O futuro ganhou mais incertezas. Hoje não se sabe quem será e que modo imprimirá o novo ministro de Minas e Energia à política setorial. Porém esta preocupação é menor do que à trazida pela nuvem cinzenta estacionada sobre a Bolívia, de onde absorvemos dois terços do gás natural de que necessitamos.
Se La Paz não está no pico da convulsão, tampouco baixou sua febre mórbida. Os tributos de exploração e exportação adicionados ao gás natural podem convergir para uma estatização das jazidas, sendo a Petrobras a maior alvejada neste tiroteio.
Tais fatos reduzem a confiança dos investidores na Bolívia e todo o sistema de gás a ela interconectado: Brasil, Argentina, Chile e Uruguai. Mutilam-se as margens dos empreendimentos existentes ou futuros.
Rompem-se suas atratividades e capacidade de financiamento. Quebram-se contratos (ex-sagrados) internacionais. Fragmenta-se a unidade rumo à idealizada integração e interconexão da América Latina. E, em suma, no mínimo adiam por meio ano ou mais as decisões afetas à questão.
Com olhar boliviano, o processo estagna o próprio país gasífero, no qual a exclusão é tão grande que só mesmo uma especificidade cultural própria admite.
No Brasil, vários gasodutos entram na berlinda. Se há incertezas, que esperem!
Mas temos pela frente deles dependentes: 1) o monitoramento do fornecimento de energia elétrica, uma vez que as curvas de oferta e de consumo se cruzam (projeções atuais) a partir de 2008. Portanto, o parque gerador térmico é essencial e precisa de dutos e de gás sem o quê voltam os riscos de racionamento; 2) o preço do gás e sua competitividade tornam-se incógnitas; e, 3) outras soluções, até então abjetas, agora despontam: concluir Angra 3; re-olhar o carvão e óleos combustíveis, além de biomassas e outras fontes.
Nosso país tem abundância de fontes energéticas, sendo o problema o do preço, que já vinha ganhando posições de interesse na medida em que o petróleo dobrou de preço no mercado internacional.
Outras conseqüências: a) o Brasil deverá criar um realista e eficiente plano de contingenciamento para a falta, quiçá só parcial, do gás boliviano, durante intervalos não desprezíveis. A crise de revoltas mantém-se indeterminada. Há chance de racionarmos gás (manteremos a solidariedades federativa ou o RJ e MG se recusarão a participar?); b) o Brasil terá de apressar a exploração das jazidas de Santos, mas dificilmente antes de 2008 a coloca em operação: c) o Brasil deverá urgir com sua Lei Federal do Gás, que deve ser estimulante a investimentos, segura e módica para os consumidores; e, d) O mercado interno de gás sofrerá desassossegos e, portanto, sofrerá no curto prazo um freio, que pode ser amparado por menores crescimentos econômicos derivados de um cenário difícil extra-energético.
Duas propostas para a Lei Federal do Gás já afloraram: a do senador do PFL-BA, Rodolpho Tourinho, atraindo emendas; e, a ventilada pela ministra Dilma Rousseff e a secretária nacional do gás, Maria das Graças Forbes (que utiliza trabalho de consultoria internacional feito pela Agência Nacional do Petróleo).
Ao que tudo indica e oxalá aconteça, a Lei do Gás modificará o Artigo 25 da Constituição Federal possibilitando o livre acesso do consumidor ao gasoduto antes do City Gate (na maioria dos Estados isso hoje é impossível pelos próximos 50 anos); criará o mercado temporário e interrompível; uma Câmara de Compensação à semelhança do mercado atacadista de energia elétrica e todo o contorno de uma área de livre negociação que o monopólio de fato vem impedindo.