Mercado

Para analistas, queda da Selic não influenciou revisão do IPCA de 2011

O corte de meio ponto percentual na taxa Selic foi determinante para o mercado aumentar suas projeções para o IPCA de 2012, mas teve pouca influência sobre as expectativas para o indicador deste ano, concordam analistas consultados pelo Valor. Para eles, pesaram mais fatores pontuais para revisar para cima suas previsões de médio prazo, como o imposto do cigarro e o mercado de trabalho forte, que chancela repasses em serviços.

O Boletim Focus desta segunda-feira mostra que o mercado financeiro ampliou pela terceira semana consecutiva suas projeções para o IPCA de 2011, cuja mediana atingiu 6,38%. O relatório também mostra piora nas expectativas para a inflação no ano que vem, com os analistas prevendo IPCA em 5,32% no fim de 2012, contra previsão de 5,2% na semana anterior.

“Temos elementos estruturais de pressão inflacionária no curto e no médio prazo, sendo que o principal deles é essa taxa de desemprego muito baixa”, analisa Flávio Combat, economista-chefe da Corretora Concórdia. “Temos reajustes de categorias importantes ao longo do segundo semestre, ou seja, vários indicadores ratificando que teremos pressão de demanda maior na passagem de 2011 para 2012”, diz o economista, que após a surpresa com a última reunião do Copom revisou as projeções da Concórdia.

Para Combat, o IPCA deve encerrar o ano com alta acumulada de 6,3%. Antes, projetava 6,1%. Já para o ano que vem, a expectativa aumentou de 5% para 5,4%. “Já vínhamos trabalhando com um cenário de inflação mais pressionada, supondo que o Copom fosse interromper o ciclo de alta nos juros, mas não fosse reduzir a Selic abruptamente como ele fez”, comenta o analista. “Então consideramos que o cenário inflacionário vai demonstrar mais e mais pressão no curto e no médio prazo.”

Na opinião de Thiago Curado, da Tendências Consultoria Integrada, a surpresa com a Selic foi o principal determinante para a deterioração das expectativas de 2012, mas não de 2011. “Acredito que essa piora resulta quase integralmente da incorporação da notícia da alteração tributária do cigarro, que pelas nossas contas tem impacto de 0,2% no IPCA deste ano”, diz. A Tendências, no entanto, não alterou sua previsão – já era uma das mais pessimistas do mercado – de IPCA em 6,6% no fim do ano. “Acabamos mantendo os 6,6% porque entendemos que essa questão aumentou bastante a probabilidade do nosso cenário”.

Se as previsões de curto prazo da Tendências não sofreram alteração, as de longo prazo fatalmente serão revisadas para cima, afirma Curado. Em sua avaliação, ao cortar a Selic para 12% ao ano o Banco Central passa a mensagem de que o regime de metas não é mais uma prioridade da política monetária, o que compromete a capacidade de atingir o centro da meta de inflação, de 4,5%, não só em 2012, mas também nos dois anos seguintes. A projeção de IPCA da Tendências para o ano que vem saltou de 5,2% para 6% após a queda da taxa básica de juros, e as previsões de 2013 e 2014, que contavam com IPCA no centro da meta, devem ser alteradas para algo em torno de 5,5%.

Curado também lembra que, além do cigarro, outros fatores terão pressão extra sobre o índice oficial de inflação em 2011, como a menor produção de etanol e o aumento nos preços dos alimentos. “As carnes bovinas têm peso bastante elevado no IPCA e tudo indica que teremos uma alta no período de entressafra em outubro e novembro, e além disso os dados da produção de etanol são bastante ruins”. Os serviços, que giram na casa dos 9% em 12 meses, também continuarão incomodando, segundo ele.

O economista-chefe da Máxima Asset Manegement, Elson Teles, concorda com as preocupações do analista da Tendências. “O Copom pode ter tido uma contribuição para piora das expectativas no Focus, mas também temos a ideia de que a inflação vai ficar mais alta do que imaginávamos neste ano com a questão do etanol, dos alimentos e do reajuste do cigarro, que não estava na conta”.

Teles aumentou em 0,1 ponto percentual sua previsão de IPCA para este ano, para 6,5%, “com algum perigo” de estourar o teto da meta, em função das informações anteriores ao Copom, e a de 2012 foi alterada de 5,5% para 5,7%, com viés de alta, devido à queda na Selic. “É possível que a inflação fique mais alta com o Banco Central mais tolerante à inflação”, afirma.

(Arícia Martins | Valor)