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Pode-se minimizar as conseqüências dos apagões?

Cada vez que o sistema interligado sofre panes como a que ocorreu no dia 21 de janeiro fica patente a sua fragilidade, como foi reconhecido por todas as autoridades do setor elétrico nesta ocasião, por mais que os defensores da energia hidrelétrica pretendam apresentá-la como a melhor e (única??) opção para a geração de eletricidade no país.

Neste momento é importante lembrarmos que o Estado de São Paulo (e a região Sudeste) tem opções para geração de energia elétrica independentemente do sistema interligado e que, em situações de emergência como esta, certamente poderiam colaborar para amenizar as conseqüências da interrupção.

Analisemos (mais uma vez!) o caso da geração de excedentes do setor sucroalcooleiro. Como é do conhecimento de todos, as usinas da região Sudeste (principalmente São Paulo) são praticamente auto-suficientes em energia e com enormes possibilidades de geração de excedentes. Estas usinas não apenas podem colaborar para a complementação da oferta no sistema interligado, principalmente nas situações de crise como a que acabamos de atravessar mas, além disso, certamente poderiam minimizar as conseqüências da interrupção como a ocorrida, uma vez que sua geração é descentralizada, independente de linhas de transmissão e próxima aos pontos de carga. Esta situação é também conhecida por todos os especialistas em planejamento energético, vem sendo amplamente divulgada por todos, mas as políticas propostas ainda não foram implementadas, o que certamente teria colaborado para amenizar o caos que se instalou na tarde de ontem.

Em estudo recentíssimo que o CENBIO – Centro Nacional de Referência em Biomassa – acaba de realizar para a ANEEL e que será disponibilizado ao público em breve, verificou-se por exemplo que nas usinas da região Centro-Sul havia pouco mais de 100 MW sendo comercializados em 2001 (no período da safra), e previsão de mais 1.300 MW em projetos previstos pelas usinas, mas são ainda valores reduzidos (42%) quando comparados com o potencial de cerca de 3.000 MW tecnicamente viável para esta região.

Se políticas adequadas forem introduzidas, como tem sido exaustivamente proposto, estes 3.000 MW já poderiam estar disponíveis (como energia firme, o ano todo, inclusive neste período em que ocorreu o apagão).

O BNDES introduziu um programa para financiamento de empreendimentos no setor sucroalcooleiro em 2001, e uma análise superficial (e equivocada) pode levar à conclusão de que nada mais é necessário para a implementação da geração de energia a partir da biomassa no país.

Entretanto, deve ser observado que tal programa requer como garantia a ser dada, pelas usinas, para o financiamento, o contrato de longo prazo com a concessionária. Ora, estes contratos dificilmente se realizarão em larga escala, se não houver políticas adequadas, garantindo a compra de energia a preços que efetivamente viabilizem os investimentos, como vem sendo feito com as termelétricas a gás natural.

Foram políticas deste tipo que permitiram que programas semelhantes se desenvolvessem nos EUA e na Europa para energias renováveis.

Não se pretende aqui defender “subsídios para usineiros”, como freqüentemente é mencionado. Pretende-se, sim, defender a adoção de políticas transparentes que permitam o estabelecimento de uma matriz energética racional (além de ambientalmente correta).

Deve ser ressaltado que, por ocasião da crise sem precedentes na oferta de energia que o país atravessou em 2001, verificou-se mesmo um certo interesse, por parte dos setores encarregados do planejamento energético do país, na possibilidade de se incluir a geração de excedentes do setor sucroalcooleiro na oferta de energia. Entretanto, como já ocorrido em inúmeras outras situações anteriores, tão logo as chuvas tiveram início, este interesse desapareceu.

É necessário que, de uma vez por todas, seja efetuado um planejamento integrado de recursos para a oferta de energia, não apenas visando soluções provisórias e conjunturais para momentos de crise, mas principalmente em termos estruturais, para elaborarmos uma matriz energética limpa e segura, evitando (ou pelo menos minimizando) prejuízos como os que todos nós suportamos (mais uma vez) …

Pieguismo à parte, cabe a nós construirmos o país que pretendemos deixar para nossos filhos e netos. Mas esta idéia não parece tão nova assim….

Suani Teixeira Coelho, professora do Programa Interunidades de Pós Graduação em Energia da USP

e Coordenadora do CENBIO – Centro Nacional de Referência em Biomassa.

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