Ainda distante de ser a panaceia, que vai resolver todos os problemas do canavial, a irrigação vem superando mitos e vai ganhando força entre os produtores de cana que buscam além de expandir, assegurar a tão almejada estabilidade na produção. Os projetos, antes restritos à região nordeste, passam a migrar para região Centro-Sul, onde usinas e produtores já sinalizam investimentos em sistemas baseados na irrigação.
“Esse fato pode ser claramente observado com a entrada de grandes empresas do setor no mercado de irrigação e de uma maneira muito agressiva. O que vem demonstrando que finalmente o segmento voltou os olhos para a irrigação”, afirma Carlos Sanches, diretor de marketing Mercosul da Netafim.
Segundo ele, a irrigação passou a estar na pauta das usinas e fornecedores. “O mercado do Nordeste é mais maduro para esse trabalho de irrigação, onde já temos 15 usinas. A Netafim, porém, pretende escalar o mercado de cana do Centro-Sul. Atualmente grandes grupos como Raízen, Bevap, Alta Mogiana fazem parte do nosso processo”, informou Sanches.
De acordo com o diretor, as usinas vão expandindo o programa. “Colocam a irrigação como projeto piloto, e aí vem a expansão, com as áreas irrigadas crescendo a cada ano. Portanto, muito mais importante que o número de usinas é a expansão que suas áreas vão alcançando”, alegou.
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Para Sanches esse crescimento se deve aos expressivos aumentos de produtividades registrados com o a utilização do sistema. “Claro que a produtividade depende do ambiente de produção, mas a gente costuma comparar a cana irrigada final de safra, com uma de sequeiro de final de safra. A produtividade aumenta na média de 50 a 60 toneladas por hectare. É um incremento bastante expressivo. E não estamos falando só de água, e sim de água mais nutrição, ou seja, você aproveita o sistema de irrigação para fazer uma boa nutrição da cana“, acrescentou.
E os investimentos continuam crescendo. A Tereos deu início a um projeto piloto de irrigação por pivô central de seus canaviais em duas de suas unidades – Vertente (Guaraci) e São José (Colina), ambas no noroeste do estado de São Paulo.
A operação visa incrementar a produtividade no campo – estima-se um ganho de 20 toneladas por hectare de cana – além de atenuar o impacto dos períodos de seca. O sistema de irrigação piloto contará com dois pivôs centrais que cobrem cerca de 250 hectares de plantio próprio.
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Complementado pela fertirrigação, que consiste na aplicação de água residuária junto à vinhaça nos canaviais, o projeto de mitigação de déficit hídrico da companhia alcançará 40% da área de plantio de cana-de-açúcar.
As duas unidades escolhidas para iniciarem o projeto foram selecionadas por conta da maior disponibilidade hídrica das suas regiões, localizadas próximas aos rios Pardo e Grande, garantindo o uso racional do recurso pelas operações da empresa.
“Nos dois últimos anos, nossa região enfrentou um longo período de estiagem, com a pior seca em 90 anos na última safra. Dessa forma, as medidas de irrigação e fertirrigação são cada vez mais importantes para garantir a produtividade dos nossos canaviais”, comenta Everton Carpanezi, superintendente de Operações Agroindustriais da Tereos.
Cassio Paggiaro, da Usina Santa Adélia disse que “a irrigação traz a possibilidade de ganhos para áreas de sequeiro, deslocando essas áreas para onde elas forem mais produtivas. Trata-se de uma ferramenta de manejo, que assegura também, segurança empresarial. Vamos implantar 1.300 ha de gotejamento em 2024 para colher em 2025″, informou.
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Já a BEVAP Bioenergia tem investido num grande projeto de irrigação. Somando áreas próprias e de fornecedores, são 30 mil hectares de cultivo de cana-de-açúcar, com mais de 150 pivôs.
Além disso, conta também com irrigação por gotejamento, sendo a única do setor com 100% de irrigação plena (manejo frequente de água durante o ciclo da cultura, em quantidade e local exatos do cultivo da cana), se diferenciando do tradicional manejo de salvação (realizado para evitar que a lavoura sofra o estresse hídrico).
Isso é relevante considerando que, segundo dados da Agência Nacional de Águas (ANA), excluindo a fertirrigação (aplicação da vinhaça sobre o solo), apenas 6,7% dos mais de 11 milhões de hectares de cana no Brasil são efetivamente irrigados em qualquer uma das modalidades existentes.
O projeto BEVAP foi concebido e está estrategicamente posicionado numa região que apresenta relevo plano, com diversidade de solos, boa disponibilidade de recursos hídricos, características climáticas ideais para o cultivo da cana-de-açúcar, mas marcadas por longos períodos de estiagem. Por isso, a Bevap, desde sua concepção, tem investido em projetos de irrigação automatizados e de alta tecnologia.
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“A irrigação está no DNA da empresa, que nasceu com propósito de operar com irrigação totalmente plena. Nossa busca incansável por inovação resultou no investimento do Irriger Connect e Cogni, programas pioneiros no manejo e gerenciamento de irrigação para uso racional de água e energia elétrica na cultura da cana-de-açúcar, proporcionando Lâmina de água na quantidade e momento certos, com maior eficiência na aplicação, sem desperdício dos recursos hídricos”, explica Arturildo Apelfeler, especialista no assunto e que ajudou a desenvolver e implementar os sistemas de irrigação na BEVAP.
O correto manejo cultural integrado para cada de variedade de cana plantada, também foi determinante para o alcance de resultados satisfatórios.
“O trabalho da empresa está colocando o Noroeste de Minas Gerais no mapa dos mais importantes polos de bioenergia do país. Prova disso é o aumento de sua capacidade de moagem nos últimos anos, a qual atingiu cerca de 3 milhões de toneladas de cana, podendo chegar a 4,5 milhões de toneladas (capacidade instalada) de cana por safra”, comenta a empresa.
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Usinas do Nordeste que já estão mais familiarizadas com o sistema de irrigação seguem investindo. Instalada no município de Juazeiro, na Bahia, a Agrovale é a única usina no semiárido brasileiro, com 100% de área plantada completamente irrigada, sendo a detentora da marca de maior área plena de irrigação em cana no Brasil.
Outro exemplo é do Grupo Olho D’Água que inaugurou no início de novembro, em Aliança – PE, a 86 km do Recife, a barragem Dr. Murilo Tavares de Melo, com capacidade para 17,8 milhões de metros cúbicos de água.
A obra, concluída em menos de um ano, fica dentro de uma área de 186 hectares e é a primeira etapa de um amplo projeto de irrigação de 4 mil hectares, dos quais 1,2 mil hectares serão irrigados por gotejo, e outros 2,8 mil hectares irrigados por aspersão. No total, serão investidos R$ 74,2 milhões, sendo R$ 58,8 milhões com recursos financiados pelo Banco do Nordeste (BNB).
A nova barragem faz parte da estratégia do grupo em manter a regularidade das safras otimizando a oferta de água. Nessa linha, já possui a maior barragem privada de Pernambuco, a Artur Tavares de Melo, inaugurada em 2003, com capacidade para armazenar 21 milhões de metros cúbicos, com um espelho d’água que ocupa uma área de 320 hectares. Com a barragem Dr. Murilo Tavares de Melo, o grupo assegura a alta produtividade de suas usinas.
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O Grupo Olho D’Água possui 50 mil hectares de área agricultável, dos quais 70% já são beneficiados com irrigação. Suas três usinas respondem por uma capacidade industrial de moagem 4,5 milhões de toneladas de cana-de-açúcar por ano.
Nilceu P. Cardoso, consultor da Canaplan, avalia que a irrigação não deve ser vista apenas na questão da produtividade, mas também para diluir os custos de todas as operações, dando maior estabilidade à produção. “Esse assunto deve fazer parte do nosso radar não apenas em épocas de grande estiagem. Irrigação não é só jogar água, é auxiliar no desenvolvimento da planta“, disse.
Conforme estimativa da Canaplan, a produtividade dos canaviais do Centro-Sul na safra 2022/23 deve ficar entre 71 toneladas de cana por hectare e 73 toneladas de cana por hectare. E deve ter uma leve recuperação na próxima temporada, com a qualidade da cana em 141 kg/t e a produtividade em 75,5 toneladas de cana por hectare. Porém, apesar da recuperação prevista, tudo dependerá das condições climáticas se mostrarem mais favoráveis ou não ao desenvolvimento do canavial.
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“De 2009 a 2021 tivemos uma estagnação e ainda estamos bem distantes do potencial de produtividade da cana. Uma forma de reduzir essa distância é a irrigação, com a aplicação de sistemas mais eficientes como o de gotejo. Mas para isso, é preciso constância neste assunto, que só é tratado em grandes quebras de safra”, pontua Cardoso.
De acordo com ele, em uma área de 5 mil metros irrigados, comparado à área equivalente de sequeiro, foi constatado um ganho médio de 217 mil toneladas em 5 mil ha, mais com picos de 340 mil. “A irrigação permiti ainda o ganho de estabilidade, que é o grande desafio da agricultura”, afirmou.
O consultor ressalta ainda que a irrigação é uma ação que precisa ser bem planejada e entre suas vantagens estão: aumento na produtividade, longevidade, estabilidade e custos. “O uso da irrigação vai passar por uma reflexão sobre o uso eficiente da água. Não se pode confundir irrigação com molhamento de cana. Precisamos produzir mais e logo. A irrigação possibilita muitos ganhos indiretos, inclusive a redução da emissão de CO2”, conclui.