O mar de etanol, que promete encobrir o mundo nas próximas décadas, mal começou a ser formado e já tem água suficiente para lançar o Brasil em uma intrincada polêmica. O debate, que começou fora de nossas fronteiras, situa o País numa escala de valores entre o bem e o mal, ainda que não se tenha perguntado qual a nossa verdadeira participação nos fatos – reais, presumíveis ou imaginários. Nascido da preocupação tardia com a anunciada escassez do petróleo e com a destruição sistemática do meio ambiente, a energia verde aflora à ribalta no duplo papel de panacéia capaz de redimir os erros do passado e quintessência dos ardis de sujeição da humanidade a novos projetos de poder. Dono de clima e solo privilegiados, ideais à produção de biomassa, o Brasil é, por força da natureza, o favorito na disputa pelo novo ciclo mundial de energia. Essa pole position também se deve ao trabalho de nossos pesquisadores e cientistas que, desde as décadas de 20 e 30 do século passado, se dedicam ao objetivo de dominar e desenvolver tecnologias para a produção de energia limpa, renovável. Por isso não se estranha o País ser levado à berlinda nas discussões internacionais em torno do álcool combustível. Mas se estranha o silêncio do governo brasileiro a respeito de um assunto que exige posições claras e definidas. Para o bem ou para o mal, o etanol coloca o Brasil ante objetivo histórico. Seus privilégios naturais, suas competências adquiridas o trouxeram ao ponto de mutação capaz de levá-lo ao progresso, à riqueza, ao conforto social, até hoje desconhecido. Ou a mais atraso e miséria, à fome e ao crescimento da injustiça social. Essas incertezas, nutridas por teses, estudos e dados contraditórios, impõem uma reflexão profunda do País e da sociedade brasileira acerca da melhor escolha a ser feita. Estamos, como cidadãos, preocupados com o envolvimento inevitável do País nas turbulências, também inevitáveis, do início de um processo mundial de substituição da matriz energética. Como temos de tomar decisões corretas, precisamos receber do governo informações confiáveis e esclarecedoras – e não interpretações ideológicas ou político-partidárias, em corrida em que o Brasil larga e chega na frente. Em relação aos Estados Unidos, maior produtor mundial de etanol, as vantagens comparativas da produção brasileira são enormes, sem contar as indiretas: derivado da cana-de-açúcar, o etanol made in Brasil é 25% mais barato do que o concorrente, extraído do milho; para produzi-lo, os americanos gastam quatro vezes mais energia do que os brasileiros; e a produtividade da cana na produção de álcool (7 mil litros por hectare de terra) é o dobro da que vem do milho, na mesma unidade de área. Ainda que a União Européia pretenda, até o fim da década, duplicar sua produção de biodiesel de beterraba, lá e em outros continentes não há nada que se compare às alternativas que se oferecem ao Brasil. Quando vier a nova tecnologia de quebra da celulose, os ventos serão ainda mais favoráveis: a produção de etanol dobra sem que se amplie em um milímetro a área plantada com cana. Em suma: do jogo que hoje se joga somos mestres e estamos com excelentes trunfos nas mãos. Tão promissoras expectativas põem o País às portas do Paraíso… Mas de que adiantaria ver Nápoles e depois morrer? O reverso da medalha precisa ser considerado para que a prometida festa não se volte em tragédia, pois o novo ciclo de produção de energia implica mudança radical na matriz produtiva brasileira. Daí o País correr o risco de voltar, ironicamente mediante alto grau de desenvolvimento tecnológico, ao engenho de açúcar, à monocultura, à maldição do petróleo, que faz de seus grandes produtores países pobres, ditatoriais, dependentes contumazes da importação de todo tipo de bens e de serviços. Para desfrutar plenamente de sua privilegiada posição no tabuleiro do etanol, o Brasil precisa manter a pujança na produção de alimentos e comprometer-se ainda mais com a recuperação e a preservação do meio ambiente, o que implica urgente implantação de um Plano Estratégico da Agricultura Brasileira para que o País avance como nação industrial, produtora de todos os tipos de bens e de serviços, farta em recursos naturais.
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