Mercado

Nem a banana a Europa aceita

A Organização Mundial do Comércio (OMC) aceitou o questionamento de oito países latino-americanos mais o Brasil contra a nova tarifa proposta pela União Européia (UE) para a importação de bananas desses países. Há anos, decisões de Bruxelas discriminam os produtores latinos, limitando exportações à quantia definida (2,5 milhão de toneladas), apesar da expansão do mercado consumidor. A medida beneficiava os países da África e do Caribe, que, aliás, já contavam com preferências tarifárias.

A reclamação dos latinos fez com que a OMC condenasse os europeus. Estes aceitaram a decisão de não impor tais limites às importações latino-americanas, mas definiram que a partir de 1 de janeiro as bananas latinas seriam tarifadas em 230 euros por tonelada. Foi essa tarifa que a OMC condenou, dando prazo para que os europeus iniciassem consulta com os exportadores latinos para um “acordo”.

Apesar do tom conciliatório da OMC, a comissária de Agricultura da UE, Mariann Fisher-Boel, resistiu: “Estamos avaliando as opções existentes para pôr em prática o novo regime de importação para bananas”.

Esse quadro de notória má vontade dos países desenvolvidos em abrir mercado não é privilégio dos europeus. O Congresso americano aprovou por dois votos o Acordo de Livre Comércio da América Central (Cafta). O lobby do açúcar foi especialmente incisivo para frear qualquer aumento de exportações do produto embutidas nos acordos iniciais do Cafta, para que não cheguem a 140 mil toneladas, representando 1,2% do mercado americano.

Mesmo sem essa concessão, os seis países (que juntos formam um PIB regional de US$ 202 bilhões) foram obrigados a desmontar o sistema tarifário para importação de automóveis, alimentos e madeira. Não conseguiram também o benefício que pleiteavam em relação à entrada de têxteis no mercado americano. Nesse caso, a tarifa só diminui se forem utilizadas matérias-primas dos EUA. Apesar de todas essas garantias, apesar de pequena dimensão das economias latinas envolvidas, a resistência no Congresso foi imensa. Os sindicatos pressionaram os democratas com ameaças de corte de apoio nas próximas eleições, caso votassem o Cafta.

Com esse clima de acesa aversão ao livre comércio no âmbito interno, os Estados Unidos e a União Européia participam das reuniões preparatórias para a Conferência de Hong Cong. Os países mais pobres, acompanhados da China, Índia e Brasil, exigem concessões nas negociações agrícolas, sem as quais nada avançará.

Como notou o ex-embaixador brasileiro em Washington Rubens Barbosa, a política comercial americana passa por momento de grande dificuldade, pelo aumento do poder de pressão dos grupos conservadores assustados com os 12 acordos comerciais de livre comércio já votados e com os outros 12 em negociação. Essa intensa pressão interna, como observou o ex-embaixador Barbosa, está provocando “falta de clareza negociadora externa” do governo americano.

Em outras palavras, a rota do livre comércio no mundo está repleta de barreiras. A agonia da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) está incluída nesse quadro. Os EUA agem a partir dessa constatação e fecham acordos bilaterais com quem lhes interessa, Chile e Uruguai, por exemplo, desde que aceitem cláusulas semelhantes às impostas no Cafta. Peru, Colômbia e Equador, por diferentes motivos, abriram negociações nessa mesma linha.

A diplomacia brasileira segue outro caminho. Avisou os EUA que a formação da Alca fica para 2009. Aproxima-se dos vizinhos com investimentos significativos. Só o BNDES tem 20 empreendimentos em projetos de infra-estrutura na região para “integração física”, para contrabalançar o avassalador poder americano. É esse o caminho. Sem afrontas aos Estados Unidos, nosso maior mercado consumidor de exportações com valor agregado, defendemos nossos interesses. Os americanos não se preocupam com isso. Aliás, respeitam quem o faz.