O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, na reunião do Fórum Econômico Mundial na América Latina, que político latino-americano gosta é de construir ponte para botar o nome da família. Eles acham que enterrar manilha para saneamento básico não dá voto, acrescentou. Nenhum político, ministro ou ex-ministro latinoamericano reagiu, embora houvesse vários no auditório. Lula discursou durante 50 minutos e levou mais 33 para responder a quatro ou cinco perguntas.
Dirigindo-se ao presidente do Banco Interamericano do Desenvolvimento, Luís Moreno, afirmou que reunião do BID só tem discurso político e gostaria de ver uma reunião em que cada participante falasse de seus programas de inclusão social. Moreno permaneceu impassível.
O presidente Lula recordou que em novembro do ano passado constrangeu o colega americano, George Bush, a comer um churrasco em Brasília, depois do surgimento de focos de aftosa em Mato Grosso do Sul. Uma semana depois, acrescentou, o presidente americano telefonou: Ainda não terminei a digestão, teria dito Bush.
Além de fazer o presidente americano comer churrasco, Lula ofereceu manga ao primeiro-ministro japonês, Junichiro Koizumi. Fez isso para convencê-lo de que não havia mais o problema da doença da fruta.
Pouco depois o Brasil começou a vender manga para o Japão.
Koizumi, segundo explicou Lula, só conhecia a literatura sobre fruticultura brasileira de 20 anos atrás.
Além de falar sobre os problemas digestivos e culturais de outros chefes de governo, o presidente Lula enumerou as mudanças econômicas e sociais promovidas em sua gestão. Antes dele, a saúde pública tratava de unha encravada, informou, mas não dos dentes dos pobres. Estamos criando, acrescentou, 400 centros de saúde bucal para que cada criança de periferia possa colocar o mesmo aparelho que o presidente do BID bota no seu filho.
A popularização do computador tem sido, segundo o presidente, uma dessas mudanças.
As indústrias de informática, assegurou, podem investir tranqüilamente no Brasil porque terão mercado. Agora, ter computador é uma grande aspiração, assim como havia sido, na sua juventude, ter um Fuscão 1.600. Ao lembrar essa velha aspiração, voltou-se para o empresário Jorge Gerdau e invocou seu testemunho.
Alguns ouvintes manifestaram, discretamente, o desejo de saber se o industrial teria sonhado, em algum momento, com um Fuscão 1.600.
Ao falar em informática, o presidente lembrou do contrabando e afirmou que esse mercado chegou a englobar 70% dos computadores. Vamos baixar para 50%, prometeu, procurando tranqüilizar os investidores do setor.
Gerdau não falou sobre o sonho juvenil de ter um Fuscão, mas perguntou ao presidente Lula sobre as perspectivas de redução de impostos. Não é o meu governo que tem culpa da carga tributária que está aí, disse o presidente, embora o peso da tributação tenha aumentado de cerca de 35% em 2002 para 38% do PIB em 2005. Como se pressentisse essa objeção, Lula explicou que no Brasil se fala em aumento da carga tributária – impropriamente, segundo deu a entender -quando a arrecadação cresce mais que o Produto Interno Bruto (PIB). O presidente rejeita, portanto, a definição corrente de carga tributária.
A integração sul-americana foi um dos assuntos mais explorados em seu pronunciamento. A maior cooperação entre os países da região será essencial, segundo ele, para que todos se desenvolvam e possam negociar em melhores condições com os parceiros do mundo rico. Assim seremos competitivos, continuou, e teremos o direito de exigir nas mesas de negociação aquilo de que precisamos, não porque somos pobres, mas porque somos iguais a eles. O presidente não explicou por que países menos competitivos não têm o direito de exigir melhores condições de comércio.
Ainda sobre política comercial, Lula explicou por que o Brasil atribuiu à China o status de economia de mercado: foi para pôr a China na OMC (Organização Mundial do Comércio) e na mesa para discutir.
Estados Unidos e União Européia não fizeram essa concessão e, no entanto, conseguiram dos chineses, antes do Brasil, o compromisso de autolimitação de exportações de têxteis. Lula não discutiu esse detalhe.
Lula citou, no discurso e nas respostas, números conhecidos do desempenho econômico do Brasil, mencionou a redução da vulnerabilidade externa e lembrou que o País pagou adiantado o que devia ao Fundo Monetário Internacional (FMI).
Disse também que a auto-suficiência em petróleo será alcançada em 21 de abril e neste ano o País terá um superávit de US$ 3 bilhões no comércio externo de combustíveis e lubrificantes.
Reafirmou o compromisso com a estabilidade, prometeu que os juros continuarão a cair suavemente, sem mágica, e repetiu que o câmbio continuará flutuante, apesar das pressões de empresários que lhe pedem uma desvalorização do real por decreto. Não vamos permitir que volte a inflação, garantiu, acrescentando que os pobres são os mais prejudicados pela alta de preços.
Quanto às parcerias públicoprivadas para obras de infra-estrutura, devem deslanchar nos próximos anos. Em ano de eleição, justificou, há muito nervosismo.
Lula explicou aos representantes do Fórum que não pôde ir à reunião anual de Davos, em janeiro, mas disse que espera voltar em 2007 para falar sobre o que ocorreu no Brasil durante estes quatro anos. Vou como presidente ou sem ser presidente, ressalvou.