Primavera da Biomassa e do Biogás é uma consigna, inicialmente sugerida pelo especialista em bioenergia – Carlos Silvestrin, que passou a ser adotada por várias entidades do setor sucroenergético. O objetivo é aproveitar a chegada da estação do “verde e das flores”, para motivar a cadeia produtiva, o setor de energia e os responsáveis por políticas públicas a atentarem-se à necessidade de produzir mais bioeletricidade originada da biomassa e do biogás da vinhaça do etanol.
A época é a mais florida do ano também chega com um novo cenário político, mais propício à cultura canavieira. Entre outras ações, há sinalização do Ministério de Minas e Energia para a realização de leilão específico de energia da biomassa e do biogás da vinhaça – já no primeiro semestre de 2017.
Outro fato que anima o setor sucroenergético é a demanda que se abrirá nos próximos meses, em decorrência dos problemas de licenciamento ambiental, que congelaram a proposta do projeto da Usina Hidrelétrica São Luiz do Tapajós, no Pará, com capacidade instalada prevista de 8.000 MW.
Além disso existem outras usinas, que já venceram nos leilões, mas, também apresentam dificuldades em sua implantação, abrindo um vácuo a ser suprido com outras fontes de energia, no curto e médio prazo. É nesse vácuo que surgem novas oportunidades para a bioenergia sucroenergética, que se encaixa perfeitamente. Porque é de rápida implantação, está no Centro-Sul, próxima da demanda e das redes de distribuição existentes.
Para o biometano, originado do processamento do gás da vinhaça, a sua mistura com o gás natural, assim como sua comercialização já está regulamentada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). E a ARSESP também já regulamentou o uso do biometano para abastecer as redes locais de distribuição, cujo primeiro projeto já foi aprovado para ser implementado em nossa paulista Catanduva.
Além disso, o biometano é uma ótima opção para substituir o diesel da frota da usina, e inclusive, para quem quer usar o biometano, transportado de forma comprimida (GNC), para frotas de caminhões e consumo industrial, facilitando a distribuição em localidades ainda distantes do gasoduto, cujo contrato de suprimento do gás boliviano se expira em dezembro de 2019. Esse conjunto de fatores de decisão são as boas perspectivas que formam a Primavera da Biomassa e do Biogás.
Mas ainda é preciso avançar mais na formação do mercado de bioenergia, pois, a oferta já está pronta. São 1.400 agentes autorizados a vender, 181 comercializadores e 1.227 geradores. De janeiro a dezembro de 2015, segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), a bioeletricidade gerou um volume aproximadamente 9% superior para o Sistema Interligado em comparação com igual período em 2014.
Ainda de acordo com a CCEE, em agosto de 2015, a bioeletricidade bateu seu recorde histórico de geração mensal para a rede, chegando a representar 8% do consumo nacional de energia elétrica naquele mês. Em 2016, o valor acumulado de janeiro até julho mostra que a biomassa gerou 11.314 GWh, o equivalente a abastecer quase seis milhões de unidades consumidoras residenciais durante um ano inteiro.
Precisamos vencer os desafios que ainda atravancam a comercialização plena da bioenergia. O primeiro deles é a formação de preços consistentes, o que se consegue com transparência, sem surpresa e com isonomia entre os agentes. Além de derrubar o mito de que a referência de preços não existe – eles são divulgados por pelo menos três entidades diferentes.
É necessário permitir que os geradores de energia possam participar dessa venda, não apenas os que ofertam acima de 500 KW – das 330 mil indústrias no Brasil, apenas 15 mil participam do mercado livre. Isso inclui mais facilidade para o financiamento da expansão da oferta, facilitar garantias para acesso aos recursos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES).
O BNDES precisa confiar mais nos geradores de bioeletricidade e não aceitar apenas a garantia corporativa como segurança, mas também os recebíveis. É preciso ainda estender o prazo dos contratos em até 30 anos, longe dos quatro anos em média praticados atualmente. Isso geraria uma ampliação do mercado livre, que já conta com projetos de lei que a balizem e a regulem.
Iniciativas como o Projeto de Lei n.º 1917, que “dispõe sobre a portabilidade da conta de luz, as concessões de geração de energia elétrica e a comercialização de energia elétrica” recebeu parecer favorável em outubro de 2015. Mas desde novembro do ano passado não caminhou um passo sequer em seu trâmite da Câmara dos Deputados.
No Senado Federal, o Projeto de Lei n.º 232 também está parado, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), nas mãos do relator, o senador Tasso Jereissati. O Projeto “dispõe sobre o modelo comercial do setor elétrico, a portabilidade da conta de luz e as concessões de geração de energia”. É preciso uma retomada do processo de migração do mercado cativo para o mercado livre. Isso gera competitividade, renda, oportunidades, emprego.
Se todos os consumidores autorizados migrassem para o mercado livre, representariam 46% do total. Isso significaria uma redução de 21% no preço ao consumidor, uma economia de mais de R$ 42 bilhões ao ano.
O mercado precisa ser mais previsível, e isso depende do Governo Federal. Com a imprevisibilidade do clima o agricultor sabe lidar, o que ele não consegue é manejar uma variação como a do PLD (preço de energia a curto prazo), que já chegou a subir de R$ 15 para R$ 800 no mesmo ano.
O Executivo nacional não pode repetir o esconde-esconde de 2014, quando a candidatura à reeleição de Dilma Rousseff significou uma grossa maquiagem na realidade. Dilma segurou o reajuste da tarifa de energia elétrica para garantir votos, e isso significou um prejuízo aos cofres públicos na ordem de R$ 47 bilhões – seguido de um aumento de 90% na tarifa em 2015.
O próximo reajuste deste ano deve ser de 10% a 15%. Por isso é importante termos a opção de migrar para o mercado livre e não diminuir o consumo de energia – e consequentemente a produção industrial. A universalização no acesso ao mercado livre incentiva a atividade econômica porque oferece energia mais barata, tira peso das costas do empregador.
Tenho certeza de que o pujante setor canavieiro aproveitará as oportunidades que estão sendo abertas para a bioenergia, e como no período da primavera “florescerá mostrando” sua energia, para um novo ciclo de expansão do setor sucroenergético, na bem vinda “Primavera da Biomassa e do Biogás”.
Arnaldo Jardim é deputado federal licenciado (PPS-SP) e secretario de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo