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Poucas empresas negociam 50% das exportações

O poder de escala da indústria ajuda a alavancar a venda externa, mas também pode afetar a renda do produtor. Um mercado que, neste ano, deve chegar próximo a US$ 20,5 bilhões em exportações, está nas mãos de poucos. As cinco principais commodities do agronegócio brasileiro, que respondem por mais de 50% das vendas externas do setor, são comercializadas por um número pequeno de empresas. Para especialistas, o bom desempenho da balança comercial é fruto desta concentração, pois aumenta a escala e facilita as vendas. Mas, por outro lado, eles argumentam que a pequena quantidade de compradores das commodities deixa o produtor sem poder de barganha, diminuindo sua renda.

Uma tendência mundial no mercado de commodities, mas que não tem agradado os produtores. Para o presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Corte da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), é preciso que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) verifique a ação dos frigoríficos exportadores. Atualmente, as maiores empresas do setor respondem por 73% das vendas externas de carnes bovinas. Mas, para Nogueira, o problema não é o tamanho do mercado e, sim, a ação das indústrias que têm filiais em diversos estados e que, quando os preços estão altos, deixam de comprar em determinada praça e buscam a matéria-prima em outra. “O poder de pressão dos frigoríficos é muito grande em relação a quem só trabalha no mercado interno”, afirma.

Segundo o pesquisador Juarez Machado, do Instituto de Planejamento e Economia Agrícola de Santa Catarina (Cepa), há relação de forças entre as indústrias e os supermercados, que deixa o produtor no meio da briga, sem política de preços. No setor de frangos, as maiores empresas respondem por 60% das exportações e no de suínos, 52%. Ou seja, grande parte dos US$ 5,2 bilhões exportados pelo complexo carnes nos últimos 12 meses foi revertido para um número pequeno de indústrias. “Toda concentração não é boa, pois se há um problema com uma das indústrias, todo o País paga”, afirma Paulo Molinari, consultor da Safras & Mercado.

Concentração

O complexo soja, principal produto da pauta de exportações do agronegócio, tem 80% de suas vendas (US$ 10,2 bilhões nos últimos 12 meses) concentradas em quatro processadoras. “Fica fácil de o produtor ser manipulado”, afirma Getúlio Pernambuco, chefe do Departamento Econômico da CNA. Mas ele ressalta que não é um problema só do Brasil. A consultora Odinéia Santos, da Safras & Mercado, argumenta que o preço é formado na bolsa e que, por isso, a concentração não afetaria a renda do produtor.

Também está nas mãos de poucas empresas US$ 1,2 bilhões de vendas externas de suco de laranja. Segundo levantamento do Instituto de Economia Agrícola (IEA), as quatro maiores processadoras do setor respondem por 89,6% do mercado. “Não se trata de uma conduta conspiratória, pois se não fosse o poderio, as indústrias não conseguiriam exportar”, afirma Antônio Ambrósio Amaro, pesquisador do IEA. Para ele, é preciso que os produtores se organizem para conseguirem melhores condições.

Em outro importante produto da pauta de exportação, o café, segundo levantamento da economista Maria Benetti, da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (FEE), as quatro maiores empresas respondem por 75% do mercado interno. No entanto, nas exportações isso não ocorre. Levantamento do Conselho dos Exportadores do Café (Cecafé), mostra que as cinco maiores responderam por 38% das vendas externas. “O que ocorre é uma concentração por parte dos compradores externos”, afirma Guilherme Braga, diretor-geral do Cecafé. Com isso, segundo ele, o que ocorre é uma grande concorrência entre as empresas, sacrificando a margem de lucro.

Situação semelhante ocorre com o açúcar. Levantamento da Universidade Federal de Viçosa (UFV) mostra que mais de 90% da moagem do produto está nas mãos de quatro empresas, mas segundo o economista Antônio de Pádua Rodrigues, da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica), na venda externa há pulverização. Segundo ele, só ocorre concentração no álcool, que é um mercado incipiente.

Segundo produtores e alguns analistas, o que ocorre no agronegócio brasileiro é um oligopsônio, ou seja, há poucos compradores para um leque grande de produtores. “Para operar com commodities é preciso grande escala porque as margens são estreitas”, afirma o economista Mauro Rezende, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Segundo ele, a solução é o produtor se organizar em cooperativas e aumentar o volume para exportar.

Modelo

“É preciso mudar o modelo de negócio, se associar, vender grandes lotes, garantir qualidade e preço”, afirma. Para o professor Aziz Galvão da Silva Júnior, da UFV, a situação é complicada para o produtor, pois diminui suas opções de venda. Ele ressalta como diferencial no ganho de preço os agricultores estreitarem relações com as indústrias e se diferenciarem, usando, por exemplo, certificação e rastreabilidade.

“A concentração não é exclusiva do Brasil, é conseqüência natural quando se trabalha em um segmento que tem necessidade de escala de produção”, afirma o economista Glauco Carvalho da MB Associados. Ele ressalta que apesar do poder de barganha dos produtores ser menor, há a contrapartida que as multinacionais financiam a produção. O consultor André Pessôa, da Agroconsul, ressalta outra vantagem, como os investimentos que as multinacionais têm feito, principalmente na logística. “Se não tivessem essas grandes empresas em todo o País, o produtor teria de se organizar em cooperativa e conseguir um volume grande para exportar”, afirma.

Não só nos produtos exportados ocorre concentração. Segundo a economista Maria Benetti, há também poucas empresas respondendo pela produção de sementes, defensivos agrícolas e maquinário. Na última década houve aquisição de indústrias brasileiras por multinacionais, fazendo com que, por exemplo, 60% da produção de semente de milho esteja nas mãos de única empresa. E que esta mesma, se associe a outra de soja, que detém 65% do mercado. Além disso, quatro grupos transnacionais controlem 88% do mercado de agrotóxicos. “Houve uma desnacionalização do agronegócio”, afirma.

Maria Benetti diz que esta concentração ocorreu porque quando houve a abertura econômica, a empresas nacionais não estavam preparadas para a concorrência. Para ela, há um desequilíbrio no setor que é perigoso para a formação dos preços. “Qual a margem de negociação do produtor?”, questiona. Outro problema apontado por ela é o caso da Parmalat do Brasil, que adquiriu 25 laticínios e que, com a crise no final do ano passado, muitos produtores ficaram sem ter para quem entregar o produto.

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