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Tecnologia da cana une Secretaria e CTC

O secretário estadual da Agricultura e Abastecimento, Duarte Nogueira, anunciou ontem a assinatura de convênio com o CTC (Centro de Tecnologia de Cana-de-Açúcar) – ex-Copersucar -, que permitirá compartilhar o acervo de banco de gemoplasma, ou seja as variedades “mães” ou “pais” da cana-de-açúcar. Esse acervo está na cidade de Camamu, na Bahia.

Esse convênio reforça a tecnologia de cana-de-açúcar da Secretaria. Há outro tipo de investimento?O Centro de Cana de Ribeirão Preto, que consolidamos em março último com a contratação de mais nove pesquisadores, foi tema de encontro na última terça-feira entre sua diretoria e a equipe da Embrapa para avocar para Ribeirão a coordenação de todo um centro nacional de pesquisa de cana.

Significa que a cana geneticamente modificada também está nos planos?

Isso [o centro nacional] nos remete para a transgenia. Demos um passo importante ao aprovar a lei de biossegurança, junto com a questão das células-tronco. Foi um arejamento que o Congresso permitiu, reflexo da visão adequada da sociedade. Já existem pesquisas de laboratório nessa linha, algumas até com vários anos, e agora elas poderão ganhar o campo dentro da biossegurança exigida para se fazer tudo isso. Eu não tenho dúvida: o gargalo, os obstáculos para que possamos superar e manter este estado de hegemonia que nós dominamos hoje em termos de produção e de tecnologia, tanto de abastecimento de preços no mercado interno como para vislumbrar a exportação de alimento (açúcar) ou da energia (álcool), passa por essa tarefa de controlar adequadamente a questão da pesquisa.

O IAC desenvolve pesquisas relacionadas à transgenia?

Nossos técnicos são pessoas experimentadas em todas essas áreas, mas não em larga escala. Têm algumas ações pontuais, mas não há aqui no nosso Centro de Cana, ou no IAC, um trabalho mais concentrado na área de transgenia. Como também não há no CTC. Eles dominam a tecnologia, mas até então ela não era utilizada. Poderá ser feita agora com o regramento da lei federal em vigor.

Há uma previsão de entrada da cana transgênica no mercado?

Esse é um calendário que precisa ser tecnicamente avaliado. O uso da transgenia demonstrou em outras plantas, em outros cultivares, que essa tecnologia encurta os resultados almejados. O cruzamento varietal, na forma de obter novos indivíduos, tem um prazo de demora muito maior do que a transgenia, que encurta essa distância. E, por uma questão de tempo, ela irá oferecer um resultado mais rápido.

Sobre o açúcar, há mesmo motivos de otimismo no setor?

A OMC (Organização Mundial do Comércio) de fato deu ganho de causa a um painel [processo] aberto pelo Brasil, Tailândia e Austrália. Essa vitória no painel permitiu questionar os subsídios para o açúcar europeu, produzido a base de beterraba, com eficiência de produção muito aquém da conseguida através da cana-de-açúcar, principalmente em um país como o Brasil, e isso irá chacoalhar de fato o mercado porque deverá diminuir a irrigação de açúcar de beterraba subsidiado. Então há uma questão comercial envolvida. Ninguém é mais competitivo do que nós para produzir açúcar. O de beterraba tem um custo de produção entre US$ 700 a US$ 750 a tonelada, mas eles conseguem colocar no mercado a US$ 200 porque os outros US$ 550 são bancados para os produtores, criando um desarranjo enorme. Este é um fato de valor de mercado.

Mas há também a questão tecnológica

Sim, outra questão é o avanço tecnológico. Eu comentava na última terça-feira na Agrishow, quando participava de evento sobre assinatura de convênio entre uma indústria de tratores com o segmento de pesquisa e de produção de biodiesel, que o exemplo que esse combustível irá nos dar é o mesmo que nos deu a cana-de-açúcar há 30 e poucos anos com o Proálcool. Esse programa trouxe o litro de álcool de 80 centavos de dólar, logo depois da primeira e segunda crise do petróleo, até final da década de 70, para atuais 20 centavos. E essa curva de aprendizagem se deu em um enorme ganho de eficiência de transformação da sacarose em álcool, com menos perda possível dentro da indústria. E entre várias economias realizadas, entre logística e até eficiência ambiental, chegamos até à produção.

Exemplifique, por favor

Hoje conseguimos um leque de variedades de cana que nos torna menos vulneráveis a pragas e doenças, elas estão mais adaptadas a ganhos de sacarose, conversão, e equilíbrio em que o ganho de maturação está em determinadas épocas do ano, que permite se colher a cana de maio a até novembro, no final da safra, no ápice do estágio de maturação [da planta] para transformar o máximo de sacarose em açúcar ou álcool. Tudo isso em cima do processo de melhoramento genético.

O Copom decidiu novamente subir a taxa básica de juros (de 19,50% para 19,75%). A cadeia do agronegócio terá de aprender a conviver com esse tipo de situação de juro alto e dólar em baixa?

Eu disse na última segunda-feira, durante a solenidade de abertura da Agrishow, que manter essa política de incremento da taxa de juros é um desastre. Então eu repito: a decisão do Copom colabora para acelerar o desastre. O Brasil tem hoje a maior taxa de juros real do mundo. Nenhuma outra nação banca uma ciranda financeira tão inadequada.

O governo federal erra?

O governo está sendo incompetente em enxugar os seus custos, as suas despesas, e ele capta 80% dos recursos em aplicações, disponíveis para investimentos, para poder rolar sua dívida e, com isso, aumenta ainda mais as despesas. Como não há mais maneira de aumentar a carga tributária, que atingiu limites exageradíssimos, o governo tenta controlar o aumento da inflação única e somente por meio da taxa de juros. Quando na verdade o controle da inflação ou a sua gestão, para que ela não apareça, seria diminuir o tamanho da máquina pública, desregulamentar a burocracia para facilitar as atividades dos empreendedores, reduzir os custos dos financiamentos para fomentos e geração de emprego. Ou seja, tornar o governo mais eficiente. Não é não gastar. Mas gastar melhor.

O sr. tem sugestão?

O Fórum Nacional de Secretários de Agricultura, que eu presido, irá procurar criar um debate em nossa área de atuação. E qual será esse debate? Estamos abraçando uma idéia que não é do Fórum, mas está presente em algumas instituições de representação do agronegócio, como na OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras), que defende a tese de que se deve estabelecer um debate para a unificação dos ministérios temáticos. Ou seja, unificar o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), o Ministério de Desenvolvimento Agrário e a Secretaria Especial de Pesca, que também é um ministério entre os 37 criados no governo Lula.

Como seria essa unificação?

A idéia da fusão desses ministérios temáticos propõe que, ao invés de se ter três ministros, três secretários executivos, três estruturas de recursos humanos ou três estruturas de pagamentos, que consomem mais da metade dos recursos de atividade fim, fazer isso em uma única estrutura, enxugar a máquina federal e criar condições para que com os mesmos recursos você possa dar mais atividade fim e, com isso, ativar mais a economia, gerar mais empregos e a produção na ponta.

O Fórum irá levar essa proposta ao governo?

O Fórum irá receber as sugestões das instituições, que estão em discussão, e irá usá-las como instrumento de reverberação, de propostas dentro da sociedade, por meio dos Estados onde elas estiverem presentes.

O sr. acredita que o governo federal fará a unificação dos ministérios?

O governo federal não deverá atender. Mas acho que isso [a proposta] pode servir como uma provocação para ser abraçada pelos futuros candidatos à Presidência da República porque isso é uma tarefa para um governo todo e não para um período de gestão.

O governador Geraldo Alckmin lançou oficialmente ontem, na Agrishow, linha de financiamento para o pequeno produtor rural (renda bruta anual de até R$ 180 mil), apelidada de Moderfrota paulista. Os recursos provêm do FEAP (Fundo de Expansão da Agricultura e da Pesca). Como funciona esse fundo?

O FEAP tem recursos do Tesouro do Estado e da carteira que ele gira. E cada linha de financiamento do Fundo tem um aporte de recursos para que os clientes possam ir tomando. Quando se lança uma linha nova, tem-se que aportar um recurso inicial dentro do disponível do Tesouro ou do próprio Fundo. Os recursos disponíveis naquele momento de criação da linha [cujo decreto saiu na edição de hoje do Diário Oficial do Estado] eram de R$ 5 milhões. Tudo leva a crer que pela concentração de procura do FEAP, e pela ausência de outras linhas de financiamento – e que era obrigação do governo federal colocá-las e com taxas de juros mais adequadas -, o Fundo acabou sendo o desaguadouro de uma série de demandas que se transformaram em propostas de financiamento. Essas propostas, conforme fui informado pela Nossa Caixa [banco que opera a linha], estão praticamente no volume dos recursos disponibilizados. Nem todas essas propostas irão virar financiamento porque passam por análise de crédito e o banco irá verificar se o tomador está na faixa do FEAP, por exemplo em termos de renda.

Por que essa linha do FEAP é atrativa?

Veja: o Moderfrota tem taxa de juros de 9,75%, enquanto a do FEAP é de 4%. E, além dos 9,75%, o governo federal ainda criou uma taxa de equalização (outros 4%). Então você acaba tendo um estreitamento das opções oferecidas aos agricultores e se acaba colocando tudo nas costas do próprio FEAP. E isso porque é em São Paulo. Em outros estados onde a Agrishow também é promovida, nem isso o agricultor teria.

Menos financiamentos afetarão o desempenho da Agrishow deste ano?

Essa falta de agilidade de financiamento [pelo governo federal] conseqüentemente não fará repetir o faturamento da Agrishow de outros anos. Além da crise da agricultura, está somada a isso a sobreposição de vários fatores: super produção mundial, queda no preço das commodities, principalmente soja, milho, arroz, trigo e algodão; aumento do custo de produção, petróleo, aço, encarecendo máquinas e todo o processo de preparo da safra, que contratou todos os insumos com o dólar a R$ 3,10, e agora tem de comercializar o seu produto com o dólar a R$ 2,50. E, para fechar com chave de ouro, houve a estiagem do começo do ano que, no caso do Rio Grande do Sul, chegou a gerar perdas de até 60%.

Além de negócios, a Agrishow de Ribeirão Preto tem sido palco de eventos políticos. O sr. acredita que em 2006, quando haverá eleições, a feira abrirá ainda mais espaço para a política?

Depende muito do cenário do momento que estamos vivendo. Não tenha dúvida de que, em 2006, deveremos ter um desfile de candidatos muito maior do que tivemos nesse ano. Mas a presença de lideranças políticas, no meu entender, tenderá a aumentar porque o setor do agronegócio se consolidou como responsável por um terço da renda do País, um terço da riqueza gerada, 37% dos postos de trabalho e, hoje, 43%, 44% de nossas exportações. E se há um local que é a maior e mais expressiva vitrine de todo esse conjunto é a Agrishow.

E há a infra-estrutura

Sim. Como a feira vai estar garantida nos próximos cinco anos em Ribeirão Preto [devido a convênio firmado entre a Secretaria da Agricultura, proprietária da área da feira, e a Abimaq, que promove o evento], e com o ganho de bem estar e de conforto para os visitantes e expositores, tenho certeza de que a feira continuará sendo um local de extrema importância para se travar esse debate, para que a imprensa possa divulgar as idéias, o cenário presente e também projetar o futuro, e eu fico feliz por isso.

Por que?

Além do aspecto de a feira levar Ribeirão Preto para uma projeção nacional e internacional, traz dividendos econômicos e sociais para a cidade e para a região. Não tenho dúvida alguma de que a semana de realização da Agrishow equivale a um segundo Natal para lojas, bares, restaurantes e prestadores de serviços do município.

O sr. está à frente da Secretaria há 2,5 anos. O que sua gestão anunciou e ainda espera implantar?

Coordenamos a instalação do Centro de Cana, contratamos os novos pesquisadores, transformamos efetivamente Ribeirão Preto na capital nacional do agronegócio, garantimos a feira para os próximos cinco anos. Em Ribeirão Preto, para fechar com chave de ouro, só falta implantar o programa Bom Prato, com refeições a R$ 1. Na verdade, o custo unitário é de R$ 2,70, sendo que a diferença é bancada pela Secretaria.

A implantação desse programa em Ribeirão Preto foi autorizada ontem pelo governador Geraldo Alckmin. Como esse restaurante funcionará?

A Secretaria faz um convênio com uma entidade do terceiro setor, sem fins lucrativos, que tenha anos a fio de experiência na área de assistência social. Feito o convênio, ou a entidade administra diretamente ou contrata empresa terceirizada e fornece as refeições dentro das exigências nutricionais de qualidade de cardápio que a gente pede.

Quantos funcionam hoje?

Hoje temos funcionando 18 desses restaurantes, sendo três no interior: em Campinas, São José dos Campos e em São José do Rio Preto. Estamos com o estudo pronto de demanda para a unidade de Ribeirão Preto.

Com a autorização do governo, em quanto tempo deverá entrar em funcionamento?

No máximo em quatro meses.