Mercado

Usina também sofre com alta do açúcar

Elas desembolsam US$ 2 bi para bancar os ajustes diários dos preços em Nova York. A disparada dos preços do açúcar no mercado internacional é visto como uma benção, mas também como um problema pelas usinas brasileiras.

Isso porque 20% da exportação brasileira, projetada em 15,5 milhões de toneladas, está amarrada na Bolsa de Nova York. Com a alta dos preços, os usineiros precisam cobrir as margens diárias de ajuste na bolsa.

Na sexta-feira, o açúcar atingiu o maior preço em 24 anos na bolsa. Nos últimos 12 meses, as cotações acumulam alta de 83%. “Os contratos com entrega em marco fecharam a 17,15 centavos de dólar a libra-peso, mas em média as usinas venderam o açúcar a 12 centavos de dólar”, diz Maurílio Biagi Filho, da Usina Moema.

As regras da bolsa rezam que os preços devem ser reajustados diariamente até sua entrega. Levando-se em conta que os usineiros venderam o açúcar a 12 centavos e hoje ele custa 17 centavos, estima-se que já tenham depositado perto de US$ 2 bilhões em ajuste de margens.

Vale lembrar que os US$ 2 bilhões não foram simplesmente “queimados”; eles ficam depositados em uma conta da bolsa. Se os preços caírem, parte do dinheiro retorna. E, ao final do contrato, a conta é zerada. Ou seja, a usina não perde nem ganha dinheiro.

A maior dificuldade é “carregar” os contratos, ou seja, bancar a margem diariamente. Principalmente em caso de alta de preços. Quando os preços sobem, é preciso depositar a margem em dinheiro ou em títulos públicos americanos.

“Tem usina depositando US$ 20 milhões, US$ 30 milhões, até US$ 160 milhões para margear o contrato”, informa Biagi Filho. Algumas usam o dinheiro de caixa e outras recorrem a financiamentos em bancos.

“Janeiro é um mês especialmente difícil porque as usinas estão paradas, à espera da colheita, e por isso não há dinheiro entrando”, diz.

Ele ressalta que isso não significa que as usinas terão problemas de caixa ou irão segurar os investimentos. “Não temos como segurar os investimentos, do contrário não teremos como cumprir os compromissos feitos tanto na produção de açúcar quanto na de álcool”.

Ele diz que a alta dos preços do açúcar “pode, mas não deve” prejudicar o abastecimento de álcool no Brasil.

Os produtores de açúcar vão manter os esforços para evitar risco de desabastecimento do etanol, apesar das altas significativas registradas no mercado internacional do açúcar, segundo o diretor da Usinas e Destilarias do Oeste Paulista (Udop), Fernando Perri. “O setor está suficientemente maduro para entender que não pode deixar faltar etanol, mas precisamos de um planejamento estratégico. Sem organização, cada um vai produzir o que der mais retorno para sua empresa”, avalia Perri.

Ele explica que os usineiros não deixarão de produzir álcool, mas poderão direcionar para a produção de açúcar o “excedente maleável”, capacidade que pode ser direcionada para um ou outro item. “Com os preços do açúcar de 30% a 40% maiores que os de álcool, quem vai querer produzir etanol com esse excedente? O mercado de álcool ficará mais pressionado”, diz.

O representante da Udop defende que a busca do equilíbrio na produção dos dois itens passa pela definição de cotas de álcool para cada produtor. Outro mecanismo para incentivar a produção do combustível seria a realização de leilões antecipados pela Petrobras com pré-pagamento pelo etanol, para garantir mais cana para álcool.

A pesquisadora do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), Mirian Rumenos Bacchi, concorda que a produção de álcool pode ser influenciada pela alta dos preços do açúcar no curto prazo, dentro da margem de flexibilização da produção das usinas. “Os preços na Bolsa de Nova York são muito voláteis. As projeções de médio e longo prazo não indicam tendência de valorização”, diz, ressaltando que o mercado interno de álcool está consolidado, com grande demanda pelos veículos flex-fuel. Ela destaca que a regulação dos estoques contribui para reduzir os efeitos sazonais da entressafra de cana, como a oscilação de preços do álcool.

O analista da consultoria Safras & Mercado, Gil Barabach, destaca que o mercado interno – indústrias de alimentos e bebidas – está remunerando melhor as usinas pelo açúcar do que os exportadores. “A saca de açúcar é negociada de R$ 47,5 a R$ 48, enquanto a paridade de exportação é de R$ 45 a R$ 46”, diz. Segundo Barabach, os preços do açúcar devem se manter firmes no mercado internacional até a entrada da safra em maio.