Energia limpa e sustentabilidade ambiental passam a ser temas de suma importância. O mercado de crédito de carbono ganha espaço cada vez maior na agenda das empresas brasileiras que buscam investir em energia limpa e na sustentabilidade ambiental, sobretudo com a entrada em vigor, no ano passado, do Protocolo de Kyoto, tratado internacional que visa regularizar a emissão de poluentes nos principais países industrializados do planeta para uma média anual de cerca de 5%.
O protocolo prevê o que se convencionou chamar de mecanismos de desenvolvimento limpo (MDLs), que incentivam o desenvolvimento de projetos em países em desenvolvimento para reduzir o lançamento à atmosfera dos gases que provocam o efeito estufa. O mercado de carbono movimenta atualmente, em todo o mundo, cerca de US$ 10 bilhões – a tonelada do carbono varia de 15 a 25 euros. O Brasil possui vários projetos nesse sentido e disputa investimentos com países como China, Índia e México.
Em vista das oportunidades de geração de negócios que se vislumbram nessa área por conta da iminente implementação dos MDLs, a Câmara Britânica de Comércio e Indústria do Brasil (Britcham) realiza hoje e amanhã, no Auditório do Centro Britânico, o seminário “Desenvolvimento sustentável e oportunidades para o crédito de carbono no Brasil”, cujo objetivo é mostrar como as empresas podem fazer da sustentabilidade um diferencial competitivo e lucrar com o mercado de crédito de carbono.
No primeiro dia do evento serão discutidos temas relacionados ao desenvolvimento sustentável em seus aspectos corporativos, ambientais, sociais e econômicos. Haverá ainda um bloco dedicado à visão dos investidores e do mercado financeiro sobre o tema, abordando inclusive os instrumentos aptos a veicular o comportamento das empresas no que se refere a práticas de sustentabilidade a clientes, fornecedores, funcionários e investidores.
Segundo a coordenadora do Comitê de Meio Ambiente da Britcham, Adriana Baptista, também advogada e sócia do escritório Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados, não há mais espaço para empresas que não se envolvam no assunto. “Sustentabilidade não é um conceito exclusivamente voltado às questões socioambientais; ao contrário, o conceito é abrangente e diz respeito a novas formas de se fazer negócios, em que se busca maior competitividade a partir de ações e práticas de governança corporativa e medidas que valorizem a inclusão social, a redução dos impactos ambientais e um contato integral e transparente com os diversos públicos de uma empresa”, completa.
O segundo dia do seminário será reservado ao tema mercado de créditos de carbono, com análise da situação atual do MDL tanto no Brasil quanto em outros países. Serão apresentadas também as opções de financiamento existentes no mercado para quem se interessa na estruturação de projetos de desenvolvimento sustentável, aspectos corporativos e ambientais.
Entre os participantes do seminário estará o secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, José Goldemberg, que informa que o Brasil é o terceiro país em número de projetos de MDL apresentados e que há considerável número de empresas trabalhando na identificação de novos projetos. De acordo com ele, “grande parte dos projetos de MDL está no setor industrial, que infelizmente é menor que na Índia e na China, limitando nossa participação”.
Em relação à área de energia elétrica, Goldemberg assinala que “nossa intensidade de carbono associada a cada MWh de eletricidade economizada é menor que na Índia, na China e muitos países porque nossas usinas são em grande parte movidas por fontes renováveis (hidroelétricas)”. O secretário revela ainda que na área de biocombustíveis o álcool não se qualifica como projeto MDL porque foi implantado há muito tempo e o biodiesel também terá limitações em razão de boa parte do insumo ser utilizada de forma compulsória. Isso impede sua qualificação como projeto de MDL.
Goldemberg acredita, no entanto, que, apesar de todos essas dificuldades, há grande interesse por projetos ambientalmente saudáveis não apenas pelos lucros econômicos do crédito de carbono, mas por prestigiar a imagem das empresas que os implementam. Por isso, há boas perspectivas para a atividade no Brasil.
Segundo o secretário, as vantagens principais para as empresas que participarem do crédito de carbono são: 1) maior facilidade em obter financiamento para os projetos de MDL, pois já passaram por uma análise profunda de suas características e do retorno econômico feito pelo sistema MDL de aprovação de projetos; 2) melhor imagem da empresa-hóspede do projeto por colaborar com a melhoria do meio ambiente; 3) melhor divulgação da empresa-hóspede no âmbito mundial, com possibilidade de encontrar parceiros para seu empreendimento. No caso de empresa exportadora para países ricos, a boa imagem pode ajudar no incremento dos negócios.
Grande parte da legislação sobre emissões nocivas ao meio ambiente e saúde pública diz respeito aos agentes poluidores locais. “O crédito de carbono é, no Brasil, o único mecanismo oficial que pode reduzir as emissões de gases de efeito estufa, seguido das ações voluntárias. Dessa forma, entendemos que sem o crédito de carbono o esforço para controlar as emissões de gases de efeito estufa seria muito menor e exigiria o estabelecimento de regulamentação nacional, que tem tido pouco sucesso em muitos países, à exceção da União Européia”, esclarece Goldemberg.
O secretário observa que as grandes empresas em geral têm noção da importância de investir no mercado de crédito de carbono, produzindo energia limpa, acrescentando que os produtores de energia mais limpa são principalmente as concessionárias de eletricidade e os fabricantes de derivados de petróleo, “um espectro pequeno de grandes empresas; já os grandes usuários de energia constituem um grupo bem maior de empresas. Na prática, as concessionárias já demonstram algum interesse por energia renovável, mas, por serem muito grandes, ainda há conflitos internos de interesse e de informação”.
Nota-se maior interesse por parte dos usuários de energia e vários projetos já foram qualificados como MDL. “Enquadram-se nessa categoria as usinas de cana-de-açúcar que, em princípio, são usuárias de energia, mas têm gerado acima de suas demandas a eletricidade limpa, vendendo os excedentes para a rede”, completa.
Quanto à não-adesão dos Estados Unidos ao Protocolo de Kyoto, Goldemberg afirma que isso não retardará sua aplicabilidade, pois o protocolo terá validade até 2012, mas que se trata de fator importante de redução do tamanho do mercado: isso prejudica os países em desenvolvimento, os quais poderiam identificar mais projetos de redução de emissões de gases de efeito estufa se o preço da tonelada de CO2 fosse maior.
A recusa americana de participar do controle dessas emissões, entretanto, é considerada pelo secretário como ponto crítico. “Não acreditamos que países em desenvolvimento que têm sido solicitados a reduzir de forma obrigatória sua emissões aceitem essa condição após 2012 se não houver empenho igual ou maior dos Estados Unidos”, conclui.
O seminário contará ainda com a presença de representantes da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Instituto Ethos, PricewaterhouseCoopers e Ecoinvest Assessoria, além de diretores e advogados da Sadia, da Energy International Corporation e da divisão de mercados de carbono da ABN Amro Bank.
kicker: O mercado de carbono movimenta hoje, em todo o mundo, cerca de US$ 10 bilhões – a tonelada do carbono varia de 15 a 25 euros
kicker2: O Brasil possui vários projetos nesse sentido e disputa investimentos com países em desenvolvimento como China, Índia e México