A Embraer, que já faz voar com etanol o pequeno aparelho Ipanema, planeja testar jatos no ar com etanol da segunda geração como óleos de babaçu e mamona, entre outros. A Boeing já usou óleo de babaçu do Brasil na primeira demonstração mundial de um avião comercial voando com biocombustível, no começo de fevereiro. A concorrente européia Airbus fez no mesmo período o primeiro teste de vôo com carburante a partir de gás processado (GTL).
Os grandes construtores deixaram claro ontem num encontro internacional sobre aviação e meio-ambiente, em Genebra, que vêem o biocombustível como uma alternativa para aviões voarem “mais ecologicamente”. Mas admitem que sua utilização para grandes aviões comerciais vai demorar anos, e em todo caso a opção não é etanol de cana ou a partir de alimentos. “Esse etanol (brasileiro) é feito de cana-de açúcar, e há gente que come açúcar”, disse ao Valor o presidente da Boeing, Scott Carson, que coloca esperanças em algas marinhas e babaçú como etanol de segunda geração, por exemplo. “Eu concordo”, completou Tom Enders, o presidente da Airbus, ao seu lado.
Já o presidente da Embraer, Frederico Fleury Curado, se diz entusiasmado com o desenvolvimento do programa brasileiro, mas vê “problema técnico” no etanol atual. “Sua capacidade de caloria nos tanques causa redução significativa de alcance e não é viável para turbinas a jatos numa escala comercial”, explicou. A Embraer examina com a Petrobras para definir alternativas de combustível a partir de biomassa para seus jatos. Os primeiros testes com o aparelho maior, de 100 assentos, podem começar este ano. “Não consigo ver a Petrobras fora do negócio do biocombustível”, afirmou. Também estuda projetos de aviões voando com hidrogênio, como Boeing, o que seria o meio mais limpo.
Em Genebra, os construtores e o resto da indústria aeronáutica – produtores de motores, as empresas aéreas, administradores de aeroportos e navegação aérea – assumiram o compromisso escrito de continuar investimento fortemente em tecnologia para neutralizar o aumento das emissões, mesmo com a expansão de 5% ao ano do tráfego aéreo.
A aviação provoca 2% das emissões de gases de efeito-estufa, globalmente, cerca de 700 milhões de toneladas por ano. O setor transporta 2,2 bilhões de passageiros por ano, e mais de 40 milhões de toneladas de cargas (35% do valor do comércio internacional). E a pressão, sobretudo na Europa, aumenta contra o uso de aviões. A WWF Internacional, ONG do setor ambiental, propôs aos executivos que façam mais videoconferências, ao invés de pegar o jatinho. Alguns membros do setor a aéreo ontem alertaram para o risco de o setor se tornar “a nova indústria do tabaco” – que sofreu tremenda pressão e hoje tem os produtos proibidos cada vez mais de consumo em lugares públicos.
Do lado das companhias aéreas, a Iata estabeleceu a meta de uso de 10% de combustíveis alternativos até 2017. “Nenhuma outra indústria tem um incentivo tão enorme para ser mais eficiente”, disse o presidente da entidade, Giovanni Bisignani, lembrando que o combustível representa 30% dos custo de uma companhia aérea e a fatura total para as empresas é estimado em US$ 156 bilhões este ano.
Para o presidente da Airbus, que quer vender aviões, o melhor mesmo seria a retirada dos 3.500 aviões velhos que estão no ar cada dia, poluindo muito.
Frederico Fleury Curado, da Embraer, concorda que o setor aeronáutico é cada vez mais eficiente por razões mais econômicas do que ecológicas. E que o compromisso assumido ontem representa um marco, porque vai levar todos os atores a trabalharem juntos para enfrentar o problema ambiental e do aquecimento climático. A Embraer pretende assumir o compromisso de suas fábricas produzirem “zero carbono”.
Produtores de motores, como GE Aviation, Rolls-Royce e Pratt & Whitney, prometem novos modelos até 2010 reduzindo em 20% o consumo de combustível.
As promessas de “aviação verde”, porém, causaram confusão. Michael Wynne, secretário das Forças Aéreas dos EUA, que compra US$ 4 bilhões de carburante por ano, disse que já testou um vôo transatlântico com carburante sintético (carvão transformado em querosene). E promete fazer voar os supersônicos também com esse combustível nos próximos anos. Foi preciso um participante lembrar a enorme emissão de gases na extração do carvão e que não tem nada de ambiental.
No médio prazo, os executivos concordaram que a esperança para reduzir emissões de gases está mais na gestão do tráfego aéreo e infra-estrutura do que no design e engenharia das aeronaves.
Enders, da Airbus, alertou que o setor aéreo está próximo da crise por causa do congestionamento nos EUA e na Europa. Segundo Scott Donnely, presidente da GE Aviation, US$ 9 bilhões são perdidos nos EUA só com ineficiência na gestão em solo. A Iata calcula que 18% dos gastos das companhias com combustível é resultado de “operações e infra-estrutura deficientes”, aumentando a fatura ambiental.