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Panorama elétrico menos seguro

Ao virar do avesso, rotineiramente, as percepções dos especialistas em energia elétrica brasileira, Mário Veiga, titular da consultoria PSR do Rio de Janeiro, mantém sua voz influente na formação da opinião desses agentes, como demonstrou no 23° Encontro de Negócios Duke Energy do Brasil, recém-realizado em São Paulo. Veiga e seus parceiros na PSR, Mário Rosenblat em particular, continuam defendendo as principais assertivas no universo da energia do País.

A primeira delas é que a energia hidroelétrica deverá continuar a âncora da expansão da oferta, mas a tendência é a da utilização de usinas de baixa queda e a fio d´água. Portanto, a PSR não inclui ainda a possibilidade de a sociedade brasileira rediscutir a adoção, de novo, de grandes reservatórios de acumulação de água (com benefícios em saneamento, regularização, pesca, turismo, transporte, abastecimento de água e outros).

A segunda assertiva é que a biomassa e a eólica são competitivas e se transformaram em opções mainstream, em complementaridade com as hidrelétricas. A razão é que venta quando não chove e se colhe cana na estiagem. Vale dizer, as renováveis geram e preservam águas nos lagos nos momentos mais difíceis de seca. Vê-se que a PSR não considera ainda as agruras do setor sucroalcooleiro e o estrangulamento logístico sobre as eólicas.

Nem destaca a substituição latente da queima da cana pelo emprego de enzimas na obtenção do etanol. A consultoria acredita na suficiente disponibilidade de lagos, e, com razão, menciona potenciais alterações a partir das mudanças climáticas.

Com pertinência, a PSR alerta para os ganhos de competitividade da energia solar e da maremotricidade. De fato, a solar já é mais barata do que os quase R$ 500 por megawatt-hora (MWh) (devidos a encargos e impostos) que se pagam num domicílio no Brasil. Numa geração distribuída , casa a casa, e emprego de redes inteligentes, rapidamente a energia solar voltaica fará sentido se nada mudar.

Surpreendentemente, Veiga reeducou os ouvintes ao afirmar que a geração termoelétrica é um componente importante na expansão econômica do sistema de geração. Ela contribui com o atributo da confiabilidade e a hidroelétrica devolve com a redução do despacho das térmicas, nos períodos de afluência de águas mais favorável.

Neste ponto, Veiga mostrou-se um ás ao assinalar que a despachabilidade (injeção no sistema, liga e desliga) das térmicas passa a ser cada vez mais importante, com o aumento da participação de geração não despachável dos parques eólicos, biomassa, usinas a fio d´água (rio Madeira, Belo Monte etc.). Afinal, qual será o back up de um aerogerador?

A sinergia hidrotérmica, advoga a PSR, faz com que a emissão de CO2 (gás de efeito estufa) de todo o setor elétrico brasileiro seja bem menor do que se imagina (sic). Veiga afirma que uma térmic a a carvão no País (com fator de despacho de 45%) emite menos do que uma térmica a ciclo combinado a gás natural em outros países (observe-se que térmicas a gás são concebidas para atuar na base do sistema, sem os excessivos, mas pragmáticos, liga-desliga). Convém explicar que uma térmica operando entre 10% e 15% das 8.760 horas de um ano fundamentará fortemente a recontagem adoçante da PSR.

De resto, vários sinais detectados pela PSR, no primeiro trimestre de 2011, não se reverteram, mesmo tendo sofrido alterações em sua intensidade. Senão vejamos: A) não deve faltar energia elétrica no Brasil a médio prazo, mas esta certeza se reduziu a esta altura do calendário; e, B) o preço final da energia no Brasil deve subir ainda mais do que se supunha no início deste ano. O Congresso Nacional elevou a vida e a intensidade da Conta de Combustíveis (CCC), da RGR e criou o Encargo da Energia de Reserva.

A PSR é precisa no que concerne ao balanço do mercado, pois há que consid erar, na expansão da oferta, o atraso na posta em marcha das usinas termoelétricas a óleo; ajustes nos cronogramas do rio Madeira; e, limites na exportação (transporte de energia) na Região Nordeste, até 2013.

Na inevitável alta dos preços finais da energia, as assertivas, entre tantas, recobrem: os reajustes regulatórios das distribuidoras; os leilões de energia nova já realizados; e, os custos dos contratos por disponibilidade.

Para uma tarifa média (2011) de cerca de R$ 125 por megawatt-hora, a PSR antevê uma nova de R$ 145 por megawatt-hora, em 2014. Naturalmente são valores antes dos tributos e dos encargos que se aproximam de 50% do preço final para o consumidor.

O pior está embutido na explosão dos tributos e dos encargos. Somente a CCC deve saltar velozmente de R$ 2,2 para R$ 4,2 bilhões anuais. O Encargo de Serviços de Sistemas (ESS) não para de se apresentar na fatura dos consumidores, mesmo com boas afluências de chuvas, devido à segurança (térmica) de linhas como as de Itaipu e Acre-Rondônia.

Por fim, mas não por último, a PSR – além da imprevisibilidade do clima- sempre lembra que a renovação ou licitação dos atuais contratos de concessão são assuntos que demandam decisões inadiáveis, seja para os investidores, seja para os consumidores.

Paulo Ludmeré jornalista, engenheiro, consultor

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