Pioneiro do plantio direto na palha no Brasil, o agricultor Herbert Arnold Bartz, com propriedade em Rolândia, no norte do Paraná, morreu nesta sexta-feira, aos 83 anos, de complicações de pneumonia. A implantação do sistema menos agressivo com o solo concretizou o sonho de Bartz de produzir alimentos em abundância e qualidade, após enfrentar a fome na Europa durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45).
“É mais uma das mortes que vamos lamentar para sempre por se tratar de uma pessoa afável, um ser humano fantástico”, disse o secretário da Agricultura e do Abastecimento do Paraná, Norberto Ortigara. “A contribuição de Herbert Bartz para a agricultura brasileira e, particularmente, para a paranaense, é inestimável. Seu pioneirismo no plantio direto fará com que o sonho de produzir alimentos em abundância e qualidade, que ele transformou em realidade, continue se concretizando por muitos e muitos anos”, disse.
Natalino Avance de Souza, presidente do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná – Iapar-Emater, reforçou que Bartz foi fundamental no desenvolvimento da agricultura paranaense. “A visão de futuro em relação à agricultura paranaense e brasileira, a coragem com que soube buscar soluções para que o solo mantivesse suas propriedades nutricionais e a tenacidade em aplicar as técnicas em que acreditava fazem dele um dos grandes homens da agricultura nacional”, elucidou.
LEIA MAIS > Saiba como a transformação digital vem puxando a produtividade dos canaviais
O falecimento de Bartz foi comentado nas mídias sociais por diversas lideranças do agronegócio. Como o caso de Paulo Herrmann, presidente da John Deere no Brasil, que afirmou ser Bartz um perseverante na busca de soluções para se fazer uma agricultura mais sustentável e mais racional nos trópicos. “Desde a década de 70, ele começou a estudar a nossa região e foi um dos grandes responsáveis pelo plantio direto no Brasil, que é um dos grandes marcos da evolução e do progresso do agro brasileiro. Hoje, o plantio direto representa mais de 60% de toda a área de grãos plantada no Brasil”, disse.
Herrmann ressaltou ainda que o agricultor foi um grande incentivador e sempre lembrava a todos que “o plantio direto na palha não é uma tecnologia pura e simples, mas sim um conceito de vida, uma filosofia de preservação ambiental, de responsabilidade com o meio ambiente e principalmente com as futuras gerações”.
Para Francisco Matturro, presidente da Agrishow, Bartz foi um homem que mudou o agro brasileiro, possibilitando desenvolver a agricultura em solos pobres, terras que predominam no Brasil. “Só foi possível desenvolver a agricultura no cerrado brasileiro com o plantio direto, como também, a segunda safra no Brasil. Não teríamos condição de fazer em clima tropical alguma coisa que não fosse com este sistema e o Bartz teve essa competência. Teve a visão de transformar o agro brasileiro através do plantio direto”, alegou.
Matturro ressaltou que o agricultor contribuiu rigorosamente para o agro que o Brasil tem hoje. “Esse agro respeitado e de certa forma até temido pelo mundo. Ele transformou a vida das pessoas e a vida do Brasil”, disse. Reforçou ainda que o sistema foi se aperfeiçoando e se adequando a cada região, com muitos seguidores.
Denizart Bolonhezi, pesquisador do Instituto Agronômico (IAC), lembrou a importância do produtor rural para o setor sucroenergético. “Herbert Bartz, o “alemão teimoso” de Rolândia é a referência a todos que pesquisam, difundem e praticam a agricultura conservacionista, no Brasil e mundo. Para os profissionais do setor sucroenergético é um exemplo de persistência no aperfeiçoamento do sistema plantio direto e da convicção dos benefícios da palhada. Nossa inspiração a continuar as pesquisas nesse tema. Sem a insistência dele, talvez estaríamos usando grade indiscriminadamente até hoje”, ressaltou.
“Eu tive um sonho, que era produzir alimento em qualidade e em abundância”
Publicação da Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Paraná traz um histórico sobre a vida do agricultor, que nasceu em Rio do Sul (SC), em 14 de fevereiro de 1937. Filho de imigrantes germânicos, foi criado na Alemanha conflituosa, em meio à fome, frio e solidão da guerra. Em entrevistas, ele relatou que, na noite de seu oitavo aniversário, Dresden, onde estava, foi bombardeada.
Abrigado com outras crianças em um porão, foi salvo pelas águas jogadas por adultos, que possibilitaram enfrentar o imenso calor. “Eu tive um sonho, que era produzir alimento em qualidade e em abundância”, não cansava de repetir.
De volta ao Brasil em 1960, a família se fixou na Fazenda Rhenânia, em Rolândia, trabalhando com plantio de milho e arroz. Mas logo percebeu que, no sistema convencional de produção, não sobrariam muitos recursos para o sustento familiar. Os problemas das chuvas tropicais irregulares, que vinham em excesso, após longo período de estiagem, lavavam as lavouras, carregavam as sementes e provocavam a erosão.
A possibilidade de venda das terras foi ventilada na família. Herbert, já visionário, propôs que o pai, Arnold, arrendasse a propriedade para ele, que procuraria uma receita mais apropriada para trabalhar a terra nas condições brasileiras. Na busca pela solução, Bartz esteve na Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos, onde conheceu a técnica do “No-Tillage” na propriedade do agricultor Harry Young Jr., no Kentucky.
LEIA MAIS > Atvos doa mil litros de álcool 70% no combate à pandemia em Costa Rica
Em 1972, após importar a mesma máquina semeadora não agressiva que Young usava, ele adotou o método que, no Brasil, passou a ser chamado de Plantio Direto. Consiste no mínimo ou na ausência de revolvimento do solo, manutenção dos restos culturais da safra anterior e em rotação de culturas. Com isso, conseguiu resultados positivos na produtividade da soja, na conservação do solo e na economia com menos uso de maquinários.
LEIA MAIS > Embarques de açúcar pelo Porto de Santos cresceram 69,5%, em 2020
A desconfiança inicial, que levou Bartz a ser chamado de “alemão louco” e a produção ser apreendida pela Polícia Federal, logo foi substituída pela certeza de que a adoção da técnica garantia maior produtividade. A fama se espalhou, a propriedade ganhou visibilidade, outros produtores passaram a visitar e perceber que o solo estava mais vivo.
Não demorou muito para que o sistema ganhasse adeptos e Bartz percorresse o Brasil e outros países proferindo palestras. Hoje, prestes a completar 50 anos de implantação no Brasil, o Plantio Direto, nascido da visão de futuro de Herbert Bartz, já se espalhou pela América do Sul.
Ele deixa a esposa Luíza e os filhos Johann e Marie.
Esta matéria faz parte da edição 323 do JornalCana. Para ler, clique AQUI!