A redução do piso da banda de mistura de anidro na gasolina de 20% para 18% e a passagem do etanol para o controle da Agência Nacional de Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) podem levar a uma retração de novos investimentos no setor sucroalcooleiro, justamente em um momento no qual há necessidade de aportes de até US$ 60 bilhões nos próximos seis anos para que o setor cruze a barreira da produção de 1 bilhão de toneladas de cana-de-açúcar por ano e seja capaz de abastecer os mercados interno e externo com açúcar e etanol, que seguem em crescimento.
O grande receio do setor é de que falte critérios para se efetivar medidas como a redução do anidro na gasolina para 18% ou mesmo na implementação de outras ações cogitadas como a taxação das exportações de açúcar do Brasil. Teme-se a volta de um comportamento como registrado pelo Instituto do Açúcar e do Álcool ( IAA), entidade que regulava o mercado com distribuição de cotas de produção e exportação e cuja extinção, em 1990, desregulamentou o setor, permitindo que o Brasil se transformasse no principal exportador de açúcar do mundo.
“O sentimento de que o governo brasileiro pode intervir no setor e mudar as regras definidas anteriormente não é nenhum cartão de visitas para atrair novos investimentos”, afirma o economista Plínio Nastari, presidente da Datagro Consultoria, especializada no setor sucroalcooleiro. O executivo afirma que qualquer mudança de regras gera incertezas, assim como ameaças de colocar obstáculos para exportação.
“Tudo isso pode afugentar investidores interessados em produzir cana no Brasil”, explica.
OBSTÁCULOS. Para o sócio da Expressão Consultoria e expresidente da União da Indústria de cana-de-açúcar (Unica), Eduardo Carvalho, a falta de critérios para se mudar regras pode ser um importante ob stáculo para que os investimentos voltem ao setor sucroalcooleiro. “O Brasil precisa crescer 400 milhões de toneladas em seis anos mas quem vai querer investir aqui sem ter segurança de que os critérios acordados no momento do aporte de recursos serão mantidos?”, questiona.
Carvalho afirma que é indispensável que o setor tenha um mecanismo que garanta a oferta de etanol, mas este instrumento precisa ser aplicado de forma responsável e não como ameaça em um momento onde a redução de oferta de etanol se deu exatamente por redução de investimentos em cana seguido por problemas climáticos durante duas safras consecutivas.
“Dependendo de como estas medidas sejam regulamentadas, elas poderão assustar ou não os investidores”, disse.
Segundo Alexandre Figliolino, diretor do Banco Itaú BBA, em termos de saúde financeira, dois terços das empresas do setor sucroalcooleiro já estão preparadas para crescer. “Basta receber o estímulo certo”, disse. O executivo afirma que o negócio de açúcar e etanol precisa de um elevado nível de investimento para aumentar sua capacidade produtiva, que chega a US$ 150 por tonelada em novos greenfields. “É necessário uma maior margem de segurança de que o retorno deste investimento seja garantido para que ele ocorra” , explica.
Segundo ele, a volta de investimentos no setor está ligada a um cenário de menos incertezas e maior segurança.
Carvalho ressalta também o fato do preço do etanol estar sendo comparado ao da gasolina, que está sendo mantido estável pela Petrobras há mais de cinco anos, o que também não é um sinal positivo para novos investidores.
AGÊNCIA. Já a colocação da produção de etanol sob o controle da ANP está sendo vista de forma mais positiva.
Para o sócio de agribusiness da PricewaterhouseCoopers, a expectativa é de que a ANP regule a formação de estoques de etanol do seto r, por exemplo, evitando que ocorram solavancos na oferta, como ocorreu na última entressafra.
“Nem toda regulação é negativa. A ANP poderá melhorar a gestão na produção de biocombustíveis, o que é positivo para a realização de novos investimentos”, afirmou.
O executivo disse que as modificações de curto prazo tendem a ser transitórias e não devem afetam o apetite dos investidores. “O investidor internacional, por exemplo, já percebeu que o Brasil não é a Venezuela”, disse.
Segundo o diretor da DGF Investimentos, Humberto Casagrande, a ANP vai dar ao etanol uma condição fundamental para atrair investimentos que é a previsibilidade.
“Existem inúmeros greenfields que ficaram no meio do caminho por conta da crise financeira e estes projetos podem ser recompostos a partir de agora”, disse.
Segundo ele, o setor espera que a ANP entenda o ciclo produtivo da cana e de sua sazonalidade. “Entendemos que a ANP deve agir com rigor coibindo abusos e também a informalidade mas também que tenha entendimento de que o etanol é também um produto agrícola que depende de clima, de chuvas, e que pode ser afetado por estes fatores”, explica. A DGF Investimentos possui participação em dois grupos sucroalcooleiros do Centro-Sul.