Mercado

Governo desvia dinheiro de imposto para cobrir custos de distribuidoras de energia

O Congresso Nacional aprovou e o Presidente sancionou a Lei nº 10.438, de 26 de Abril de 2002 , que entre outras coisas cria o PROINFRA – Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica. Como bem diz a Lei no seu artigo 3º, o PROINFRA tem o objetivo de financiar a implantação de 3.300 MW com a utilização de gás natural, biomassa, energia eólica, Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH) e carvão mineral nacional, com início de produção até dezembro de 2006.

O PROINFRA vem em boa hora e tem o objetivo de ser um grande alavancador para o investimento nos recursos renováveis, o que nos habilitará à receita adicional oriunda dos créditos de carbono previstos no Protocolo de Kyoto, que envolverão somas acima de US$2,5 bilhões anuais, onde o Brasil sozinho, pode ter uma participação em torno de no mínimo de US$300 milhões. Soma-se a isso que o PROINFRA está calcado em fontes renováveis (com exceção do GN) e portanto geradoras intensivas de mão-de-obra.

De acordo ao art. 13, §1º da referida Lei, os recursos para o PROINFRA serão oriundos da CDE – Conta de Desenvolvimento Enérgico. No parágrafo 4º diz que: “A nenhuma das fontes eólica, biomassa, pequenas centrais hidrelétricas, gás natural e carvão mineral nacional, poderão ser destinados anualmente recursos cujo valor total ultrapasse a 30% (trinta por cento) do recolhimento anual da CDE, condicionando-se o enquadramento de projetos e contratos à prévia verificação, junto à Eletrobrás, de disponibilidade de recursos.” Ou seja, a origem e a limitação de recursos para o PROINFRA estão claramente detalhados na Lei.

Entretanto, devido à implementação da “Subclasse Residencial Baixa Renda”, onde está enquadrado o consumidor que segundo o art. 1º, parág. 1º da Lei citada anteriormente é aquele “…. atendido por circuito monofásico, tenha consumo mensal inferior a 80 kWh/mês ou cujo consumo situe-se entre 80 e 220 kWh/mês…”, as Empresas Distribuidoras de energia fizeram uma gritaria alegando que com a implementação desta Lei, elas teriam perdas milionárias. Ou seja, uma vez mais, as Distribuidoras jogaram o problema nas mãos do Governo Federal, como se já não bastasse o que estamos pagando pelas tarifas, aí embutida a reposição das perdas pelo racionamento no valor de R$7,3 bilhões, somado ao “seguro-apagão” que vem escamoteado nas contas mensais como “encargo de capacidade emergencial”.

Diante da pressão, o Governo Federal, como sempre, cedeu e editou a Medida Provisória 64 de 26 de Agosto do corrente ano que entre outras coisas trata do assunto do subsídio da tarifa popular. Esta MP está criando uma tremenda confusão e o Governo está recebendo inúmeras críticas. Por quê? Lendo o texto da MP, lá encontramos escrito no Art. 9o: “Os recursos da Conta de Desenvolvimento Energético – CDE, instituída pela Lei no 10.438, de 2002, poderão ser destinados ao atendimento de consumidores integrantes da Subclasse Residencial Baixa Renda, decorrente dos critérios estabelecidos no art. 1o da citada Lei.” Entretanto, o mais grave está no Parágrafo único da referida MP: “A destinação dos recursos da CDE de que trata o caput não se sujeita à limitação estabelecida pelo art. 13, § 4o, da Lei no 10.438, de 2002.”

Ou seja, neste artigo da MP podemos constatar dois absurdos, o primeiro é que mesmo não conhecendo, ainda, o total da arrecadação da CDE, o Governo Federal começou a festa com o dinheiro, desviando o destino do imposto. O segundo e mais grave é que não há limitação de recursos para ressarcir as Distribuidoras de energia, conforme está claro no parágrafo único. É um procedimento que beira a ilegalidade, pois de um lado limita os recursos para um programa sócio-econômico e de outro escancara as portas para as Distribuidoras.

Como está o texto da MP, corre-se o risco de que (quase) todos os recursos oriundos da CDE vá para outros destinos, em prejuízo do PROINFRA que é um grande gerador de empregos, coisa que o Brasil está precisando urgentemente. Entretanto, parece que os nossos governantes são insensíveis aos problemas sociais, e mais uma vez fica claro para toda a população brasileira, que quando se trata de privilegiar as Distribuidoras de energia, o Governo Federal não hesita um só minuto em atender os seus reclamos.

Se os consumidores acham que a festa com o seu dinheiro já terminou, é bom irem preparando-se para mais uma garfada das Distribuidoras, pois ainda falta a implementação da “Universalização do serviço público de energia elétrica” também constante na Lei 10.438 e que prevê a obrigatoriedade de levar energia a todos os consumidores. Como sempre, as Distribuidoras estão alegando impossibilidade de cumprir tal serviço, pois isto poderá provocar desequilíbrio e desestruturação financeira das Empresas! Pura balela, pois estas Empresas já tiveram todas as sua compensações e parecem estar sofrendo da “Miopia de Marketing” ou como bem disse Jayme B. de Hollanda “de Síndrome de Levitt”.

Para nós, do setor de geração de energia, fica a impressão que a bem intencionada CDE está parecendo como a CPMF, que foi criada para ajudar a Saúde e acabou perdendo-se por caminhos que ninguém conhece. Agora só nos resta unir forças e pressionar os futuros governantes no sentido de exigir que os deputados e senadores mudem o texto da MP 64, pois como está, ela é um ato escandaloso e um verdadeiro balde de água fria no mercado investidor que necessita de regras claras e duradouras.

Humberto Viana Guimarães é engenheiro civil e consultor de geração de energia – E-mail: [email protected]

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