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Projeto de cobrança pelo uso da água de rios em vias de votação em SP

A novela em torno da cobrança pelo uso da água dos rios no estado de São Paulo entra nos capítulos finais. Ao longo do ano, o empresário como um todo acompanhou atento a palestras, seminários e ao noticiário com respeito ao Projeto de Lei – PL – 676, do governo estadual, sem que houvesse um final – feliz ou não.

O documento relativo ao assunto, com toda a sistemática necessária, tramita há mais de um ano no Palácio 9 de Julho, sede da Assembléia Legislativa. Já foi exaustivamente discutido e, agora, pode enfim ser votado antes do recesso de meados de dezembro. O próprio governador Geraldo Alckmin, em entrevistas, tem insistido sobre a necessidade da aprovação do Projeto ainda neste ano.

A pressa do governador reeleito não é apenas para engrossar o caixa com os recursos financeiros resultantes da cobrança pelo uso da água dos rios, um dos temas mais polêmicos acerca do PL 676. Alckmin tem feito lobbies em favor da aprovação porque, se ela demorar, a gestão de cobrança pode ser empreendida pela Agência Nacional das Águas – ANA -, que pertence ao governo federal.

A ANA, que já desenvolve ações de cobrança pelo uso da água de rios federais como o Paraíba do Sul, no Vale do Paraíba, tem direito em também gerir outros federais como o Pardo e o Mogi, que cortam ou são vizinhos de Ribeirão Preto. Afinal, a Agência foi criada para regulamentar o setor.

Ocorre que a gestão dos rios “paulistas”, ou afluentes do Pardo e do Mogi, por exemplo, é encargo do governo estadual. O receio do chefe do Poder Executivo e de seu staff técnico é de que se demorar muito em apresentar um sistema de gestão, ele será absorvido pelos modelos já administrados pela ANA.

O engenheiro Celso Antonio Perticarrari participa do processo de gestão das águas dos rios paulistas desde que o assunto veio à tona, no final dos anos 80. Como diretor da Bacia do Pardo Grande do Departamento de Águas e Energia Elétrica – DAEE -, já manteve um sem número de reuniões com prefeitos, empresários e moradores sobre a necessidade de implantação do PL 676. Tem reservado parte de suas noites para palestras, também de conscientização. Na semana passada, esteve com técnicos da Usina Santo Antonio, em Sertãozinho, e com integrantes do Sindicato Rural de Guairá, no município paulista de mesmo nome.

Para ele, um estado avançado como São Paulo não pode mais ficar segurando a aprovação de uma lei. Sem ela, quem avançará será o governo federal e, se isso ocorrer, ficará difícil retomar as rédeas do controle da situação.

A gestão dos rios paulistas pela ANA, se feita pelos moldes já aplicados no Vale do Paraíba e em estados como o Ceará, pode afetar os consumidores industriais das águas porque, segundo Perticarrari, a lei federal não promove amarras, insere um “poderá” quando poderia ser mais incisiva. Além disso, ao contrário do Projeto Lei do governo paulista, não cria um fundo para gerenciar os recursos. “Pode significar que o dinheiro vá para os cofres públicos sem saber se ele será de fato aplicado em projetos hídricos”, observa.

Independente da origem do sistema, o grande mérito do projeto de cobrança pelo uso das águas, conforme o diretor do DAEE, não é o resultado de sua receita financeira. “Trata-se de um projeto inibidor, contra quem polui, direcionado para que os usuários passem a fazer uso racional da água”, diz. A busca desse resultado será por meio de pressões. Ou seja: quem polui os rios pagará mais caro pelo uso da H2O.

Os valores cobrados pelo consumo são um caso a parte. A ANA tem a intenção de criar agências específicas para essa finalidade. No caso do Projeto de Lei paulista, também estão previstas agências, mas para bacias chamadas de grande porte, que tenham acima de 25 municípios envolvidos. Nas bacias de menor porte, a gestão do sistema deverá ser feita pelo próprio DAEE, que já administra serviços de saneamento hídrico e de limpeza de rios, entre outros. A administração, contudo, será monitorada pelos comitês técnicos das bacias, formados por representantes do Poder Público e da sociedade civil.

Pelo estipulado na PL 676, o consumidor pagará no geral R$ 0,01 por cada um mil litros – ou um metro cúbico – de água consumida. Sendo assim, o usuário residencial deverá arcar com médios R$ 0,30 mensais. Oficialmente, o cálculo é o mesmo para as empresas, mas sem levar em conta o teor poluente que elas injetam nos rios. “Por meio de medições feitas pela Cetesb, chegaremos a um valor a ser cobrado por esses poluentes”, diz Perticarrari.

Os comitês das bacias, lembra, têm autonomia para, em sua área de abrangência, definir quem paga mais ou menos pelo uso da água. “Pode ocorrer de em Guaíra, onde a agricultura por irrigação é muito importante, serem implantados custos menores para não se sacrificar as culturas”. Legalmente, no entanto, o município tem prioridade no uso da água, muitas vezes empregada no abastecimento para a população.

Segundo ele, cada centavo recolhido pela taxa será reinvestido em favor dos próprios rios. Serão estações de tratamento de esgoto nas cidades e até mesmo projetos de eliminação de poluentes em empresas. “Poderemos agir como financiadores desses projetos”, observa.

Uma vez consolidados esses projetos, e reduzido sensivelmente o grau de poluição dos rios, o diretor do DAEE garante que o sistema de cobrança pelo uso da água pode ser simplesmente revogado.

O meio ambiente e a fauna paulista agradecerão se o PL do governo finalmente tornar-se lei.

O histórico da média de águas superficiais – rios, córregos, lagoas e minas d’água – diz que o estado de São Paulo tem média anual de 2,9 mil metros cúbicos. O montante é bom se comparado aos 2,5 mil metros cúbicos por ano de média mundial. Mas a diversidade do estado prejudica o equilíbrio.

Em regiões com adensamento populacional, a média cai abaixo da crítica. É o caso de municípios da Grande São Paulo, com médios 200 metros cúbicos ao ano. Na região próxima ao rio Pardo, a média é de 1,4 mil metros cúbicos anuais. “Ainda estamos bem, mas significa que a água está acabando, afetada pelos poluentes e esgotos domésticos”, alerta Perticarrari.

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