A atual conjuntura do mercado de álcool carburante lembra a crise do final da década de 80. Como hoje, naquela época o consumo interno havia aumentado bastante. E como o preço do açúcar no mercado internacional também atingia níveis recordes, os usineiros, que mal abasteciam os postos, passaram a privilegiar a produção do açúcar. E assim geraram uma crise de abastecimento cujo desfecho foi a desmoralização do carro a álcool — e deles próprios.
Felizmente, aquela crise é uma tênue lembrança, e apesar das semelhanças com o momento atual, não deverá se repetir. Tudo, porém, está nas mãos dos agentes envolvidos com o negócio: usineiros, distribuidoras e governo. Uma grande vantagem atual é que os saltos que tem dado o consumo interno do combustível (só no Rio, 64% de crescimento) se devem à aceitação crescente dos veículos de tecnologia bicombustível. Que podem ser abastecidos com gasolina, protegendo o consumidor de altas desmedidas no preço do álcool.
Quanto aos usineiros, espera-se que tenham aprendido com a crise da década de 80 que é essencial preservar clientes, apesar do preço do açúcar no mercado mundial ser tentador: subiu 35% no ano passado e prevê-se mais 65% neste ano.
Há algum tempo o setor está numa fase de modernização gerencial. Agora é hora de demonstrar que o novo empresariado do ramo nada tem a ver com a figura clássica do usineiro, eterno dependente de dinheiro público, constante inquilino inadimplente dos cofres do Banco do Brasil. Ao governo — como a todos — aconselha-se que respeite o mercado. O segmento sucroalcooleiro está na entressafra e seria inevitável a remarcação dos preços. Intervir para taxar exportações será erro crasso, por transmitir insegurança ao mercado internacional, agora que o mundo descobre a importância do álcool carburante.
Como a conta da entressafra não pode ser escamoteada, a redução da adição do álcool à gasolina implicará o encarecimento deste combustível. Há a alternativa da redução da Cide sobre a gasolina (R$ 0,50 por litro) e de outros impostos. Mas sem qualquer medida heróica. Agora, é tratar de criar um sistema de mercado de formação de estoques para serem consumidos no ciclo anual de escassez. E, como sempre, aprender alguma lição na crise.