JornalCana

O etanol é deles

Nos últimos três anos, o etanol produzido a partir da cana-de-açúcar vem, aos poucos, deixando de ser verde-amarelo. Antes mesmo de se tornar uma commodity de escala mundial, as decisões de investimentos na produção desse combustível passaram a ser ditadas por executivos e empresários que falam outras línguas que não o português. É que grandes companhias estrangeiras internacionais estão investindo nessa área no Brasil. É o caso da holandesa Shell, que se associou à líder Cosan, em 2010, e criou a Raízen. Esse seleto clube inclui ainda as francesas Louis Dreyfus e Tereos, além do grupo de origem argentina Bunge e da indiana Shree Renuka Sugars. Todas elas desembarcaram recentemente no País ou intensificaram suas apostas por aqui. O avanço foi facilitado pela delicada situação financeira na qual se encontrava boa parte dos usineiros. Estima-se que, desde 2008, as potências estrangeiras tenham investido mais de R$ 15 bilhões em aquisições no Brasil.

O mais recente movimento nesse sentido está sendo feito pela gigante britânica BP, outrora conhecida como British Petroleum e cuja receita anual atinge US$ 270 bilhões. A companhia deverá desembolsar R$ 1,2 bilhão para ocupar um lugar de destaque entre as 20 maiores fabricantes de etanol do Brasil. “O País é um dos mercados mais importantes para a divisão de energias alternativas da BP”, afirma Mário Lindenhayn, presidente da BP Biocombustíveis Brasil. Nos últimos meses, o executivo esteve envolvido em transações como a compra da Usina Tropical, de Goiás, da qual já detinha 50%. O mesmo foi feito no caso das duas usinas da Companhia Nacional de Açúcar e Álcool (CNAA), situadas em Minas Gerais. Com tacadas como essas, a petroleira aumentou seu potencial de moagem de 2,5 milhões de toneladas de cana para 7,5 milhões de toneladas, o que a colocou entre as 20 maiores empresas do setor.

A receita projetada para este ano é de R$ 550 milhões, valor ainda tímido em um segmento que movimenta perto de R$ 50 bilhões por ano. Para fortalecer sua musculatura, a direção da BP tem planos de construir mais três unidades até 2016, uma delas em Goiás e as outras duas em Minas Gerais. Com isso, espera atingir o patamar de 30 milhões de toneladas em cinco anos. Com a expansão pretendida no Brasil, a produção de `etanol equivalente´ da BP, que leva em conta apenas a conversão da cana disponível em combustível, saltaria cinco vezes, dos atuais 550 milhões de litros para 2,7 bilhões de litros. Trata-se de uma parcela ainda pequena perto dos 25 bilhões de litros de etanol que o Brasil deve produzir na safra 2010/2011, de acordo com dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica).

O avanço da BP no etanol está baseado em estudos realizados pelo seu departamento técnico, que vislumbra um futuro promissor para os biocombustíveis, mundialmente. A produção deverá mais que dobrar até 2030, atingindo 380 bilhões de litros. Ao mirar o Brasil, que abriga o maior programa de biocombustíveis do planeta, ela assegura um lugar de destaque neste novo cenário. E, de quebra, espera mitigar os efeitos negativos em sua imagem, causados pela explosão da plataforma Deepwater Horizon, ocorrida em abril do ano passado no Golfo do México. O acidente deixou como saldo o derramamento de quatro milhões de barris de petróleo, o encolhimento de US$ 25 bilhões em seu valor de mercado e um grande estrago na imagem da corporação. “Além de diversificar o portfólio, a aposta no etanol pode ser uma estratégia para que os consumidores passem a vincular o nome BP às energias limpas e renováveis”, diz Márcio Perin, analista da consultoria Informa Economics FNP em relatório publicado recentemente.

Lindenhayn, da BP, afirma que não é bem assim. “A iniciativa em apostar nos biocombustíveis começou em 2006, quando foi criada a divisão de energias alternativas, que também prospecta negócios nas modalidades solar e eólica.” O Brasil também possui outra vantagem competitiva para quem está de olho nos biocombustíveis, segundo o economista Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro. “As companhias estrangeiras estão elegendo o etanol de cana como foco de investimentos, porque ele ainda é o mais competitivo.” Enquanto se extraem 3,2 mil litros de etanol de milho por hectare, o rendimento do etanol de cana é de 6,5 mil litros por hectare. Nastari afirma que é possível chegar a 9,7 mil litros por hectare em pouco tempo, considerando a utilização de tecnologias existentes. A aposta na produtividade faz parte da estratégia da corporação britânica. Uma boa amostra disso foi a destinação de US$ 2 bilhões para o segmento de pesquisas na área de energias renováveis.

O trabalho é conduzido no Brasil e em San Diego, nos Estados Unidos, por uma equipe de 200 cientistas. Além dos estudos em andamento em seus próprios laboratórios, a BP está desenvolvendo, em parceria com a americana DuPont, um álcool chamado butanol, a partir de outras matérias-primas renováveis. Antes mesmo de definir o volume de investimento a ser aplicado nas três novas usinas que construíra até 2016, a BP já garantiu uma verba de R$ 170 milhões com a matriz. Os recursos serão usados na modernização e ampliação das atuais usinas. Trata-se de um movimento que vem se repetindo na maioria das empresas do setor. Por conta disso, não é esperada, no curto prazo, a construção de novas usinas, a exemplo do que ocorreu entre 2005 e 2010. No período, foram erguidas na região Centro-Sul nada menos que 112 usinas na região, que consumiram investimentos da ordem de R$ 50 bilhões.

Inscreva-se e receba notificações de novas notícias!

você pode gostar também
Visit Us On FacebookVisit Us On YoutubeVisit Us On LinkedinVisit Us On Instagram