Do açúcar e etanol, passando para energia, E2G, biometano, entre outros produtos, transformou as usinas de cana-de-açúcar em parques de bioenergia, que terão um papel preponderante na chamada economia verde.
“A nossa produção de etanol está na casa de 27 bilhões de litros atuais e temos projeções que indicam que ocorrerá o crescimento de cerca de mais 23 bilhões de litros até 2028. Toda essa pujança desse setor tem que ser acompanhada de avanços, tanto sociais como ambientais, e a sustentabilidade é um caminho a ser trilhado dia a dia, galgando patamares e dobrando metas cada vez mais elevadas” afirmou Raffaella Rossetto, pesquisadora científica da Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio (APTA) que atuou como mediadora no painel “Balanço de carbono no setor sucroenergético”, da 4ª Esalqshow, realizada no período de 5 a 7 de outubro, em Piracicaba – SP.
LEIA MAIS > Brasil deverá processar 621 milhões de toneladas de cana na safra atual
Maurício Roberto Cherubin, docente do Departamento de Ciência do Solo da Esalq/USP falou sobre os impactos de uso e manejo do carbono do solo. Segundo ele, a expansão de cana que houve nas últimas décadas, foi em cima de área de pastagem.
“E quando se faz uns cálculos para entender quanto tempo o cultivo de cana demoraria para restabelecer o carbono que estava na pastagem no solo, verificou- se que, em torno de 2 a 3 anos, já se tem o pagamento desse carbono perdido no processo de revolvimento do solo, de implantação da cultura. Isso é um tempo relativamente curto. Então nós temos algo bem interessante a nosso favor”, explicou.
Cherubin comentou ainda que estudo recente do Laboratório Nacional de Bio Renováveis demonstra que existe um potencial de área para produção de cana na faixa de 30 milhões de hectares. “Hoje o setor ocupa 10 milhões. Desses 30 milhões de hectares adequados ao cultivo de cana, cerca de 20 milhões estão em áreas de pastagem, ou seja, nós temos o dobro da área atual ainda de oportunidades de avanço, um cenário bastante positivo para o balanço de carbono”, afirmou.
LEIA MAIS > Novas variedades de cana atraem interesse dos produtores
Com relação ao manejo efetuado no campo ele preconiza uma atuação nos dois lados da equação do balanço do carbono. “Tanto na parte de remover o carbono da atmosfera e sequestrar no solo, quanto na parte de reduzir as emissões de gases. As práticas de manejo ora podem atuar de um lado, ora podem atuar do outro ou podem atuar nas duas, nos dois termos da equação ao mesmo tempo”, disse.
Cherubin destaca também a importância de estabelecer as métricas dessas emissões no campo. “Temos uma variação enorme de solo, de clima nessa região produtora, de sistemas de manejo dentro das diferentes usinas e nós temos que medir. Não tem jeito, nós ainda temos que ir lá no campo e medir, para ter uma linha de base para conhecer o estado atual de carbono com uma certeza maior ou uma menor incerteza. A partir daí, podemos pensar em ferramentas, pensar em RenovaCalc, pensar em outras estratégias de modelagem para predizer quanto o setor pode contribuir nessa temática nos próximos anos”, disse.
Para Heitor Cantarella, chefe do Centro de Solos e Recursos Ambientais do IAC, mesmo diante de alguns gargalos a serem superados, no caso o etanol de cana-de-açúcar usando o RenovaBio como métrica, vai muito bem.
LEIA MAIS > Usinas de cana-de-açúcar podem entrar no metaverso
“Entre esses gargalos está a utilização dos fertilizantes nitrogenados, que respondem por 30 a 50% das emissões totais (preparo de solo, herbicida, máquinas colheita, transporte, somando as emissões em todas as fases do ciclo de vida). Outro fator importante é o óleo diesel usado nas máquinas. Então quando a gente fala em melhorar a sustentabilidade do etanol nós temos que pensar nesses dois elementos dessas duas fases”, disse.
Cantarella citou, no entanto, que a chegada de fertilizantes produzidos e do biometano podem mudar esse quadro.
“Daqui algum tempo nós vamos ter fertilizantes hidrogenados com baixíssima pegada de carbono e aqueles 30/50% vão cair bastante e nós vamos tornar o nosso etanol ainda mais sustentável, com uma nova fonte de fertilizante. Além disso, aqui no Brasil a gente tem um potencial para produzir biometano no setor sucroenergético”, afirmou.
LEIA MAIS > Alta na produção de milho sustenta crescimento do mercado de etanol
Ele citou um levantamento recente que mostra que o potencial só do Estado de São Paulo é de 4 a 6 bilhões de metros cúbicos de biometano por ano, o que possibilita o funcionamento de fábricas de fertilizantes e de várias indústrias.
“O potencial para descarbonização com o biometano no setor sucroenergético é enorme. Porque se o setor passa a usar o biometano em máquinas e tratores, vai reduzir o consumo de óleo diesel. O biometano pode ainda ser utilizado para várias outras finalidades”, argumentou Cantarella, argumentando também que isso pode gerar mais CBIOs.
LEIA MAIS > Combate ao Sphenophorus levis requer ações integradas no manejo
O consultor para Novas Tecnologias e Processos Industriais da Raízen, Antonio Alberto Stuchi, destacou a produção de etanol de segunda geração e do biogás.
“Cerca de 55% do potencial de produção de biogás do setor a gente pode usar para consumo próprio, sendo 40% na substituição do diesel no transporte e 15% na substituição do nitrogênio com a utilização da amônia. Então nós estamos abrindo uma frente muito grande para a sustentabilidade do negócio. Podemos ter no mínimo 50% de redução em nossa emissão de carbono por tonelada de etanol por m3. E quando partimos para o etanol de segunda geração essa redução é de 75%”, explicou.
LEIA MAIS > Conferência Internacional DATAGRO sobre Açúcar e Etanol destaca “A Próxima Revolução da Bioenergia”
Stuchi mencionou ainda a utilização do etanol no processo de eletrificação dos veículos pesados e na aviação. “Não tenho medo nenhum do quanto ao futuro do etanol. Já temos dois processos bem adiantados na transformação de etanol em combustível para aviação, um setor que tem uma demanda urgente de redução de emissões e não tem muita opção, a não ser o etanol”.
Para Stuchi um dos grandes desafios do setor é não ser um simples vendedor de commodities. “O desafio é não ser um simples, outra vez, vendedor de commodities. Vender etanol. Nós temos que trabalhar para agregar valor nesse negócio e ser um vendedor de jet fuel competitivo”, disse.
(Fotos: Divulgação EsalqShow – 4ª edição Crédito: Denise Guimarães/ Esalq USP)