Quissamã, pequeno município de 16 mil habitantes na província petrolífera da Bacia de Campos, aposta no passado para garantir o seu futuro. A Prefeitura está investindo pesadamente para desapropriar e restaurar antigas casas de fazenda dos séculos 18 e 19, transformando-as em museus e buscando capital para adaptá-las para hotelaria. A idéia é incentivar o turismo de época nas fazendas que foram o potentado do ciclo do açúcar no Norte fluminense e concentração da nobreza brasileira no século 19.
A aposta é possível porque Quissamã está nadando em dinheiro: os royalties do petróleo pagos pela Petrobrás dobram a receita anual do município e elevam o orçamento para R$ 128 milhões. Com tanto dinheiro, a área de Cultura foi aquinhoada com R$ 5 milhões em 2006, ou 6,4%, quase 17 vezes mais que o orçamento da União, que destina apenas 0,38% para o setor.
Em 2.394.º lugar na tabela nacional do Índice de Desenvolvimento Humano dos Municípios (IDH-M) brasileiro, Quissamã surfa a onda do petróleo para alavancar o desenvolvimento e criar empregos.
O prefeito Armando Carneiro da Silva frisa que Quissamã é o único município da rica Bacia de Campos que não detona o orçamento da Cultura com megashows populares e trios elétricos para animar o verão em suas praias. Este ano, foram programados poucos e modestos shows, com artistas menos conhecidos.
Mas, em compensação, em junho, a Prefeitura entregará a casa da antiga Usina Quissamã – que começou a ser construída em 1826 e sofreu grande reforma em 1847 para receber o imperador Pedro 2.º – à visitação pública. A usina, principal produtora de empregos no município, fechou há três anos.
Já começou, também, a restauração do esplêndido conjunto de senzalas da Fazenda Machadinha, cuja casa grande foi construída entre 1863 e 1867 pelo Visconde de Ururaí, Manoel Carneiro da Silva, genro do Duque de Caxias.
A Prefeitura conseguiu desapropriar a casa, em péssimo estado de conservação, fez o escoramento e vai iluminá-la para observação pública. Mas as senzalas, as únicas habitadas no País, estão preservadas e serão restauradas sem que os moradores – a 6.ª geração dos escravos da fazenda – precisem sair.
Nelas, a restauradora Helena Fortes – do Museu Arthur Bernardes, da Universidade Federal de Viçosa, contratada pela Prefeitura – já encontrou pinturas murais feitas por escravos por baixo da argamassa. A capela da fazenda, de 1833, que estava infestada pelos cupins, também será restaurada. Atrás da sacristia, Helena encontrou dezenas de imagens antigas em gavetas, todas invadidas pelos cupins. Ela agora as está restaurando e classificando.
Antes, a Prefeitura ajudou a restaurar a magnífica casa da fazenda Matto de Pipa, a única construção de fins do século 18 (1777) em estilo bandeirista que continua de pé na região. Ela foi a casa-matriz da família do Visconde de Araruama, José Carneiro da Silva, o mais rico e influente fazendeiro da região e construtor do canal MacaéCampos, a maior obra civil do Império, que hoje pertence a uma associação civil.
O prefeito Carneiro da Silva, tataraneto do visconde, e que sucede na Prefeitura o seu tio Otávio Carneiro da Silva, diz que a seqüência dinástica cria um compromisso extra para a família que dominava Quissamã no Império e que hoje está preocupada em desenharlhe futuro. De fato, no último IDH-M, Quissamã destacou-se menos pela renda (como acontece com os municípios da Bacia de Campos) e mais pelos vetores longevidade (0,710) e, principalmente, Educação (0,845, um indicador de Primeiro Mundo).