Mercado

Usinas recompram açúcar de exportação

O mercado interno está pagando mais pelo açúcar e usinas estão cancelando contratos de exportação para recolocar o produto internamente. A estimativa de analistas é de que cerca de 30 mil toneladas do produto tenham sido retirados da rota externa para serem revendidos no mercado interno. “E difícil precisar esse número. Mas somente a minha corretora fez nas últimas semanas 20 mil toneladas de wash-out (suspensão da entrega física com liquidação financeira da diferença entre os preços do contrato e os atuais)”, diz um trader. Ele conta que a maior parte do volume cancelado se refere a açúcar cristal, cuja demanda está muito aquecida no mercado interno.

Arnaldo Luiz Corrêa, da Archer Consulting, explica que o cancelamento desses contratos é feito de forma consensual com o comprador em troca. Inclui, obviamente uma compensação financeira, geralmente equivalente à diferença entre o preço fixado no contrato e o valor atual de mercado. “As usinas e tradings desfazem o negócio para aplicar o produto em outro mercado mais rentável, nesse caso específico, o interno”, acrescenta Correa, da Archer.

Na última quarta-feira, a diferença de preços entre o açúcar cristal de exportação e de mercado interno estava próximo de R$ 1,50 por saca, o que significa que o mercado interno estava remunerando 3,2% mais.

De fato, as cotações domésticas da commodity estão mais aquecidas que as internacionais. Desde o início de janeiro, a saca de 50 quilos valorizou-se 41%, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP), saindo de R$ 33,04 em 2 de janeiro para $ 46,64 ontem. Já a cotação da commodity na Bolsa de Nova York (Nybot) – que serve de parâmetro para a remuneração internacional, apesar de não incluir o valor dos prêmios ou descontos nos portos – sofreu nesse período oscilações para cima e para baixo, acumulando alta de 5,7% até 20 de fevereiro, quando a maior parte dos wash-outs tinham sido feitos, e até ontem, elevação de 12,5%. O contrato maio encerrou ontem em 13,90 centavos de dólar por libra-peso, alta de 3,5% em relação ao dia anterior.

Não há um valor médio pago pelo vendedor para cancelar esses contratos. “Cada usina está vendo a sua oportunidade de ganho e negociando com seu comprador. De forma geral, esse pessoal está fazendo bom negócio”, avalia o trader.

Oferta restrita

Além de as usinas terem produzido um menor volume deste tipo de açúcar (pois a qualidade da cana-de-açúcar na safra não favoreceu essa fabricação), e de muitas sustentarem a estratégia de estocar o produto na expectativa de remunerações maiores à frente, há também, segundo o trader, produto impedido de ser comercializado por usinas que deram o açúcar como garantia de empréstimos a bancos. “Parece-me que realmente tem mais açúcar retido do que se imaginava. Isso está ajudando o mercado a subir. Alguns bancos estão procurando traders para ajudar a comercializar esse açúcar com garantias de pagamento da dívida. Nós aqui tínhamos comprado açúcar de uma usina, que teve açúcar retido. Em janeiro, tivemos que pagar o banco credor para ter a liberação do produto físico para embarque”, conta o trader. Ele acrescenta que neste período há típico aquecimento do mercado interno, motivado pela produção industrial de sucos e refrigerantes por causa do Verão, e da proximidade da Páscoa.

Estoques

A perspectiva de déficit mundial de açúcar – e a projeção de preços futuros mais altos que ela traz – motivou as usinas brasileiras a reforçarem a estratégia de estocar o produto para vender a valores mais altos na entressafra. O grupo São Martinho, que está entre os dez maiores produtores brasileiros da commodity, detinha ao final do terceiro trimestre da safra (até 31 de dezembro de 2008) 275 mil toneladas do produto, 68% mais que os 164 mil toneladas que a empresa estocava em mesmo período do ano anterior. Aos preços da primeira semana de fevereiro, o valor dos estoques de açúcar do grupo valem R$ 182 milhões. A empresa espera, com a venda de seus produtos a preços melhores na entressafra, recompor o acréscimo de capital de giro demandado pelo aumento dos estoques totais. Até 31 de dezembro, o grupo tinha R$ 428,4 milhões em capital de giro investidos em suas operações, representando um aumento de R$ 137,1 milhões quando comparado ao mesmo período de 2007.

A Açúcar Guarani, a segunda maior produtora de açúcar do Brasil, também elevou neste ciclo o volume de estoques carregados para serem vendidos no período de entressafra. De acordo com balanço da companhia, em 31 de dezembro de 2008 a empresa detinha 368 milhões de toneladas em seus armazéns, ante os 334 milhões de toneladas de mesmo período de 2007.