A falta de produto pode frustrar a tentativa do governo de trocar o gás natural por álcool nas usinas térmicas. A troca, que reduziria a dependência do País em relação ao gás boliviano, está sendo testada pela Petrobrás. No curto prazo não dá para fazer muita coisa. Não temos álcool para atender à demanda adicional, ainda mais se houver necessidade de grandes volumes, afirmou fonte do Ministério da Agricultura, que se confessou surpreso com a possibilidade. Antes de fazer a troca, é preciso saber se o uso do álcool é eficiente e se haverá oferta para as usinas, sem esquecer dos motores bicombustíveis ou movidos a álcool. As termoelétricas movidas a gás natural desempenham um papel de reserva de segurança no sistema elétrico brasileiro, aumentando ou diminuindo a produção de acordo com o nível dos reservatórios das hidrelétricas. Quando os reservatórios ficam mais baixos, as termoelétricas geram mais energia. Em 2005, as hidrelétricas foram responsáveis por cerca de 85% da energia elétrica gerada no País; as térmicas a gás responderam por apenas 4%.
A troca de gás por álcool nas termoelétricas pode criar um novo problema para o governo.
Ainda não há um marco regulatório claro para o setor sucroalcooleiro e, desde a mais recente crise de preços, em janeiro, não evoluíram as propostas avaliadas pelo governo para regularizar o mercado na entressafra de cana-de-açúcar. Desde o auge da crise, em março, quando o litro do álcool hidratado chegou a R$ 1,24 e o do anidro a R$ 1,21, a postura do governo tem sido a de esperar o recuo dos preços.
A antecipação da moagem amenizou o problema. Na semana passada, os preços fecharam a R$ 0,96 (anidro) e R$ 0,85 (hidratado), segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Universidade de São Paulo (USP).
Isso esfriou também a urgência do governo em colocar em prática medidas para impedir que a crise se repita na entressafra.
O senador Rodolpho Tourinho (PFL-BA), ministro de Minas e Energia no governo passado, avalia que, sem medidas estruturantes, uma nova alta de preços é quase certa no ano que vem. Nada indica que escaparemos de ter outra crise no álcool, principalmente se as condições forem as mesmas e se não houver um estoque regulador. O ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, afirma não fazer previsões para o ano que vem. Mas garantiu que, do ponto de vista das providências, tudo que está ao alcance de uma gestão responsável está sendo feito. A partir do próximo ciclo (da cana-de-açúcar), tenho uma expectativa extremamente otimista de que vamos passar sem maiores percalços. Mas a liberação de recursos para a estocagem parece ter caído no esquecimento. Segundo fonte do Ministério da Agricultura, o assunto perdeu a pressa, mas o ideal seria ter a linha para estocagem entre junho e julho.
Para o presidente da União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo (Única), Eduardo Pereira de Carvalho, a experiência da Petrobrás, para ter sucesso, deve ser acompanhada de um estudo global e estratégico de longo prazo sobre a escolha e uso da matriz energética brasileira. Não acho que soluções pontuais e apressadas possam resolver o problema. Já fizemos isso no passado e não deu certo. Carvalho acha a troca interessante, mas ela deve ser avaliada. É preciso saber que o setor enfrenta a expansão da frota de carros flex, o aumento da produção de anidro e o crescimento de demanda de álcool no mercado externo. Não acredito em espasmos.
O que eles podem fazer é criar mais problemas para o futuro, concluiu Carvalho.