Mercado

Era uma vez o caso Merposa

Houve um tempo em que o mercado brasileiro de ações foi tão manipulado que pouco se diferenciava de pura jogatina.

No fim dos anos 60, por exemplo, as ofertas públicas de ações eram disputadas a tapa por um mercado ávido de lucros instantâneos. Foi nessa época que alguns gaiatos simularam o lançamento de uma ação chamada Merposa, que teve imediato sucesso até alguém anunciar que a sigla falava de substância que, mesmo em pó, exalava mau cheiro. Foi um episódio, que contribuiu para a rápida desmoralização do segmento. Talvez tenha sido o ponto de partida para a busca de seriedade.

A partir dos anos 80, a superinflação e a moratória, que atiraram os juros para cima, mandaram o mercado de ações para o atoleiro. Mas, de lá para cá, muita coisa mudou. A inflação mergulhou. Os juros, embora ainda altos, prometem descambar à medida que a dívida brasileira fica mais próxima do grau de investimento. Se não estão inteiramente saneadas, as finanças públicas ficaram mais saudáveis. A área externa está blindada contra crises. O prêmio de risco também vai recuando… enfim, a paisagem ficou mais bonita para o mercado de ações que, por sua vez, está entregando mercadoria de melhor qualidade, graças às exigências impostas pelo Mercado Novo e pela melhoria do nível de governança corporativa.

Essas são as razões que explicam por que o mercado secundário de ações acusa alta de 112% nos últimos 24 meses e 25,6% apenas neste ano. É um ambiente propício a novas emissões de ações, que se encarregam de capitalizar a empresa brasileira.

O levantamento realizado pela Thomson Financial mostra que, apenas em 2007 (até fim de junho), o lançamento de ofertas primárias, conhecido pela sigla IPO (em língua inglesa), alcançou o total de US$ 9,3 bilhões que, somado às ofertas secundárias, chegou a US$ 12,7 bilhões (R$ 24,4 bilhões), recorde absoluto.

Do ponto de vista das empresas, a abertura de capital traz inúmeros benefícios. Dá acesso a capitais baratos e as livra da excessiva dependência da rede bancária, valoriza seus patrimônios, as torna mais conhecidas e um mercado de capitais mais saudável contribui para o fortalecimento do setor produtivo e da empresa.

Ninguém pense que a simples abertura de capital imuniza o acionista minoritário contra golpes abaixo da cintura. Há três semanas, por exemplo, a Cosan, mesmo na condição de integrante do Novo Mercado, perpetrou uma jogada que deu peso de 10 votos a cada ação do controlador majoritário, enquanto manteve a ação do minoritário a peso 1. E, embora bluechips no mercado, as ações do Banco do Brasil e da Eletrobrás sofrem a erosão provocada por administrações movidas a critérios políticos.

E há efeitos colaterais benéficos. O fortalecimento do mercado de capitais está tirando os melhores clientes dos bancos o que os obriga a democratizar seus créditos. E isso não deixa de ser uma das suas boas conseqüências.