A queda dos preços internacionais do açúcar já chega a 46% nos últimos 12 meses e poderá decidir o sucesso das usinas brasileiras em manter-se no setor, em um momento em que há dinheiro sobrando para aquisições no segmento sucroalcooleiro. Nesse cenário, as usinas que possuem refinarias e marcas de açúcar de varejo saem em vantagem, pois esses mercados sofrem oscilações menores que os preços do açúcar bruto.
A Usina Cerradinho , de Catanduva (SP), está operando sua unidade de refino a plena capacidade para obter resultados melhores que os concorrentes no período de baixa, que deve ir até 2008, e depois sair fortalecida. “O refinado tem um custo final 25% maior que o do tipo VHP [bruto], mas hoje oferece uma remuneração muito melhor”, constata o gestor financeiro da usina, José Fernandes Rio .
A tonelada do açúcar VHP vale hoje cerca de US$ 220, mas o produto refinado apresenta um prêmio sobre esse valor que está hoje em US$ 144 — o que garante um preço final 65% melhor. “O produto industrializado também deve apresentar uma queda de receita para o usineiro, mas que tende sempre a ser menor que a baixa no preço de sua matéria-prima”, explica o analista do mercado de Açúcar e Álcool da Safras & Mercado , Gil Barabach .
O déficit na produção mundial de açúcar incentivou investimentos na produção, principalmente na Índia. Com isso, o mercado passou a ter superávit desde o ano passado e os preços começaram a cair. Barabach explica que ainda esse ano a Índia continuará aumentando a produção, porque os investimentos foram iniciados em anos anteriores. Soma-se ainda ao cenário baixista o aumento da produção no Brasil, onde as usinas mais antigas precisam ampliar a fabricação de açúcar junto com a de álcool.
A oportunidade brasileira de ganhar no mercado mundial de açúcar refinado, no entanto, é momentânea. A própria Cerradinho decidiu não ampliar a capacidade de refino, pois considera que está diante de uma janela de mercado que certamente se fechará nos próximos anos. Diversas “megarrefinarias” estão sendo construídas no Oriente Médio e no norte da África para atender à demanda, depois que a União Européia foi forçada a cortar suas exportações em cerca de cinco milhões de toneladas que eram subsidiadas.
Comprar ou ser comprado
Para resistir à crise e permanecer no mercado, a Cerradinho aposta não só em refinar seu açúcar, mas também em vendê-lo com as marcas próprias Cometa e CrystalLeve no varejo. “Esse segmento é importante porque apresenta menos oscilações de preços e é menos afetado pelo câmbio. O preço internacional dobra ou cai pela metade, mas isso não se reflete totalmente nas gôndolas dos mercados”, ressalta Fernandes.
A empresa atua no varejo há cinco anos e em 2007 deve comercializar por essa via cerca de 100 mil toneladas de açúcar refinado, superando as 90 mil toneladas que deverão ser exportadas. A Cerradinho tem capacidade para refinar cerca de 60% de sua produção de açúcar.
Com uma unidade recém- inaugurada em Potirendaba (SP) e outra em construção em Chapadão do Céu (GO), a Cerradinho chegará ao fim do processo de equalização do mercado mundial de açúcar com uma capacidade de moagem de 10 milhões de toneladas de cana por safra, o que a colocaria entre as 10 maiores do setor no País. “Esperamos ser os compradores de outras usinas, e não os comprados”, diz o executivo da companhia.
Mesmo com a queda nos preços internacionais do açúcar, a Da Barra Alimentos prevê aumentar seu faturamento em 20% este ano. Subsidiária do grupo Cosan , a empresa quer agregar ainda mais valor ao açúcar, com o lançamento de gelatinas, refrescos em pó e misturas para bolo.
Estoques estratégicos
Diante dos preços menos remuneradores no mercado de açúcar, as usinas do País estão buscando ainda aumentar a armazenagem do produto. A Rentank , empresa que vende e aluga galpões móveis para empresas do agronegócio, já percebeu uma movimentação anormal das usinas para garantir o aluguel de galpões para açúcar no segundo semestre. “Entre fevereiro e março, 10 empresas do setor já nos procuraram para fazer suas reservas, fato que nunca havia ocorrido antes”, conta o gerente comercial de macrogalpões da Rentank, Silvio Hein .
Na avaliação do especialista Gil Barabach, o objetivo dos usineiros é aumentar suas chances de vender o açúcar em momentos de preço melhor. Embora tenha impacto incerto, a retração da oferta brasileira de açúcar também objetiva melhorar os preços internacionais. “Muitos países importadores, como a Índia, passaram a ser exportadores de açúcar com a alta de preços que durou até o ano passado”, assinala o analista da Safras & Mercado.
Se não há como investir na armazenagem temporária de álcool, que exige a instalação de tanques, Barabach vê as usinas partindo para a estocagem de açúcar durante o período de safra, esperando preços melhores na entressafra. No entanto, essa saída não está sendo tomada pela Cerradinho, por exemplo, que conseguirá refinar 60% de seu açúcar.
A Rentank tem instalados hoje 65 mil metros quadrados de armazéns de açúcar e prevê crescer entre 22% e 25% nesse mercado em 2007. Hein lembra ainda que a armazenagem está entrando de vez na estratégia das usinas. Há três anos, apenas 20% dos armazéns para o segmento eram vendidos e o restante, locados. Hoje, os vendidos representam 60% da nossa metragem.