O presidente Luiz Inácio Lula da Silva começa a descobrir o mundo. Com um pouco de sorte, isso poderá resultar numa nova diplomacia econômica, menos fantasiosa e mais voltada para os interesses objetivos de um país emergente com uma ampla base industrial, um agronegócio dos mais competitivos – por enquanto – e um grande atraso na inserção internacional. A atuação brasileira na reunião de cúpula da Ilha Margarita, na Venezuela, foi, pelo menos, animadora. Pela primeira vez, Lula e seus ministros disseram não, com razoável firmeza, às pretensões mais inaceitáveis dos bons companheiros sul-americanos. Se não o fizessem, o Brasil se arriscaria a embarcar em pelo menos duas aventuras absurdas: a formação de um cartel do gás e a criação de um banco destinado, segundo alguns defensores da idéia, a cumprir na região, com ternura e paciência de mãe, a função do Fundo Monetário Internacional. A maior contribuição para o capital do banco seria, naturalmente, a do Brasil. A idéia, formulada há meses, só se manteve na agenda porque o governo brasileiro não se dispôs a liquidá-la imediatamente. Ainda não a liquidou, mas chegou perto disso. É preciso, disse o presidente Lula na reunião, definir o objetivo do banco. É uma boa observação, apesar de óbvia. Mas é necessário responder a uma pergunta preliminar: a região precisa de uma nova instituição de crédito para competir com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, com o Banco Mundial e com a Corporação Andina de Fomento? Não pode haver dúvida. A resposta é não. Toda a conferência foi montada para atender às ambições do presidente venezuelano Hugo Chávez e a interesses de alguns de seus principais aliados, como os presidentes da Bolívia, Evo Morales, do Equador, Rafael Correa, e da Argentina, Néstor Kirchner. Até os estrategistas de Brasília parecem ter percebido essa obviedade e resolveram, finalmente, reagir e cobrar algum respeito aos interesses nacionais e ao direito brasileiro de levar adiante um programa de produção de etanol e de biodiesel – contestado sem a mínima cerimônia por Chávez, Fidel Castro e companhia. Ao defender o programa, o assessor do presidente para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, também fez um comentário notável: Ninguém deixa de comer no mundo por falta de alimento, mas por falta de renda. A produção é hoje suficiente para atender a 12 bilhões de pessoas, o dobro da população mundial. Qualquer pessoa medianamente informada sobre agricultura sabe disso há muito tempo, mas o governo brasileiro agia como se não soubesse. Mais que isso: pode haver escassez de alimentos em algumas áreas muito pobres, principalmente na África, mas não no Brasil. No entanto, ainda se fala em fome e em questão agrária, em Brasília, como se houvesse no País um problema de produção e como se os pobres dependessem, para comer, de um pedaço de terra para plantar. Que tal mudar o enfoque e discutir seriamente, para variar, políticas de investimento, de geração de empregos e de formação de mão-de-obra? O Brasil pode produzir toda a comida necessária a seu povo e ainda exportar, como tem exportado, grandes volumes de alimentos. Objetivamente, não é de seu interesse, na rodada global de negociações comerciais, a multiplicação de listas de produtos especiais para proteção de pequenos agricultores de baixa eficiência. Os governos da Índia, da Indonésia e de outros países com agriculturas menos competitivas têm insistido nesse ponto. O próprio governo brasileiro aceitou entrar na dança. Na conferência ministerial de Hong Kong, em 2005, chegou-se a apresentar, por insistência do pessoal do Ministério do Desenvolvimento Agrário, uma relação brasileira dos tais produtos especiais. É um bom exemplo da capacidade brasileira de dar tiros no pé. Nesta semana, os governos da China e da Índia resolveram rodar a baiana em Genebra, na sede da Organização Mundial do Comércio, e defender com toda clareza o direito de manter barreiras protecionistas para a agricultura. Formalmente, a exigência é apresentada como resposta às pretensões dos Estados Unidos e da União Européia. Mas o Brasil é inevitavelmente afetado por essa manobra. China e Índia são membros do Grupo dos 20, criado por iniciativa brasileira para cobrar do mundo rico a liberalização do comércio agrícola. Dois dos sócios mais importantes do grupo, agora, decidem sustentar um jogo diretamente contrário a esse objetivo. É mais uma aliança estratégica que se volta contra o Brasil. Também essa pode ser uma lição instrutiva para Brasília, se o realismo exibido na Ilha Margarita não for apenas um surto passageiro.
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