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O caminho do etanol brasileiro

O governo brasileiro insiste em afirmar em seus encontros internacionais que o etanol brasileiro é de alta eficiência econômica e energética. Porém, qual a razão que justifica a forte contestação que sofre durante as negociações internacionais? Qual a estratégia a ser adotada para demonstrar ao mercado que se trata de um produto que consegue evitar os danos sócioambientais dos quais vem sendo acusado, e alcançar a esperada inserção no mercado internacional?

As palavras proferidas pelo atual Secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Francisco Graziano Neto, esclarece em parte a questão ao enfatizar que o grande defeito da economia sucroalcooeira reside na concentração do poder, onde poucas famílias dominam a fortuna dela extraída, e que bom seria se o álcool combustível, que agora ganha o mundo, contribuísse para reduzir a desigualdade social, teríamos o “Etanol verde e justo”, concluindo que a concentração d! a terra e do capital na agroindústria canavieira traz conseqüências sociais preocupantes, mesmo que as piores práticas ambientais e de exploração do trabalho manual venham a ser suprimidas.

Outro alerta foi feito pelo professor do departamento de economia da FEA/USP, Ricardo Abramovay ao se referir às importantes conseqüências para o estudo do direito de propriedade em que se baseia a expansão do etanol, pois os grandes investimentos em agroenergia no Brasil fazem com que a natureza patrimonial do capitalismo agrário brasileiro fique enfraquecida em beneficio de uma estrutura de capital que tende a adquirir os traços que predominam em outros setores econômicos. Ou seja, as empresas agropecuárias abrem seu capital e a presença de investimentos estrangeiros altera a fisionomia de um setor em que eles estavam quase ausentes. Grandes empresas e fundos de investimento passam a participar do capital das usinas de produção de açúcar e álcool, e grande parte da produção de etanol já ! está sob controle de capital estrangeiro. Ainda como resultado são as superfícies agropecuárias de operação das usinas que não param de se concentrar nos últimos anos. À exemplo de uma área média das usinas em São Paulo, em que no estrato de área superior a 30 mil hectares a média dos estabelecimentos é de 38 mil hectares, com vários deles ocupando áreas entre 40 a 50 mil hectares.

A verdade é que os biocombustiveis estão entre os setores mais atrativos para novos investimentos na economia brasileira, e a expectativa do setor é de aumentar a produção de cana de açúcar em porcentagens significantes que ultrapassam a casa dos 70%, segundo dados da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo. A cana de açúcar é um produto perecível que precisa ser processado imediatamente após a colheita, e unindo este detalhe técnico à estrutura latifundiária predominante no país, temos a explicação para que grande parte da produção venha de unidades agropecuárias pertencentes às próprias usi! nas, e apenas a menor parte venha de fornecedores independentes. Isso, sem contar, que essa pouca independência de alguns fornecedores pode ser apenas formal, pois na prática o que ocorre é que a usina arrenda suas terras, incorpora-as a seus domínios e responde por toda a operação produtiva.

Podemos registrar como marca básica na formação dos direitos de propriedade dos quais se organiza e desenvolve a produção brasileira de etanol as características da internacionalização, concentração fundiária e restrição crescente no acesso aos meios de produção

Muito embora seja um setor agroindustrial que tem hoje a maior capacidade de atração de investimentos, o futuro do etanol brasileiro depende ainda de atuações importantes. Uma delas é a sua própria capacidade de inovação, comparada com a velocidade de implantação de alternativas energéticas como o etanol celulósico, ou mesmo a utilização de hidrogênio ou de eletricidade no transporte individual e coletivo. O outro é que a evolução dos mercados de biocombustíveis é fortemente determinada pelas pressões sociais que obrigam o setor a apresentar de maneira cada vez mais detalhada as bases técnicas e sociais em que apóia a sua expansão.

Para que o álcool se transforme em uma commodity internacionalmente reconhecida, alguns obstáculos terão que ser superados. O primeiro é que outros países, além do Brasil, tenham relevância na oferta do álcool, e este é um desafio nada fácil, pois supõe uma organização empresarial e estruturas sociais onde outros países emergentes estão muito distantes. Uma concentração fundiária como a existente no Brasil para expandir uma produção competitiva ofusca as vantagens energéticas e econômicas do produto, devido aos seus efeitos sociais negativos. Outro desafio é demonstrar que a produção do etanol se apóia em formas não predatórias de ocupação de espaço e modalidades não degradantes de trabalho. O processo de certificação é um caminho importante para reduzir a d! istancia que hoje existe entre a sua eficiência econômica e energética e as condições sociais e ambientais, em certa medida, precárias. A participação social neste processo de certificação é um elemento que enriquece o mercado de biocombustível, tornando-o mais transparente, reduzindo seus efeitos negativos e aumentando a própria segurança dos investidores.

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