Os efeitos da queda na demanda de combustíveis já começaram aparecer e preocupam o setor sucroenergético. Ontem (30), o mercado foi surpreendido com a informação que a Raízen e a BR Distribuidora, as principais vendedoras de combustível do País, declararam força maior nas compras de etanol das usinas de cana-de-açúcar. Ou seja, os fornecedores foram informados, que diante da situação causada pela paralisação, as empresas podem deixar de pagar e receber o produto.
Em nota enviada ao JornalCana, a Raízen confirmou que, em razão da queda na demanda por combustíveis verificada por conta das medidas de lockdown para combate à pandemia de coronavirus, a empresa começou a sinalizar aos seus fornecedores de etanol a necessidade de revisão dos volumes originalmente programados.
“Embora ainda não estejam claros, neste momento, todos os impactos que esta crise trará para as nossas operações, estamos focados em fortalecer nossas parcerias estratégicas com fornecedores de etanol. Neste sentido, optamos, como outras empresas do setor, por dar a notícia sobre o evento de força maior em curso o quanto antes possível, de maneira a permitir que os fornecedores possam planejar suas operações com base nisso. Esperamos superar juntos esta fase, e estar preparados para a retomada, respeitando a relação sólida construída ao longo dos anos”, informa a nota.
Consequências devastadoras
Para Renato Cunha, presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e Álcool de Pernambuco (Sindaçúcar-PE) e presidente executivo da Associação de Açúcar, Etanol e Bioenergia ( NOVABIO), a alegação de força maior pode trazer consequências devastadoras ao setor sucroenergético. “Eu diria que é uma atitude impensada de algumas distribuidoras. É preciso rever seus fluxos de caixa, rever suas disponibilidades para que continuem honrando os seus contratos, até porque eles também devem ser compradores de diesel e gasolina, junto à Petrobras e, provavelmente, não estão tendo essa atitude da mesma forma como estão aplicando no nosso setor”, pontuou.
Cunha ressaltou que distribuidoras e usinas precisam estar juntas nesse momento difícil e enfrentar a falta de demanda imposta pela baixa de preços do petróleo e pelo problema de saúde que vive o mundo. “Entendemos que a Agência Nacional do Petróleo precisa agir de forma regulatória e de forma que traga o equilíbrio ao setor”, disse.
Neste contexto, a NOVABIO, que representa mais de 40 produtores integrantes do segmento no Brasil, enviou uma carta ao diretor geral da ANP, José Gutman, solicitando que a agência interceda nesta questão, “no intuito de coibir esses excessos que levarão a mais desempregos no setor da indústria da cana-de-açúcar”.
Para o presidente do Sindaçúcar-PE, as distribuidoras precisam rever a atitude, pois não condiz com o equilíbrio de fornecimento do mercado. “Esperamos que essa revisão tenha um senso de urgência. Estamos no início da safra no Centro-Sul e encerramos a temporada no Nordeste faltando ainda mais de dois meses para término de contratos. Tentar impingir ao setor uma força maior é uma atitude extrema que pode levar a consequências nefastas, tanto mercadológicas quanto pelo ponto de vista legal”, elucidou.
O executivo lembrou que os produtores vivem ainda dificuldades de liquidez, sem apoio dos bancos, que não estão financiando a atividade e quando o fazem, cobram encargos bem superiores à SELIC. “Inclusive há projetos de Emenda Constitucional tramitando na Câmara que permitirá ao Banco Central comprar crédito e os títulos dos próprios empreendedores do País. Isso encerraria este ciclo vicioso no sistema financeiro, onde há um relaxamento das taxas do compulsório e os bancos continuam sem emprestar”, concluiu.