Na última década, um número significativo de organismos teve o seu genoma seqüenciado, permitindo a análise mais aprofundada de mecanismos moleculares envolvidos em uma série de processos biológicos fundamentais. Podemos mesmo afirmar que houve uma corrida por parte da comunidade científica para seqüenciar o DNA de vírus, bactérias, fungos, helmintos, insetos, plantas e animais mais complexos, inclusive o homem. A ciência brasileira, seguindo uma tendência mundial, também se engajou nesta corrida.
Merece destaque a iniciativa de um grupo de pesquisadores do Estado de São Paulo em busca de seqüenciar o DNA da bactéria Xylella fastidiosa, causadora de uma doença que afeta os laranjais, causando prejuízos significativos na produção de suco de laranja, hoje componente importante da nossa pauta de exportações. Tal empreitada contou com o patrocínio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Como conseqüência, em julho de 2000, os pesquisadores paulistas publicaram na revista “Nature” os dados referentes ao genoma da Xylella, feito marcante da Ciência brasileira.
Logo a seguir, o Ministério de Ciência e Tecnologia, percebendo a importância da genômica como instrumento fundamental da pesquisa biológica contemporânea, patrocinou um programa de caráter nacional, com a participação de 25 laboratórios distribuídos por todo o país, que levou ao seqüenciamento do DNA da bactéria Chromobacterium violaceum, concluído em dezembro de 2001. Neste esforço nacional, houve significativa participação da comunidade científica fluminense, tanto no seqüenciamento como na parte referente à área da Bioinformática, onde o Laboratório Nacional de Computação Científica, localizado em Petrópolis, desempenhou papel relevante.
Em 2003, pesquisadores do Rio decidiram, com o apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), iniciar um projeto autônomo de seqüenciamento do genoma de uma bactéria importante para a economia fluminense. Trata-se da Gluconacetobacter diazotrophicus, responsável pelo processo de fixação biológica de nitrogênio. Nesta área, a ciência fluminense deu contribuição, reconhecida internacionalmente, graças aos trabalhos desenvolvidos na Embrapa pela equipe liderada por Johana Dobenheimer.
Agora, três anos depois, o seqüenciamento chegou ao final, trazendo informações importantes. Esta bactéria, envolvida no processo de fixação de nitrogênio por gramíneas, tem papel relevante no cultivo da cana-de-açúcar. O Brasil produz atualmente cerca de 25 milhões de toneladas de açúcar e 15,3 bilhões de litros de álcool por ano. O uso do processo de fixação de nitrogênio pela bactéria reduz o consumo de fertilizante nitrogenado. Estima-se que a utilização do inóculo bacteriano em 50% da área plantada, com uma redução de 20% no uso do fertilizante, leva a uma redução de 31 mil toneladas de fertilizante, gerando uma economia de US$18,7 milhões. Além de uma considerável economia do ponto de vista econômico, a não aplicação de fertilizante tem profundo efeito ambiental.
Agora, é preciso entrar na fase pós-genômica, em que as informações obtidas poderão ser úteis na obtenção de linhagens que melhor se adaptem à interação com a planta e com a fixação de nitrogênio, potencializando assim o efeito benéfico já conhecido. Este é o novo desafio que a Faperj enfrentará com a mesma determinação da primeira fase, acreditando uma vez mais no potencial da Ciência e do cientista fluminense.
WANDERLEY DE SOUZA é secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado do Rio