O volume recorde de operações no mercado futuro de commodities agrícolas da Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F), em 2004, mostra que os empresários do agronegócio empregaram mais amplamente os instrumentos financeiros para proteger suas receitas contra flutuações de preço, como ocorreu com a soja e o milho. Estes instrumentos poderão ser, novamente em 2005, armas de proteção dos produtores que esperam colher safras recordes, mas não acompanhadas de preços favoráveis.
O agronegócio tem sido decisivo para sustentar o crescimento econômico e as exportações. Seu peso no PIB é estimado em 32%, com receita líquida superior a R$ 500 bilhões, além de ser responsável por 32 milhões de empregos, ou seja, 37% da População Economicamente Ativa (PEA). O superávit do agronegócio, da ordem de US$ 34 bilhões, é comparável a todo o superávit comercial do País, de US$ 33,7 bilhões, em 2004.
Será difícil, no entanto, repetir em 2005 os números excepcionais de 2004. As projeções oficiais apontam para um aumento da safra de grãos de 119 milhões, em 2004, para 132 milhões de toneladas, neste ano, mas se os preços poderão ser bons nos mercados de carne, açúcar e café, o mesmo não deverá ocorrer em culturas que apresentam superprodução, caso do arroz, algodão, soja, milho e trigo.
Cabe entender a importância dos mercados futuros. Eles constituem uma das formas – mas não a única – de proteção (hedge) para os produtores e os comercializadores de commodities agrícolas. É significativo, por isso, que nada menos do que 1,05 milhão de contratos de produtos agropecuários tenham sido negociados na BM&F, no ano passado, com crescimento de 34,9% sobre os 778 mil contratos negociados em 2003. No segmento onde é maior a negociação, o de contratos futuros de café, que representaram 64,2% das operações agrícolas da BM&F, foram movimentados o equivalente a 67,4 milhões de sacas, ou seja, o dobro da expectativa de produção de 33 milhões de sacas da safra 2005/2006. O número de contratos de boi gordo, que equivaleram a 4,5 milhões de cabeças e a 21,5% das operações, cresceu 97,5% entre 2003 e 2004.
Os mercados futuros permitem que os produtores assegurem um valor justo para sua produção, eliminando a volatilidade de preços. Mas muitos produtores ainda evitavam esses mercados. “A cultura de se negociar na Bolsa, até então uma barreira para a consolidação dos mercados agropecuários, foi superada”, acredita o presidente da BM&F, Manoel Felix Cintra Neto. “Nosso próximo desafio é reduzir o elevado custo do hedge, provocado por uma elevada carga fiscal”, declarou. Há incidência de PIS/Cofins sobre os contratos futuros não financeiros, como os de produtos agrícolas.
Após uma fase de lucros, os produtores terão de usar os novos instrumentos financeiros para se financiar ou proteger suas receitas. Dispõem, para isso, não apenas dos mercados futuros, mas também das Cédulas do Produto Rural (CPRs), já operadas, em larga escala, pelo Banco do Brasil, e, agora, por novos instrumentos: os Certificados de Depósitos Agropecuários, Warrants Agropecuários, Certificados de Direitos Creditórios do Agronegócio, Letras de Crédito do Agronegócio e Certificados de Recebíveis do Agronegócio. Foram cinco os novos instrumentos criados pela Lei 11.076, sancionada em 30 de dezembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, destinados a fortalecer a comercialização e impedir maiores quedas na renda agrícola. Como notou o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, os produtores devem evitar o alto endividamento, dando preferência aos novos papéis para obter recursos.
O Brasil tem batido sucessivos recordes na produção e na produtividade agrícolas. Nos últimos quatro anos, enquanto a produção mundial de algodão aumentou 20,6%, cresceu 42,5%, no País; no trigo, os porcentuais foram de 8,2%, no mundo, e 77,5%, no Brasil; e na soja, respectivamente, os acréscimos foram de 23,2% e de 32,1%, como enfatizou Roberto Rodrigues. Mas, em 2005, as condições são menos favoráveis, pois, além da superprodução e dos preços internacionais menores, há a desvalorização do dólar.
Para preservar o ritmo de crescimento da produção e continuar abrindo espaço no mercado internacional, o agronegócio terá de sacrificar margens. Algum sacrifício poderá ser essencial para que o País não comprometa sua liderança no comércio global de commodities agrícolas.