Mercado

Engasgado no álcool

A decisão do governo de reduzir de 25% para 20% o teor do álcool anidro na mistura com a gasolina não passa de paliativo. É um jeito de passar o recado de que se está fazendo alguma coisa.

O setor do açúcar e do álcool está em plena safra no Centro-Sul (87% da produção nacional) e todos os números (menos os do consumo) embicam para baixo. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), por exemplo, que faz levantamentos em escala nacional, prevê quebra de 5,6% na atual safra de cana-de-açúcar. A Unica, que reúne interesses de grande grupo de produtores, calcula redução de 4,4% no Centro-Sul. E a consultoria independente Canaplan também projeta perdas no Centro-Sul, em 14,5%.

Os problemas não se limitam à obtenção de massa verde, mas se concentram aí. Em parte, essa quebra de safra é creditada às condições climáticas adversas. No entanto, o principal motivo é a falta de investimento nos canaviais.

Um punhado de fatores vem sendo responsabilizado pelo problema. Os principais são o aumento de custos da produção (preços da terra, do equipamento e da mão de obra) e, simultaneamente, o achatamento dos preços do álcool. Por corresponder a 70% do poder energético da gasolina, sempre que os preços do álcool batem no teto dos 70% nos da gasolina o consumidor enche o tanque do seu carro flex (40% do mercado) com gasolina. Ou seja, o achatamento dos preços da gasolina, determinados pelo governo, desestimulam a produção de cana-de-açúcar. Enfim, o consumo de álcool cresce 5% ao ano e, no entanto, a produção está em queda, como mostra a tabela da Canaplan.

Reduzir de 25% para 20% o álcool anidro na mistura com a gasolina ficou longe da solução. O álcool anidro corresponde a apenas 35% da produção total de álcool. Significa que essa economia não passa de 1,75% do total. É uma decisão discutível sobre outros aspectos, mas, especialmente, por mais dois: não resolve o problema; e aumenta o consumo de gasolina – que, hoje, a Petrobrás também importa.

As projeções sobre oferta de etanol variam de instituição para instituição, mas são todas negativas. A Conab prevê uma redução de 14,1%; a Única, de 17,3%; e a Canaplan, de 22,4%. Em todo o caso, a redução de álcool anidro na mistura carburante reflete uma evolução positiva na política do governo federal. Há alguns meses, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão – que pouco entende de assuntos sucroalcooleiros -, fazia ameaças aos usineiros como se fossem culpados de tudo. Além de impor mais um organismo federal (há dezenas deles), a Agência Nacional do Petróleo, para supostamente conduzir a política do setor, pregava ser preciso fazer estoques reguladores durante a safra para ter o produto na entressafra. Isso já mostra a desinformação do governo. Se falta produto, não há o que estocar. E se, ainda assim, fosse preciso recorrer a essa solução, além da demanda atual, que está acirrada, criaria uma segunda, para a formação de estoques.

Cana-de-açúcar não é vaca leiteira, que bebe água hoje e produz leite amanhã. Um canavial leva pelo menos dois anos para se desenvolver. Por isso, recursos oficiais ajudam. Mas o governo só se livrará desse engasgo quando os preços da gasolina forem descomprimidos.