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Onda do etanol começa a arrefecer nos Estados Unidos

Por anos, o maior empregador de Walhalla, cidade americana de mil habitantes na Dakota do Norte, perto da fronteira com o Canadá, foi uma usina de etanol na estrada County Road 9, que produzia o combustível a partir do milho para atender à demanda decorrente da exigência federal de adicionar o produto à gasolina.

Em abril passado, a dona da usina, a Archer Daniels Midland Co. (ADM), fechou suas instalações e atribui a decisão aos baixos retornos obtidos. Os 61 funcionários perderam seus empregos e Walhalla ficou sem a sua maior fonte de arrecadação tributária.

“Empregos como esse são difíceis de surgir”, diz Chris Jackson, de 32 anos, prefeito de Walhalla e dono do principal bar da cidade. Os negócios minguaram tanto no Jackson’s Bar como nos dois hotéis de estrada da cidade – e nos postos de gasolina, já que o tráfego de caminhões para a usina desapareceu. Segundo o prefeito, alguns moradores planejam deixar a cidade. Uma companhia local de rações estuda comprar a usina, mas, basicamente, para ter acesso a um subproduto da produção de etanol usado na alimentação de gado.

A onda de ascensão do etanol nos Estados Unidos começa a arrefecer e os reflexos desse movimento deverão se disseminar pelo “cinturão agrícola” que cresceu acostumado a uma expansão meteórica. A produção anual do biocombustível americano mais do que triplicou entre 2005 e 2011 e foi responsável por empurrar os preços para cima e despejar dinheiro em comunidades rurais em boa parte do país, de Nebraska até a Dakota do Norte.

Agora, a demanda por etanol está chegando ao seu ápice. O volume necessário para ser misturado à gasolina está próximo ao exigido pelo governo federal e o consumo de gasolina está em queda. Após 15 anos seguidos de crescimento, a produção de etanol neste ano terá ligeira queda e ficará praticamente estagnada em 2013, conforme projeções de maio da Agência de Informações sobre Energia dos EUA (EIA).

O segmento de etanol se expandiu com base na expectativa de que o consumo de gasolina permaneceria em ascensão e que a parte do etanol mesclado à gasolina também continuaria em alta. Em vez disso, projeta-se queda de 6,7% na demanda por gasolina nos EUA neste ano em comparação ao pico verificado em 2007, e os esforços para aumentar a mistura de etanol vêm sendo contestados.

As usinas americanas agora se deparam com uma situação de excesso de capacidade. Elas produzem menos de 14 bilhões de galões (52,99 bilhões de litros) e dispõem de capacidade para produzir 14,7 bilhões de galões, segundo a Associação de Combustíveis Renováveis (RFA), entidade de produtores de etanol.

“Muitas pessoas estão repensando suas suposições sobre a indústria de etanol e o potencial dela”, disse o economista Jason Henderson, da unidade regional do Federal Reserve (Fed) em Kansas City. Enquanto isso, o setor agrícola como um todo continua como um ponto relativamente positivo na economia dos EUA. Os preços de algumas commodities importantes caíram em relação às máximas históricas atingidas nos últimos anos, mas as terras continuam valorizadas e o desemprego em grandes Estados agrícolas, em geral, está abaixo da média do país.

A desaceleração do segmento de etanol vem sendo surpreendente, especialmente nos limites da região do “cinturão do milho”. Mais de 20 funcionários de uma usina em Sutherland, Nebraska, estão de licença depois que as instalações foram desativadas, em fevereiro. Os moradores de Levelland, Texas, que apostaram em uma usina na cidade viram o investimento evaporar: a empresa entrou com pedido de recuperação judicial em 2011 e foi vendida por US$ 9,2 milhões em maio, uma fração do custo de sua construção há quatro anos. “Foi-se uma boa parte do dinheiro da comunidade”, afirmou Richard Levy, advogado que representa os proprietários da usina no caso de recuperação judicial.

A ICM Inc., empresa de engenharia de Colwich, Kansas, que ajudou a projetar e construir cerca de cem usinas de etanol de milho nos EUA, reduziu seu quadro de 750 para 325 funcionários desde 2008, segundo o executivo-chefe Dave Vander Griend. A maior parte de suas operações agora está na América do Sul e na Europa.

A onda de expansão do etanol começou na segunda metade da década passada, alimentada pela necessidade de substituir um aditivo da gasolina – éter metil terc-butílico, usado para reduzir a poluição do ar mas que acabou contaminando águas subterrâneas – e pela exigência do governo federal de uma maior porcentagem de etanol na mistura à gasolina. A produção anual do biocombustível subiu de 3,8 bilhões de galões, em 2005, para 13,95 bilhões em 2011, segundo a EIA. O segmento emprega diretamente mais de 90 mil pessoas, conforme a RFA.

Os produtores de etanol passaram por momentos difíceis em 2008, quando o aumento nos preços do milho e a queda nos de gasolina e etanol espremeram os lucros. Algumas usinas foram fechadas e a construção de outras perdeu força. A produção, porém, seguiu crescendo.

Duas regras federais regem o uso de etanol nos EUA. Uma, criada em 2007, requer uma produção total de 15 bilhões de galões por ano até 2015, o que representa cerca de 9% mais do que o patamar atual. Ela foi baseada em projeções de que o consumo do combustível continuaria em ascensão. Mas a meta está em conflito com uma regra mais antiga, que até pouco tempo atrás limitava a mistura do etanol à gasolina a 10%. Esse limite, que está em vigor há mais de 30 anos e guiou a construção de postos e a fabricação da maioria dos carros, já foi praticamente atingido: o etanol deverá representar 9,7% da oferta de gasolina nos EUA neste ano, em comparação a menos de 5% em 2007.

A Agência de Proteção Ambiental (EPA), conseguiu aumentar há um ano e meio, com várias medidas, esse limite para 15% com uma gasolina conhecida como E15. A indústria de etanol deposita suas esperanças em uma rápida adoção da E15. “Estamos colocando muita fé na E15”, disse Walter Wendland, executivo-chefe de duas usinas de etanol de Iowa.

A adoção da E15 em grande escala, porém, enfrenta obstáculos significativos. O combustível não é vendido atualmente em nenhum posto, já que haveria necessidade de trocar as bombas de gasolina e avisar os consumidores. As indústrias automotiva e petrolífera expressaram preocupações sobre a E15 ao sustentar que o produto pode danificar carros e, assim, prejudicar os clientes.

Paralelamente, o outrora forte apoio político do segmento de etanol enfraqueceu com a alta dos preços do milho e os esforços para reduzir os gastos governamentais. Em 2011, o Congresso americano eliminou cerca de US$ 6 bilhões em subsídios anuais e há críticos pressionando por cortes na exigência de produção de 15 bilhões de galões por ano.

Mudanças no cenário político e outros fatores poderiam melhorar as perspectivas. Uma delas seria a queda dos preços do milho, que melhoraria a rentabilidade dos produtores de etanol, que tentam se equilibrar entre os altos preços do grão e os baixos valores do combustível.

Em Walhalla, ainda há esperança de que os funcionários possam voltar à usina, mas não porque haja otimismo com o etanol. A SweetPro Feeds negocia a compra da usina com a ADM e autoridades estaduais, de acordo com o presidente da empresa de rações, Bob Thornberg. A ADM não quis comentar o assunto.

Caso o negócio avance, a usina voltaria a produzir etanol, mas principalmente porque a SweetPro tem interesse no valor do subproduto a ser usado como ração. O etanol “chegou ao seu limite neste momento”, diz Thornberg. (Tradução de Sabino Ahumada)

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