Quando fez sua oferta pública inicial de ações (IPO) no ano passado na BM&FBovespa, a Biosev, braço sucroalcooleiro da multinacional francesa Louis Dreyfus , trouxe uma novidade. A companhia ofereceu aos investidores que comprassem suas ações na oferta a opção de vender os papéis de volta aos controladores após um prazo de 15 meses, pelo preço pago na oferta corrigido por juros. Essa opção seria detonada se a cotação dos papéis da empresa na bolsa, ao fim do prazo, não superasse R$ 16,57. Os meses se passaram, julho chegou e, atualmente, as ações valem R$ 6,40.
Obviamente, todos os acionistas que têm as opções em mãos vão querer exercê-la. Além de a Biosev ter de desembolsar aproximadamente R$ 600 milhões para honrá-las, a situação criou um problema adicional à empresa. Quando recomprar as ações, através da Hédera Investimentos, veículo que criou para lançar as opções, a controladora Louis Dreyfus Commodities (LDC) ficará com mais de um terço dos papéis em circulação na bolsa (free float) – o que dispara, conforme a Instrução CVM 361, a necessidade de realização de uma oferta pública de ações (OPA) por aumento de participação. Ou seja, teria que ser lançada uma oferta para todos os acionistas, o que demandaria ainda mais recursos.
Para evitar esse problema, a Hédera recorreu à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pediu um prazo de 24 meses, a contar da data da liquidação financeira do exercício das opções, para recompor o percentual de ações em circulação sem ter de fazer a OPA. Após a apreciação do assunto pelo colegiado, o prazo concedido para a controladora foi de 18 meses.
Inicialmente, a Hédera havia feito uma consulta à autarquia para confirmar seu entendimento de que, por conta das características de seu IPO, coordenado pelo BTG Pactual, não haveria a obrigatoriedade de realizar a OPA por aumento de participação. No entanto, a área técnica manifestou entendimento contrário e informou que a oferta deveria ser lançada. A área técnica sugeriu que a empresa solicitasse à CVM autorização para não realizar a OPA por aumento de participação desde que se comprometesse a vender o excesso de ações que viesse a adquirir em um prazo de três meses.
Diante dessa primeira resposta da área técnica, Biosev e Hédera optaram por desistir da primeira consulta e fazer o pedido de um prazo de 24 meses para recompor o percentual da empresa em circulação. A solicitação foi justificada por ambas em razão do “momento atual do mercado e das dificuldades enfrentadas por todos os agentes, reduzido grau de liquidez e o alto grau de insegurança para a tomada de decisões por parte dos investidores”. Além disso, observaram que precisariam de tempo para estruturar a venda dos papéis.
Depois de seu IPO, a Biosev ficou com 41,52% do seu capital social em circulação (free float), ou 85,869 milhões de ações. Com o exercício das opções, a controladora deverá comprar 37,406 milhões dessas ações, reduzindo o percentual livre para a negociação na bolsa para 23,44%. Esse percentual também não atende aos 25% exigidos pelo Novo Mercado, segmento de listagem da BM&FBovespa no qual a Biosev é negociada. A bolsa já autorizou a Hédera a recompor o percentual exigido pelo Novo Mercado no prazo de um ano. Para tanto, a Hédera deverá vender, nesse período, 3,239 milhões de ações, ou 1,56% do capital.
Após essa recomposição, a empresa ainda terá de vender mais 5,543 milhões de ações, ou 2,68% da companhia, para que o “excesso de participação” adquirida por conta do exercício de opções seja equacionado. Se a empresa tiver de fazer também essa última venda no prazo de um ano, significaria uma venda em mercado de 8,783 milhões de ações, ou 18,12% do free float, o que poderia prejudicar ainda mais as cotações da Biosev.
No mês passado, a empresa informou que teve no quarto trimestre da safra 2013/14, encerrado em 31 de março, um prejuízo líquido de R$ 1 bilhão. No acumulado do ano, quando a receita líquida alcançou R$ 4,3 bilhões, o prejuízo líquido chegou a R$ 1,5 bilhão. A empresa fez um empréstimo sindicalizado de US$ 440 milhões que, segundo seu diretor financeiro, Paulo Prignolato, ajudará a alongar sua dívida – os compromissos de curto prazo somam cerca de R$ 1,9 bilhão.
A estratégia de ofertar as opções no momento do IPO foi adotada porque a Biosev precisava se listar em bolsa até agosto de 2014, por conta de contrato fechado na fusão da Biosev (antiga LDC-SEV) com o Grupo Santelisa Vale. O documento regula as condições do refinanciamento da dívida bancária da Santelisa Bioenergia com a Usina Continental e com Bradesco, Banco do Brasil, Itaú e Itaú BBA, que estão como coordenadores da oferta. E previa que, na oferta, 30% dos recursos captados para o caixa da Biosev amortizariam a dívida com credores. Antes da listagem em bolsa, em abril do ano passado, a Biosev já tentava há alguns anos abrir capital, sem sucesso.
A opção foi concedida pela controladora como “uma demonstração de confiança negócio” e a Hédera depositou, com recursos próprios, o valor necessário para honrar a opção na CBLC.