mercado sem horizontes claros? Neste momento, mesmo com a oferta de ativos com valores depreciados, nem mesmo as tradings, petroleiras e grupos capitalizados estão consolidando.

É muita petulância dos burocratas de Brasília achar que estão certos e todo o mercado, incluindo os grupos multinacionais, está errado. Mas, as consequências dos equívocos do governo Dilma contra os setores produtivos já começam a aparecer e, quem sabe, ela desça do pedestal de Brasília e, ainda que seja apenas por política, ela volte seus olhos para a produção e geração de renda, elementos fundamentais de uma economia sustentável.

Quais os principais movimentos pró-setor criados ou apoiados pelo JC nestes 25 anos?

Pelo próprio distanciamento geográfico entre as unidades, as dificuldades de comunicação dentro do setor eram enormes. O segmento era desunido e desarticulado. Não possuía uma linguagem própria. O JornalCana surgiu abrangendo diversos assuntos, não apenas assuntos técnicos, como era comum na época. Lembro-me que uma das nossas primeiras capas surgiu com a cobertura da greve em Guariba, interior de São Paulo. Nosso objetivo era contribuir para que o segmento tivesse sua própria cara e voz, e com isso, das ideias surgissem caminhos. Durante alguns anos, por exemplo, enviamos exemplares para os deputados federais, em Brasília, e para as assembleias legislativas dos principais estados produtores.

Participamos ativamente das manifestações públicas em prol do setor, como a carreata dos canavieiros a Brasília em 1997 e o movimento de 1999. Sempre com o objetivo de mostrar o setor e sua importância. Esse é nosso papel, aliás: promover o setor e seus representantes.

O setor ainda não embarcou na esteira de protestos pelo país. Deveria?

Sim, e nós do JornalCana estamos tentando mobilizá-lo. Se o setor apoiar, vamos a Brasília reivindicar melhorias ou pelo menos o mesmo tratamento que é dado aos outros segmentos. Hoje vemos o governo anunciar ajuda a outros setores sem qualquer base de dados confiável, enquanto o setor canavieiro, que é uma área tangível, recebe ‘embrulhos’. É preciso que a Presidente Dilma e seu governo entendam que o setor não pode ser tratado de qualquer maneira. Se ele é um gigante deitado em berço esplêndido, temos que levantá-lo. Durante muito tempo temos engolido passivamente o que nos é receitado. Isto não pode continuar assim. Temos que nos movimentar. Não faz sentido toda a cadeia produtiva passar por dificuldades quando está trabalhando corretamente, investindo em tecnologia, produtividade e sustentabilidade. Algo está errado. Temos que nos levantar, sim!

Como o senhor imagina o setor daqui a 25 anos, em 2038?

Vejo 80% do segmento globalizado, com controle de capital internacional. Ainda que o controlador seja brasileiro, a fonte do capital será estrangeira. Acredito também que haverá uma verticalização da produção agrícola e diversificação da produção industrial. Acredito que haverá uma descentralização da distribuição, visando redução de custo e surgimento de oportunidades comerciais, como de nichos de mercados onde as usinas menores serão competitivas.

Vejo ainda um grande crescimento da automatização em todas as etapas do processo produtivo e de gestão. Com isso, muitas atividades serão gerenciadas por especialistas lotados nos centros urbanos, com um número reduzido de pessoas atuando no campo e na indústria. Esse é o caminho. Por fim, entendo que, mesmo com os diversos entraves, o Brasil continuará sendo o grande produtor mundial de cana-de-açúcar e de seus diversos derivados, dentre os quais o açúcar, o etanol e a bioeletricidade.

Qual seu sonho para o setor?

Gostaria que tudo isso aconteça de forma mais planejada, para que as pessoas ligadas ao setor aproveitassem melhor os resultados. Quando uma usina vai mal, não é só um empresário que vai mal, mas milhares de famílias e centenas de empresas que dependem daquela usina. Hoje, aparentemente está tudo bem com a economia brasileira, mas as empresas já não estão suportando todas as cargas. Quando a economia de fantasia começar a cair, quem sabe veremos reconhecida a importância de gerar renda e trabalho no interior do país.

O que o levou a se tornar um editor de um jornal voltado ao segmento canavieiro?

Nunca pensei em ser jornalista ou editor, foi algo natural e o setor sucroenergético realmente me cativou. É trabalhoso e desafiante, mas para quem gosta de desafios como eu, é apaixonante. É o vírus da cana que me mantém. Você acaba se apaixonando por toda a grandiosidade do setor, com suas simplicidades e complexidades. Para não se envolver com ele só sendo frio e calculista, o que, definitivamente, não sou.

Este setor é oscilante em tudo. Pode-se ganhar muito dinheiro em um ano, mas no outro ter que vender tudo para manter a empresa em atividade. Foi com este pensamento que, desde 2008, coloquei o patrimônio pessoal à disposição da empresa, o que tem permitido à ProCana superar esse ciclo de dificuldades e consolidar sua liderança.

Quais seus planos para o futuro?

A ProCana vai se globalizar, seja firmando alianças estratégicas com outras editoras, empresas de informações ou fusões e aquisições. É inevitável, vai acontecer. A Sinatub, empresa de cursos e treinamentos integrada ao grupo, tem muito potencial porque a evolução do setor cria uma demanda enorme por atualização e aperfeiçoamento técnico. Publicações como o JornalCana têm suas receitas afetadas pela falta de perspectivas e de investimentos. A Sinatub, não. Pessoas bem treinadas e conscientes geram um impacto imediato para as usinas e queremos crescer contribuindo dessa maneira com o setor.

O que é o JornalCana para o senhor?

Uma publicação por meio da qual contribuímos para o desenvolvimento humano, socioeconômico e tecnológico da humanidade. Isto mesmo, temos o orgulho de pensar que nosso trabalho deve contribuir para o desenvolvimento das pessoas, das empresas, do setor, do Brasil, e da sustentabilidade de toda a humanidade. Quem conhece e propaga as virtudes da cana-de-açúcar deve pensar assim!

Mas também vejo que somos apenas um canal. Quem faz o jornal, de fato, são as pessoas. São pessoas que geram notícias, que anunciam, que lêm, enfim. Sou grato e me sinto realizado em gerir esse grupo, líder no Brasil e em crescimento no mundo. É um privilégio, fruto de um relacionamento de 25 anos com as pessoas que fazem o setor e do trabalho da nossa equipe, que realmente veste a camisa.

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